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A árvore de Natal







Nada mais faltava. Estava tudo pronto: o jardim iluminado com lanternas venezianas, de cores variadas, presas nos ramos dos arbustos; as crianças da vizinhança, reunidas, a brincar alegres, saltitantes.
Na grande sala de visitas, moças e moços dançavam ao som do piano, e na de jantar, a mesa elástica, estendida de uma à outra extremidade, estava cheia de doces e frutas, com jarras de flores ao meio.
As crianças de vez em quando deixavam os brinquedos e, rodeando a casa, iam à área espiar pela janela aberta o gabinete do papá, despojado da poltrona e da secretária, apenas com as estantes, e os quadros pendentes da parede.
A um canto estava o segredo: um objeto de vulto, coberto por uma gaze azul, que mal deixava ver o que era.
É verdade que elas sabiam o que aquilo podia ser, principalmente Laura. A curiosa, durante o dia, quando os pais estavam armando o objeto, tinha ido espreitar; vira uma árvore de Natal.
Só à meia-noite é que deviam desvendar o segredo. Assim o disse a mamã.
E eram apenas dez horas: faltavam ainda duas!
 
* * *
Pouco depois cessaram as danças. Os convidados foram se retirando antes da ceia.
A dona da casa, mãe de Laura, adoecera de súbito.
As vizinhas levaram as filhas, e a criada veio buscar a menina para se deitar.
— A senhora está incomodada, e a festa fica transferida para outro dia.
Aborrecida, contrariada, choramingando, Laura foi, quase de rastro. Dirigiu-se para o quarto da vovó.
— Não pode ir para o sobrado, ao quarto de papai, porque mamãe está doente, disseram-lhe.
— Que contrariedade! pensava a pequenina, deitada na larga cama da avozinha, com a mucama ao pé, a cochilar. Também que lembrança a da mamãe, adoecer naquela noite, véspera do Natal, no meio de brincadeiras tão boas! No entanto ela não parecia doente, assim como estava com o vestido branco, o paletó fofo, sem espartilho, gorda, muito gorda!... E ela ficaria naquela noite sem presentes, sem festas! Agora, com certeza, só na véspera de Ano Bom!
E começou a contar pelos dedinhos quantos dias faltavam.
Adormeceu.
 
* * *
Muito cedo, pela manhã, acordou espantada.
Sonhara que estava brincando no jardim, numa noite de luar quando um anjo, descendo do céu, lhe trouxera um presente.
Era uma criancinha, maior que a sua boneca de cera vinda de Paris.
O anjo pousara-a sobre a relva, num pequeno berço de vime, e voara em seguida, agitando as asas de ouro, clareando todo o jardim, mais que o brilho do luar.
Nisso despertou, ouvindo um grande rumor na alcova.
Entraram a tia, o pai e a criada.
Na frente vinha dona Josefa — mãe de sua priminha Raquel — trazendo uma boneca nos braços envolta em roupas e toalhas.
Laurita sentou-se no leito muito admirada, abrindo os seus formosos olhos azuis.
A titia falou:
— Trago-te um presente Laura, que um anjo deixou, pela madrugada, enquanto dormias, debaixo do pé de magnólia... É um irmãozinho. Não o desejavas ter, como disseste muitas vezes?
Laurita põs-se de pé sobre a cama e, abaixando-se um pouco com encantadora seriedade, beijou o maninho, que o anjo do céu trouxera, durante a noite, enquanto ela dormia sonhando com aquilo mesmo.
Preferia o pequenino irmão a todos os presentes que por acaso lhe houvessem tocado por sorte quando se rompesse a gaze que encobria a árvore de Natal.

(Pimentel, Figueiredo. Histórias da baratinha. Rio de Janeiro; Belo Horizonte, Livraria Granier, 1994, p.157-159. (Biblioteca de Autores Célebres da Literatura Infantil, 2))

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