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O Alfaiate Fanfarrão








  Um dia, um alfaiate que estava sempre a gabar-se da sua esperteza, decidiu ir correr mundo. Depois de percorrer um longo caminho, chegou a uma colina íngreme, atrás da qual se via a copa de algumas árvores e uma torre muito alta que desaparecia no meio duma nuvem.

   – Vou ver quem é que lá vive – disse audaciosamente o alfaiate. – Nada me mete medo. – Até para si próprio se gabava.

   Apenas tinha caminhado uns metros, quando algo de singular aconteceu. A torre começou a mexer. O alfaiate esfregou os olhos. Com certeza estava a ter miragens. As torres não mexem. Mas esta mexia. Deslocou-se até junto da colina e parou em frente do alfaiate. Não era uma torre. Era uma perna. A perna de um gigante. E, rapidamente, seguiu-se-lhe uma segunda. Ora, onde existem duas pernas gigantes, existe provavelmente um gigante.

   – O QUE É QUE TU QUERES? – rugiu o gigante.

   O alfaiate pôs as mãos em concha à volta da boca e gritou bem alto:

   – Quero ganhar uma casca de pão!

   – Podes vir trabalhar para mim – rosnou o gigante.

   O alfaiate viu que não podia recusar a oferta, visto ser tão pequeno e o gigante tão grande.

   – Quanto me pagas? – perguntou.

   – Dar-te-ei trezentos e sessenta e cinco dias por ano e um dia extra nos anos bissextos – respondeu o gigante.

   – Parece-me justo – disse o alfaiate, embora estivesse determinado a fugir o mais depressa possível.

   A primeira tarefa que o gigante lhe deu foi acarretar água.

   – Um jarro chega? – perguntou o alfaiate. – Ou queres que traga o poço? Se o poço não chegar, trarei a nascente.

   – Não, não, o jarro leva o suficiente – disse o gigante.

   E pensou com os seus botões: "Este não é um homem normal, se consegue trazer um poço e uma nascente. Tenho de ter cuidado com o que lhe digo."

   A segunda tarefa que o gigante deu ao alfaiate foi cortar lenha.

   – Porque não me deixas trazer a floresta inteira e acabamos com isto? – disse o alfaiate em tom de desafio.

   – Não, não é necessário – disse o gigante. E resmungou com os seus botões: "Trazer um poço e mais a nascente... cortar uma floresta inteira! Que espécie de homem é este?"

   A terceira tarefa que o gigante lhe deu consistia em matar dois javalis para o jantar.

   – Vou trazer-te mil – vangloriou-se o alfaiate.

   – Não, não, dois chegam – disse o gigante. E murmurou com os seus botões: "Trazer poço e nascente... cortar uma floresta inteira... trazer mil javalis. Este homem é perigoso. Quanto mais cedo me livrar dele, melhor." Estava tão preocupado que ficou toda a noite acordado a pensar na melhor maneira de se ver livre do alfaiate.

   Na manhã seguinte, o gigante levou o alfaiate a um pântano onde cresciam salgueiros. O gigante içou o alfaiate e sentou-o no ramo elástico de um deles.

   – Acho que nem mesmo TU consegues vergar esse ramo até ao chão – disse o gigante.

   – Ah, isso é que consigo! – gabou-se o alfaiate.

   Inspirou profundamente e susteve o ar no peito. Depois, empurrou o ramo, que começou a vergar vagarosamente.

   – Mais… – disse o gigante.

   O alfaiate pressionou com mais força. O ramo desceu mais ainda. O fôlego do alfaiate esgotara-se. Precisava de tomar fôlego outra vez. Tinha de tomar fôlego outra vez. Mas, quando abriu a boca para inspirar, o ramo elástico do salgueiro lançou-o violentamente ao ar, como uma catapulta lança uma pedra. Subiu muito alto, cada vez mais alto. Deve ter ido além da lua, pois nunca mais ninguém o viu, para alívio do gigante.

   Se o alfaiate não fosse tão fanfarrão, provavelmente estaria agora sentado em casa a contar aos netos a história de um gigante que um dia conhecera.

Contos de Grimm
São Paulo, Edições Melhoramentos, 1968

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