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O bem se paga com o bem





A onça caiu numa armadilha preparada pelos caçadores e, por mais que tentasse escapar, ficou prisioneira. Resignara-se a morrer, quando viu passar um homem. Chamou-o e lhe pediu que a libertasse.
- Deus me livre! - disse o transeunte. - Se você ficar solta, vai me devorar.
A onça jurou que seria eternamente agradecida, e o homem desatou as cordas que seguravam a tampa do alçapão e ajudou a onça a deixar a cova. Logo que esta se encontrou livre, agarrou seu salvador por um braço dizendo:
- Agora você é meu jantar.
O homem pediu e rogou. A onça, finalmente, decidiu:
- Vamos combinar uma coisa. Ouvirei a sentença de três animais. Se a maioria for favorável ao meu desejo, eu o como.
O homem aceitou e saíram os dois. Encontraram um cavalo, velho, doente, abandonado. A onça narrou o caso. O cavalo disse:
- Quando eu era moço e forte, trabalhei e ajudei o homem a enriquecer. Qual foi o meu pagamento? Largaram-se aqui para morrer, sem um auxílio. O bem só se paga com o mal.
Adiante depararam-se com um boi. Consultado, opinou pela razão da onça. Contou sua vida de serviços ao homem e, quando julgava que ia ser recompensado, soube que fora vendido para ser morto e retalhado pelo açougueiro. O bem só se paga com o mal.
O homem, triste, acompanhava a onça que lambia o beiço, quando viram o macaco. Chamaram o macaco e pediram seu parecer. O macaco começou a rir. E saltava, fazendo caretas e rindo. A onça ia-se zangando:
- Por que tanta risada, camarada macaco?
- Não é fazendo pouco - explicou o macaco -, é que eu não acredito que o homem caísse na armadilha que ele mesmo preparou.
- Ele não caiu. Quem caiu fui eu - contava a onça.
- Foi você? Então como é que esse homem fraquinho pôde libertar um bicho tão grande e forte como a camarada onça?
A onça, despeitada pelo macaco julgá-la mentirosa, foi até o alçapão e saltou para o fundo do fosso, gritando lá de baixo:
- Está vendo? Foi assim!
Mais que depressa o macaco empurrou o engradado de varas pesadas que fazia de tampa e a onça tornou a ficar prisioneira.
- Camarada onça - sentenciou o macaco - o bem só se paga com o bem. E você fez o mal, receba o mal.
E se foi embora com o homem, deixando a onça na armadilha.

CASCUDO, Luís da Câmara. Contos Tradicionais do Brasil. São Paulo: Global Editora, 2003. p. 12 - 16


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