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A RAPOSA SEM RABO




          Dizem que as armadilhas para pegar animais são preparadas por caçadores, mas idealizadas pelo diabo. Verdade ou mentira, o fato é que uma raposa esperta por natureza, mas extremamente ladina pela experiência que a vida lhe dera, distraiu-se e acabou sendo apanhada por uma delas, mas teve tanta sorte que conseguiu escapulir da arapuca perdendo apenas o rabo.

          Envergonhada com a mutilação que sofrera, a raposa passou a pensar em como poderia conviver com o problema sem demonstrar inibição ou trauma, e essa oportunidade apareceu quando ela e as da sua espécie foram convocadas para uma assembleia destinada a discutir problemas ligados à demarcação dos territórios de caça. Foi assim que em certo momento, depois que a reunião já havia começado, a raposa desrrabada dirigiu-se às suas colegas dizendo:

          - Fiquei sabendo que muitos cães que andam por nossos sítios estão com o rabo cortado rente, o que me faz pensar que essa talvez seja moda lá fora. Pensando nisso foi que cheguei à conclusão de que a providência que eles tomaram é de grande utilidade, pois de que nos serve o penduricalho que trazemos dependurado em nosso traseiro, essa coisa que precisa ser arrumada com cuidado quando deitamos, que é sensível ao calor e ao frio, e que além disso vive cheia de poeira, de água ou de lodo? Diante dessa constatação, dou a vocês o meu conselho: se a moda é boa, merece ser seguida, e por isso acho que cada uma de nós deve cortar o respectivo rabo, para acompanhar o que a modernidade está nos mostrando.

          Mal ela acabou de falar e uma das raposas mais antigas, doutora em malandrice, levantou-se, encarou a plateia e sugeriu:

          - Minha amiga, sou capaz de apostar que você já está usando essa nova moda. E se é assim, por favor, vá até aonde todas nós possamos vê-la e dê meia-volta.

          Desafiada dessa forma, e não podendo disfarçar sua situação, a raposa sem rabo não teve melhor alternativa senão retirar-se apressada, debaixo de apupos e assobios que a plateia lhe endereçava.

Moral da história: É lamentável acreditar que quando coisas erradas são feitas por muitos, elas passam a se tornar aceitáveis por todos.


Baseado em uma fábula de La Fontaine

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