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A ADIVINHA DO AMARELO





Um rei tinha uma filha tão inteligente que decifrava imediatamente todos os problemas que lhe davam. Ficou com essa habilidade, muito orgulhosa, e disse que se casaria com o homem que lhe desse uma adivinhação que ela não descobrisse a explicação dentro de três dias. Vieram rapazes de toda parte e nenhum conseguiu vencer a princesa que mandou matar os candidatos vencidos.

Bem longe da cidade morava uma viúva com um filho amarelo e doente, parecendo mesmo amalucado. O amarelo teimou em vir ao palácio do rei apresentar uma adivnha à princesa, apesar de rogos de sua mãe que o via degolado como sucedera a tantos outros.

Saiu ele de casa trazendo em sua companhia uma cachorrinha chamada Pita e um bolo de carne, envenenado, que lhe dera sua própria mãe. Andou, andou, andou, até que desconfiando do bolo o deu à Pita. Esta morreu logo. O amarelo, muito triste, jogou a cachorrinha no meio do campo e os urubus desceram para comê-la. Sete urubus morreram também. O amarelo com fome, atirou com uma pedra em uma rolinha, mas errou e matou uma asa branca. Apanhou-a e sem deixar de andar ia pensando como podia comer sua caça quando avistou uma casinha. Era uma capela abandonada há muito anos. O amarelo entrou e aproveitando a madeira do altar fez uma fogueira e assou o pássaro, almoçando muito bem. Ao sair, viu que descia na água do rio um burro morto, coberto de urubus. Estando com sede, encontrou um pé de gravatá, com água nas folhas e bebeu a fartar. Quase ao chegar à cidade reparou em um jumento que escavava o chão com insistência. O amarelo foi cavar também e descobriu uma panela cheia de moedas de ouro. Chegando à cidade, procurou o palácio do rei e disse que tinha uma adivinhação para a princesa. Marcaram o dia, e o amarelo, diante de todos, disse:

Saí de casa com massa e Pita
A Pita matou a massa
E a massa matou a Pita
Que também a sete matou
Atirei no que vi
Fui matar o que não vi
Foi com madeira santa
Que assei e comi
Um morto vivos levava
Bebi água, não do céu
O que não sabia a gente
Sabia um simples jumento
Decifre para seu tormento

A princesa pediu os três dias para decifrar e o amarelo ficou residindo no palácio, muito bem tratado. Pela noite, a princesa mandou uma criada sua, bem bonita, tentar o amarelo para que lhe dissesse como era a adivinhação. O amarelo compreendeu tudo e foi logo dizendo:

- Só direi se você me der a sua camisa.

Vai a moça e deu a camisa ao amarelo, que contou muita história mas não explicou a adivinhação. A princesa, vendo que a criada nada conseguira, mandou a segunda e houve a mesma cousa, ficando o amarelo com outra camisa. Na última noite, a princesa procurou o amarelo para saber o segredo. O rapaz pediu a camisa e a princesa não teve outro remédio senão a entregar. No outro dia, diante da corte, a princesa explicou a adivinhação:

- Massa era o bolo que a cachorra Pita matou porque comeu e foi morta pelo bolo, matando envenenados os sete urubus. A rolinha escapara da pedrada mas a asa branca morrera sem que o caçador a tivesse visto. Assou-a com madeira que guardara a hóstia santa. Um cadáver de burro levava, rio abaixo, uma nuvem de urubus vivos. A água que se conservava entre as folhas do gravatá, matara a sede do amarelo. O que não sabia o povo inteligente, sabia um jumento que cavava ouro ao pé de uma árvore.

Era tudo. Bateram muita palma, mas o amarelo disse logo:

- O fim dessa adivinha é fácil e eu vou dizer logo,
antes que morra degolado!

- Quando neste palácio entrei
Três rolinhas encontrei
Três peninhas lhes tirei
E agora mostrarei…

E foi puxando a camisa da primeira criada e mostrando. Fez o mesmo com a da segunda. Quando tirou a camisa da princesa, esta correu para ele, dizendo:

- Não precisa mostrar a terceira pena! Eu disse a adivinhação porque você me ensinou, e me ensinou porque é meu noivo…

Casaram e foram muito felizes.

(CASCUDO, Luís da Câmara. Literatura oral no Brasil)

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