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O defunto vivo







Em alguns arraiais do interior mineiro, quando morria alguém, costumavam buscar o caixão na cidade vizinha, de caminhão. Certa feita, vinha pela estrada um caminhão com sua lúgubre encomenda, quando alguém fez sinal, pedindo carona. O motorista parou.
- Se você não se incomodar de ir na carroceria, junto ao caixão, pode subir.
O homem disse que não tinha importância, que estava com pressa. Agradeceu e subiu. E a viagem prosseguiu.
Nisto começa a chover. O homem, não tendo onde se esconder da chuva, vendo o caixão vazio, achou melhor deitar-se dentro dele, fechando a tampa, para melhor abrigar-se. Com o balanço da viagem, logo pegou no sono.
Mais na frente, outra pessoa pediu carona. O motorista falou:
- Se você não se importa de viajar com o outro que está lá em cima, pode subir.
O segundo homem subiu no caminhão. Embora achasse desagradável viajar com um defunto num caixão, era melhor que ir a pé para o povoado.
De tempos em tempos, novos caronas subiam na carroceria, sentavam-se respeitosos em silêncio, em volta do caixão, enquanto seguiam viagem.
Avizinhando-se o arraial, ao passar num buraco da estrada, um tremendo solavanco sacode o caixão e desperta o dorminhoco que se escondera da chuva dentro dele.
Levantando devagarinho a tampa do caixão e pondo a palma da mão para fora, fala em voz alta:
- Será que já passou a chuva?
Foi um corre-corre dos diabos. Não ficou um em cima do caminhão. Dizem que tem gente correndo até hoje.                                             
         
(Weitzel, Antônio Henrique. Folclore literário e linguístico. Juiz de Fora, MG. EDUFJF, 1995)

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