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A melhor e a pior comida do mundo







Nos tempos das arábias, há muitos anos, um velho e rico mercador contratou os serviços de um cozinheiro idoso, encurvado, feio, mas com a fama de ser um verdadeiro sábio. Logo, para provar as qualidades de seu criado, o mercador ordenou:
– Toma esta sacola de moedas. Corre ao mercado e traga de lá o que houver de melhor para um banquete. Eu quero a melhor comida do mundo!
Pouco tempo depois, o cozinheiro voltou do mercado e colocou sobre a mesa um prato coberto por fino pano de linho. O mercador levantou o paninho e ficou surpreso:
– Oh, língua? Muito bem! Nada como a boa língua que nossos pastores sabem tão bem preparar. Mas por que escolheste exatamente a língua como a melhor comida do mundo?
O cozinheiro, de olhos baixos, explicou sua escolha:
– O que há de melhor do que a língua, senhor? A língua que falamos é que nos une. Sem a língua não poderíamos nos entender. A língua, a compreensão do idioma, é a chave das ciências, o órgão da verdade e da razão. Graças à língua é que se constroem as cidades, graças à língua podemos declarar o nosso amor. A língua é o órgão do carinho, da ternura, da compreensão. É a língua que torna eternos os versos dos grandes poetas, as ideias dos grandes escritores. Com a língua se ensina, se persuade, se instrui, se reza, se explica, se canta, se descreve, se elogia, se demonstra, se afirma. Com a língua dizemos “mãe”, “paz” e “Deus”. Com a língua dizemos “eu te amo”! O que pode haver de melhor do que a língua, senhor?
O mercador levantou-se entusiasmado:
– Muito bem, muito bem! Realmente tu me trouxeste o que há de melhor. Toma agora esta outra sacola de moedas. Volta ao mercado e desta vez compra lá o que houver de pior, pois quero provar a tua sabedoria!
Depois de algum tempo, o criado voltou do mercado trazendo outro prato coberto por um pano. O mercador recebeu-o com um sorriso:
– Hum... já sei o que há de melhor. Vejamos agora o que há de pior...
O mercador descobriu o prato e ficou indignado:
– O quê?! Língua? Língua outra vez? Língua? Não disseste que a língua era o que havia de melhor? Queres ser despedido?
O cozinheiro encarou o mercador e respondeu:
– A língua, senhor, é o que há de pior no mundo. É a fonte de todas as intrigas, o início de todos os processos, a mãe de todas as discussões. É a língua que separa a humanidade, que divide os povos. É a língua que usam os maus políticos quando querem nos enganar com suas falsas promessas. É a língua que usam os vigaristas quando querem trapacear. A língua é o órgão da mentira, da discórdia, dos desentendimentos, das guerras, da exploração. É a língua que mente, que esconde, que engana, que explora, que blasfema, que insulta, que se acovarda, que mendiga, que xinga, que bajula, que destrói, que calunia, que vende, que seduz, que corrompe. Com a língua, dizemos “morre”, “canalha” e “demônio”. Com a língua dizemos “não”. Aí está, senhor, porque a língua é a pior e a melhor de todas as coisas. Se conhecermos nossa própria língua, se pudermos compreender tudo aquilo que ouvimos, tudo aquilo que lemos, todo o conhecimento que a Humanidade deixou registrado por escrito, conquistaremos o mundo. Do contrário, seremos escravos para sempre!

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