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SABEDORIA DE BICHO







Tudo estava calmo e o dia-a-dia dos bichos na floresta estava na mesma rotina de sempre, cada um cuidando da sua turma e tratando de preservar a espécie.
Na beira do rio uma família de coelhos vivia alegremente pulando de um lado para outro com as orelhas bem em pé para ouvir no barulho das asas do Gavião, o rastejar da cobra e do jacaré e a respiração dos outros carnívoros que os espreitavam toda vez que a fome apertava e que os animais maiores conseguiram escapar.
A alegria deles era uma fazenda bem na entrada da floresta onde o dono plantava grandes canteiros de suculentas cenouras que só de pensar dava vontade de roer.
Um dia os bichos perceberam que os coelhos sumiram de repente, não se ouvia mais a algazarra dos filhotes saindo das tocas e um boato começou a correr de boca em boca que eles agora não comiam mais cenouras.
Que absurdo!
Coelho não comer cenoura?
O macaco Simão foi logo avisando que se algum do bando recusar comer banana vai ser expulso da árvore.
As Hienas morreram de rir.
O urso Janjão ficou preocupado, se eles resolverem comer o meu mel?
As Marmotas que apesar do nome são até bonitinhas acharam tudo muito estranho.
A girafa Tobogã acostumada a comer os brotos das árvores mais altas não teve como coçar a cabeça, mas a balançava como quem quer dizer: tudo está errado.
Porque será que eles não comem cenouras?
O Cachorro do mato tratou logo de esconder seu osso e os esquilos mais do que depressa levaram suas castanhas para o oco de uma árvore.
Os lobos que adoravam atacar os orelhudos mais gordos ficaram desanimados, sem comer cenouras agora vão ficar tão magrinhos!
A tartaruga e o Jacaré foram logo avisando: se não querem comer cenoura é problema deles, que não venham devorar nossos ovos.
Passaram alguns dias e a família do Sr. Rapidinho quase caiu no esquecimento quando o Gavião perguntou para o Urubu: como será que eles estão vivendo?
Sei lá respondeu o Urubu, não é da minha conta e acho até bom não comerem nada porque assim em pouco tempo vou ter um banquete.
E o comentário voltou com força.
Os pássaros por desfrutar de uma visão privilegiada começaram observar a movimentação dos coelhos.
Todos estavam curiosos.
A Onça estava uma fera.
O Tigre andava nervoso!
O Leão reclamava porque um rei não pode ficar sem informação.
Algumas famílias pareciam não saber de nada.
O Alce, as Gazelas e os Antílopes pulavam de um lado para outro numa alegria incontida, enquanto a manada de búfalos pastava tranquilamente como se nada estivesse acontecendo.
Alguém se lembrou que nesta ocasião é preciso a opinião de alguém com muita sabedoria e trataram logo de chamar a Coruja.
O professor da floresta não deixou por menos: é preciso chamar o Sr. Rapidinho para uma conversa, nenhum grupo tem o direito de mudar seus hábitos e o modo de viver da noite para o dia.
O rei tratou logo de chamar para si a responsabilidade e mandou o falcão comunicar imediatamente o Sr. Rapidinho para que viesse á clareira o mais rápido possível.
Os bichos de hábito noturno tiveram tempo para conversar sobre o assunto e os outros não conseguiram dormir, todos estavam curiosos para saber o que estava acontecendo.
Assim que a lua se escondeu de um lado e o sol penetrou a copa das árvores, a bicharada estava toda reunida para finalmente descobrir o mistério.
O Leão sentou se confortavelmente em um tronco para ficar bem acima dos outros bichos e usando o poder de sua majestade disse para o coelho.
-Você precisa nos dizer por que os coelhos não estão mais comendo cenouras, enquanto não esclarecer este mistério os outros bichos vão ficar sem saber o que fazer.
Já pensou se leões, tigres, onças e todos os carnívoros deixarem de comer carne?
E se os pássaros pararem de comer os frutos que espalham as sementes quem fazem renascer a vida?
E se as cobras deixarem de comer os pequenos animais que parariam de comer os insetos, que por sua vez deixariam de comer as formigas e assim por diante?
Precisamos saber o que está acontecendo.
Precisamos resolver.
Do contrario todo o ciclo da vida na floresta está ameaçado.
O Sr. Rapidinho com sua calma habitual balançou suas enormes orelhas e explicou que nada de sério estava acontecendo.
- Os coelhos ainda gostam muito de cenouras e estão sentindo uma falta danada de dar umas boas mordidas, é que o dono da fazenda colocou armadilha nos canteiros e muitos tiveram seus dentes quebrados ao morder aquelas gostosuras. Aí os outros ficaram com medo de perder os seus dentes e passaram a comer outras coisas, e como as folhas e ervas não são tão gostosas como as cenouras aceitaram o leite oferecido por algumas mamães dos mamíferos que passaram a nos alimentar depois de uma visita quando ficaram sabendo do acontecido.
Os Búfalos, falando em nome dos que ajudavam os coelhos disse que não contaram para ninguém porque os coelhos banguelas pediram segredo porque estavam se achando muito feios.
- Ainda preferimos as cenouras disse o Sr. Rapidinho.
A Hiena morrendo de rir falou que faltou solidariedade.
O Simão se adiantou e pediu desculpas em nome de todos os macacos.
O Jacaré e a Tartaruga buscaram alguns ovos fresquinhos e ofereceram á família dos roedores.
Cada bicho, a sua maneira foi trazendo alguma coisa junto com um pedido de desculpas.
Parecia que tudo estava esclarecido e que a vida agora voltaria ao normal.
O rei da floresta soltou um urro para que todos se calassem e mostrando ser um governante sábio disse: o que os mamíferos fizeram foi uma atitude muito bonita e correta, mas ainda não foi o bastante para resolver o problema dos nossos amigos. Chamou os roedores e deu uma ordem: vão à fazenda e retirem todas as armadilhas e fiquem por lá para tirar toda vez que uma nova for colocada, e quanto ao Senhor Rapidinho, a partir de hoje sua família não vai mais ficar cavando buracos em toda a propriedade do fazendeiro, vão comer apenas em um canteiro e quando tiverem comido a metade dele a outra metade tem que estar semeada para nunca mais faltar cenoura e não ter mais dente quebrado.
O fazendeiro em pouco tempo percebeu o que estava acontecendo e ele mesmo plantava no canteiro escolhido pelos coelhos para que pudessem comer em paz.
Agora toda vez que um bicho da floresta apresenta um comportamento estranho, todos se reúnem para procurar uma solução.
Perceberam que se uma espécie deixa de existir a cadeia alimentar fica prejudicada e a vida de todos ameaçada.
E isto torna a vida insuportável.
Isto é sabedoria de bicho.
Isto é falta de sabedoria do homem.


Geraldo Eustáquio Ribeiro

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