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O Elefante Bernardo





Havia uma vez um elefante chamado Bernardo que nunca pensava nos outros. Um dia, enquanto Bernardo brincava com seus companheiros de escola, pegou uma pedra e jogou na direção dos seus companheiros. 
A pedra pegou o burro Cândido em sua orelha e saiu muito sangue. Quando as professoras viram o que tinha acontecido, ajudaram imediatamente ao burrinho Cândido.
Depois de limpar, colocaram um grande curativo na sua orelha para curá-lo. Enquanto Cândido chorava, Bernardo ria, escondendo-se das professoras. 
No dia seguinte, Bernardo passeava pelo campo, quando sentiu muita sede. Caminhou em direção ao rio para beber água. Ao chegar ao rio, viu uns cervos que brincavam na margem do rio. 
Sem pensar duas vezes, Bernardo pegou muita água com a sua tromba e jogou fortemente contra os cervos. Gilberto, o cervo mai pequenino perdeu o equilíbrio e acabou caindo no rio, sem saber nadar. 
Felizmente, Felipe, um cervo maior e que era um bom nadador, se jogou no rio na mesma hora e ajudou Gilberto a sair do rio. Felizmente não aconteceu nada com Gilberto, mas sentia muito frio porque a água estava fria e acabou pegando um resfriado. Enquanto tudo isso ocorria, a única coisa que o elefante Bernardo fazia era rir do acontecido na frente de todos. 
Uma manhã de sábado, enquanto Bernardo passeava pelo campo e comia algumas plantas, passou muito perto de uma planta que tinha muitos espinhos. Sem perceber o perigo, Bernardo acabou se ferindo nas suas costas e nas suas patas com os espinhos. Tentou tirar os espinhos, mas suas patas não alcançavam e isso provocava muita dor nele. 
Ele se sentou embaixo de uma árvore e chorou desconsoladamente, enquanto continuava com muita dor. Cansado de esperar, Bernardo decidiu caminhar para pedir ajuda. Enquanto caminhava ele se encontrou com os cervos que havia jogado água. Ao vê-los ele gritou: 
- Por favor, ajudem-me a tirar esses espinhos que me doem muito.
E, reconhecendo a Bernardo, os cervos disseram:
- Não vamos te ajudar porque você jogou Gilberto no rio e ele quase se afogou. Além disso, Gilberto está doente porque pegou uma gripe, pois a água estava muito fria. Você vai ter que aprender a não ferir nem tirar sarro dos outros. 
O pobre Bernardo, entristecido, baixou a cabeça e seguiu pelo caminho em busca de ajuda. Enquanto caminhava, ele se encontrou com alguns dos seus companheiros de escola. Pediu ajuda a eles, mas eles tão pouco quiseram ajudá-lo porque estavam enojados pelo que Bernardo tinha feito com o burro Cândido. 
E mais uma vez Bernardo baixou a cabeça e continuou o seu caminho em busca de ajuda. Os espinhos provocavam muita dor a ele. Enquanto tudo isso acontecia, havia um macaco que trepava pelas árvores. Vinha saltando de uma árvore à outra, perseguindo a Bernardo e vendo tudo o que acontecia. Logo, o grande e sábio macaco, que se chamava Justino, deu um grande salto e se parou em frente a Bernardo, e lhe disse: 
- Está vendo, grande elefante? Você sempre machucou aos outros e, como isso fosse pouco, ainda ria deles. Por isso, agora ninguém quer te ajudar, mas eu que vi tudo o que aconteceu, estou disposto a te ajudar se você aprender e cumprir duas grandes regras da vida.
E Bernardo respondeu chorando: 
- Sim, eu farei tudo o que você me disser, sábio macaco. Ajude-me a tirar os espinhos.
E o macaco lhe disse: 
- Bem, as regras são essas: a primeira é que você não machucará a mais ninguém, e a segunda é que você ajudará aos outros e eles te ajudarão quando você precisar. 
Ditas essas regras, o macaco passou a tirar os espinhos e a curar as feridas de Bernardo. E, a partir desse dia, o elefante Bernardo cumpriu rigorosamente as regras que tinha aprendido. 

Esse conto foi enviado por Javier Moreno Tapia (México)

O Nariz do Elefantinho







Há muito, muito tempo, os elefantes tinham o nariz pouco maior do que um sapato. Até que um pequeno elefante, muito curioso, resolveu começar a fazer demasiadas perguntas.
Um dia, foi ter com a tia girafa e perguntou-lhe:
- Ó tia, porque tens um pescoço tão grande?
E a tia, de resposta, deu-lhe uma sapatada.
Depois o pequeno elefante foi ter com a tia avestruz e perguntou-lhe:
- Tia, porque tens plumas tão grandes na tua cauda?
Também esta lhe deu uma sapatada de resposta.
Mas a pergunta mais atrevida que o pequeno elefante fez foi no dia do grande encontro dos animais, quando, diante de todos, teve a audácia de perguntar:
- O que comem os crocodilos ao jantar?
A resposta foi a maior e mais sonora sapatada de sempre.
Triste e dolorido, o pequeno elefante foi refugiar-se junto ao seu primo, o passarinho.
- Meu amigo, por favor, sabes-me dizer o que comem os crocodilos ao jantar?, perguntou-lhe.
- Eu não sei, mas se fores ao rio esverdeado e lamacento, descobrirás!
O pequeno elefante levou consigo um farnel de bananas e melões e encaminhou-se para o rio.
Passados alguns dias, avistou o rio e, para o ver melhor, trepou para cima de uma coisa que lhe pareceu ser um tronco de árvore.
Só quando o tronco se mexeu é que percebeu que estava a pisar o dorso de um animal.
Logo, logo saiu dali e disse:
- Oh! Peço imensa desculpa! Por acaso já viu algum crocodilo? Sabe o que os crocodilos comem ao jantar?
O estranho animal era mesmo um crocodilo e não ficou nada contente por ter sido pisado, ou melhor, quase esmagado!
Por isso, respondeu:
- Venha para mais perto para eu te dizer ao ouvido o que comem os crocodilos!
O elefantinho, na sua inocência, chegou mais perto, e zaz! O crocodilo deu-lhe uma dentada no nariz.
- Ai, ai, ai! Estás me machucando!, choramingava o pequeno elefante. E para libertar o nariz começou a puxá-lo, enquanto o crocodilo puxava para o lado contrário. Assim, o nariz esticava cada vez mais.
Mais um esforço e... puf!, o pequeno elefante conseguiu finalmente libertar-se.
Mas o seu nariz tinha crescido muito. No início, ele morria de vergonha, mas, com o tempo, foi-se apercebendo que, com aquele nariz, podia fazer imensas coisas novas, como apanhar fruta dos ramos altos das árvores e beber sem se abaixar...
E o melhor é que servia para bater naqueles que o tratavam mal!
Voltou, então, para casa todo contente e sempre que alguém o gozava por causa do nariz levava uma boa sacudidela.
Foi assim que os outros elefantes, cheios de inveja, decidiram ir ao rio esverdeado e lamacento para esticar o nariz no crocodilo!

Fonte: Cool Kids

As três folhas da serpente





Houve uma vez um pobre homem que não podia mais sustentar seu filho único. Este,
então, disse ao pai:
- Meu querido pai, vives tão miseravelmente e eu sou um peso para ti; quero, portanto, ir-me embora e tratar de ganhar o pão de cada dia.
O pai deu-lhe a benção, despedindo-se dele com grande tristeza.
Naquele tempo, o rei de importante reino estava na guerra; o jovem entrou ao seu serviço, acompanhando-o ao campo de luta. Quando chegaram à frente do inimigo, travou-se uma grande batalha; o perigo era assustador; o feijão azul (balas) caía de todos os lados e os companheiros eram terrivelmente dizimados. Tendo caído também o comandante, os outros tentaram fugir, mas o jovem postou-se à frente deles e incentivou-os, exclamando:
- Não deixaremos perecer nossa Pátria! Avante!
Os outros, então, seguiram-no; ele irrompeu contra o inimigo e derrotou-o. Quando o rei veio a saber que só a ele devia a vitória, elevou-o a grande dignidade, deu-lhe tesouros ingentes e nomeou-o primeiro-ministro de seu reino.
O rei tinha uma filha belíssima, mas muito esquisita. Ela havia jurado que só aceitaria por esposo e senhor quem lhe prometesse deixar-se enterrar vivo com ela, se acaso ela morresse primeiro.
- Se me amar realmente, - dizia ela - de que lhe servirá depois a vida?
Em compensação, prometia fazer o mesmo: Descer à sepultura junto com o marido se
ele morresse primeiro. Esse estranho juramento havia sempre desencorajado todos os pretendentes, mas o jovem, tão fascinado ficou com a beleza dela, que não deu
importância a tal esquisitice e pediu-a assim mesmo em casamento.
- Sabes, porém, o que deves prometer? - perguntou-lhe o rei.
- Sei, - respondeu o jovem - se eu lhe sobreviver, terei de descer com ela à sepultura; mas o meu amor é tão grande que o risco não me causa receio algum.
Assim, obtido o consentimento do rei, realizaram-se as núpcias com o máximo
esplendor. Durante algum tempo, viveram os jovens alegres e felizes. Entretanto, aconteceu que a rainha ficou gravemente enferma e nenhum médico conseguiu salvá-la.
Diante da falecida esposa, o jovem rei lembrou-se da promessa feita e ficou horrorizado por ter que se enterrar vivo, mas não tinha outra alternativa. O rei dera ordens para que todas as portas fossem vigiadas; assim não lhe era possível fugir ao próprio destino. Portanto, no dia em que o cadáver foi trasladado para a cripta real, o jovem foi obrigado a segui-lo. Uma vez lá dentro, fecharam e aferrolharam-lhe a porta.
Perto do ataúde havia uma mesa e, em cima dela, quatro velas acesas, quatro pães e quatro garrafas de vinho. Quando terminasse essa provisão, ele teria de morrer à míngua. Cheio de angústia e tremendamente acabrunhado, o jovem comia, diariamente, apenas um pedacinho do pão e, do vinho, tomava um golinho apenas. Via, contudo, a morte aproximar-se inevitavelmente. Enquanto se achava assim absorto, olhando para a frente, viu uma serpente sair rastejando do canto da cripta e avizinhar-se do cadáver. Julgando que fosse mordê-la, desembainhou a espada dizendo:
- Enquanto eu viver, ninguém lhe tocará - e cortou o réptil em três pedaços.
Nisso, apareceu uma segunda serpente, que vinha rastejando do canto da cripta mas, quando viu a companheira morta e em pedaços, retirou-se voltando logo com três folhas verdes na boca. Pegou os três pedaços da serpente morta, juntou-os direito e sobre cada um dos talhos colocou uma folha. Os pedaços uniram-se novamente, a serpente moveu-se e readquiriu a vida e, em seguida, fugiu com a companheira.
As folhas ficaram caídas no chão e o infeliz, que assistira àquilo tudo, perguntou a si próprio se o poder mágico que continham, tendo ressuscitado a serpente, não poderia aplicar-se também a um ser humano? Recolheu então as folhas, colocou uma sobre a boca e as outras duas sobre os olhos da esposa falecida. Mal acabou de colocá-las, o sangue voltou a circular nas veias, afluindo-lhe ao rosto, dando-lhe natural colorido. Ela respirou, abriu os olhos e perguntou:
- Oh, Deus meu, onde estou?
- Estás comigo, minha querida mulher - respondeu o jovem.
Em seguida, contou-lhe todo o sucedido e a maneira pela qual havia ressuscitado. Depois, deu-lhe um pedaço de pão e um pouco de vinho; assim que ela se reanimou, levantou-se e ambos foram bater à porta, esmurrando-a e gritando tão alto que os guardas ouviram e correram a avisar o rei. Este, em pessoa, desceu à cripta e abriu a porta, encontrando os dois vivos, sadios e viçosos como nunca; radiantes de alegria, abraçaram-se felizes por terem superado aqueles tormentos.
O jovem rei levou consigo as três folhas e deu-as ao seu criado dizendo:
- Guarda-as com cuidado e traze-as sempre contigo; quem sabe lá as circunstâncias que podem vir e se elas ainda servirão a alguém!
Depois de ressuscitada, porém, a mulher mudara completamente; parecia que de seu coração se tivesse desvanecido todo o amor pelo marido. Este, decorrido algum tempo, quis fazer uma visita ao velho pai; ao embarcarem no navio que os levaria, a rainha esqueceu o grande amor e a dedicação que ele sempre lhe demonstrara, a ponto de tê-la salvo da morte e passou a nutrir uma paixão pecaminosa pelo comandante do navio.
Certo dia, enquanto o rei estava dormindo, chamou o comandante e mandou que pegasse o marido pelos pés, enquanto ela segurava-o pela cabeça e atiraram-no ao mar. Consumado o crime, disse ela:
- Agora voltaremos para casa. Diremos que ele morreu durante a viagem. Eu te exaltarei perante meu pai e tais elogios farei que ele consentirá em nosso casamento. Assim ficarás sendo tu o herdeiro da coroa.
Mas o fiel criado, que tudo presenciara, foi, sem ser visto, destacar um bote salva- vidas e desceu ao mar. Entrou nele e foi vagando à procura de seu amo, deixando os traidores prosseguirem tranquilamente a viagem. Assim que conseguiu pescar o cadáver, colocou-lhe nos olhos e na boca as três folhas verdes que trazia consigo, as quais lhe restituíram a vida.
Juntos, então, puseram-se a remar dia e noite, com todas as forças e o bote voava por sobre as ondas com tamanha velocidade, que chegaram antes dos outros à presença do rei. Este, vendo-os regressar sozinhos, muito se admirou e perguntou qual o motivo. Ao ter conhecimento da crueldade da filha, exclamou:
- Custa-me crer que tenha agido assim cruelmente, porém, a verdade logo virá à luz.
Mandou que entrassem num quarto secreto e ficassem ocultos de todos. Não tardou muito e chegou o navio. A pérfida rainha apresentou-se ao pai muito aflita. Ele perguntou-lhe então:
- Por que voltas sozinha? Onde está teu marido?
- Ah, meu querido pai - respondeu ela - volto em grande luto; meu marido adoeceu repentinamente durante a viagem e faleceu. Se este bom comandante não me socorresse, não sei o que teria sido de mim. Ele assistiu-lhe a morte e pode contar tudo.
- Eu vou fazer ressuscitar o morto - disse o rei.
Abriu a porta do quarto secreto e fez sair os dois. Ao ver o marido, a rainha recebeu um choque tão grande como se lhe tivesse caído um raio aos pés. Prostrou-se de joelhos implorando perdão, mas o rei gritou-lhe:
- Para ti não pode haver perdão! Ele mostrou-se pronto a morrer contigo; restituiu-te
a vida e tu o assassinaste enquanto dormia. Deves, pois, receber o justo castigo.
Conduziram-na, juntamente com o cúmplice, para um navio que fazia água e os
lançaram ao mar, onde, não tardou muito, foram a pique e se afogaram.


Joãozinho e Margarida (Hansel e Gretel)







Em frente a uma grande floresta morava um pobre lenhador com a mulher e dois filhinhos; o menino chamava-se Joãozinho e a menina Margarida. Tinham pouco com que se alimentar, e, sobrevindo na cidade uma grande carestia, nem mesmo o pão de cada dia conseguiram mais.
Numa dessas noites, quando atormentado pelas preocupações não conseguia dormir e ficava revirando inquieto na cama, entre um suspiro e outro, disse à mulher:
- Que será de nós? Como alimentaremos nossos filhinhos, se nada temos nem para nós?
- Escuta aqui, meu caro marido, - respondeu ela - amanhã cedo, levaremos as crianças para o mais cerrado da floresta, aí lhes acenderemos uma fogueira e lhes daremos um pedaço de pão para que se alimentem;
depois iremos para o nosso trabalho e os deixaremos lá sozinhos; Eles não conseguirão encontrar o caminho de casa e assim ficaremos livres deles.
- Não, mulher, isso não posso fazer. Se abandonar meus filhos sozinhos na floresta, não tardarão as feras a devorá-los, como poderei viver depois?
- És um tolo, isso sim. Teremos de morrer os quatro de fome e não te resta se não aplainar as tábuas para os nossos caixões.
Contudo, não deu sossego ao pobre marido até ele concordar.
- Mas as pobres crianças causam-me uma pena imensa! - repetia ele.
As crianças também, de tanta fome, não conseguiam dormir; assim ouviram tudo o que a madrasta dizia ao pai. Chorando amargamente, Margarida disse a Joãozinho:
- Está tudo acabado para nós!
- Não te aflijas, - respondeu Joãozinho - não tenhas medo, eu sei o que hei de fazer.
Assim que os velhos adormeceram, Joãozinho levantou-se bem de mansinho, vestiu o paletó, abriu a porta da frente e escapuliu para fora. A lua resplandecia diáfana e os seixos branquinhos cintilavam diante da casa como se fossem moedas recém-cunhadas. O menino apanhou e meteu nos bolsos quantos pôde. Depois voltou para casa e disse a Margarida:
- Tranquiliza-te, querida irmãzinha, e dorme sossegada; Deus não nos abandonará.
E deitou-se novamente.
Ao amanhecer, antes ainda do sol raiar, a mulher acordou as crianças, dizendo:
- Levantem-se, seus vadios. Vamos catar lenha na floresta.
Deu um pedaço de pão a cada um e disse:
- Eis aqui para o vosso almoço; mas não deveis comê-lo antes do meio-dia, se não nada mais tereis que comer depois.
Margarida guardou o pão no avental pois Joãozinho estava com os bolsos cheios de pedras. Em seguida, encaminharam-se todos rumo à floresta. Tendo caminhado um certo trecho, Joãozinho parou e voltou-se a olhar para a casa; fez isso repetidas vezes, até que o pai, intrigado, lhe perguntou:
- Que tanto olhas, Joãozinho, e por que ficas sempre para trás? Vamos, apressa-te.
- Ah, papai, - disse o menino - estou olhando para o meu gatinho branco, que, de cima do telhado, está acenando para mim.
- Tolo, não é o teu gato - interveio a mulher; - não vês que é o sol da manhã brilhando na chaminé?
Mas Joãozinho não olhava para gato nenhum; era apenas um pretexto para, todas as vezes, deixar cair no caminho uma das pedrinhas brilhantes que trazia no bolso.
Quando, finalmente, chegaram ao meio da floresta, disse-lhes o pai:
- Juntemos um pouco de lenha, meninos, vou acender uma fogueira para que não fiqueis enregelados.
Joãozinho e Margarida juntaram uma boa quantidade de gravetos e ramos secos, com os quais acenderam a fogueira; assim que as chamas se elevaram, disse-lhes a mulher:
- Deitai-vos juntos do fogo, meninos, enquanto nós vamos rachar lenha; uma vez terminado o nosso trabalho, viremos buscar-vos.
Joãozinho e Margarida sentaram-se perto do fogo e, ao meio-dia, cada qual comeu o seu pedaço de pão. Ouvindo os golpes do machado, julgaram que o pai estivesse aí por perto; mas não era o machado, era simplesmente um galho que ele havia amarrado a uma árvore seca e que batia sacudido pelo vento. Ficaram muito tempo sentados junto do fogo, depois, pelo cansaço, foram fechando os olhos até adormecerem profundamente. Quando despertaram, era já noite avançada. Margarida pôs-se a chorar com medo.
- Como sairemos agora da floresta?
- Espera um pouco - disse-lhe Joãozinho para a consolar - espera até surgir a lua, aí encontraremos o caminho.
Não tardou, apareceu a lua resplandecente. Joãozinho tomou a irmãzinha pela mão e juntos foram seguindo as pedrinhas, que brilhavam como moedas novas e lhes indicavam o caminho. Andaram a noite toda; ao despontar da aurora, chegaram à casa paterna. Bateram à porta e, quando a mulher abriu, vendo os dois na sua frente, disse, muito zangada:
- Crianças malvadas, por que dormistes tanto na floresta? Até pensamos que não queríeis mais voltar para casa.
O pai, ao contrário, alegrou-se ao vê-los, pois remoia o remorso por tê-los abandonado lá sozinhos.
Assim passou um certo tempo. Depois a miséria tornou a invadir a casa e, uma noite, quando estavam deitados, os meninos ouviram a madrasta dizer ao pai:
- Já comemos tudo o que havia em casa, só nos resta meio pão, e com ele acaba a ração. E' necessário que as crianças se vão embora; desta vez, porém, os conduziremos mais para o embrenhado da floresta, a fim de que não encontrem o caminho para voltar. Não nos resta outra solução.
O homem sentiu constranger o coração e ia pensando: "Seria melhor que repartisses teu último bocado com teus filhos"; e relutava em concordar. A mulher, porém, não queria dar-lhe ouvido e censurava-o asperamente. Ora, quem diz A deve também dizer B e desde que havia cedido da primeira vez, viu-se forçado a ceder da segunda.
As crianças, que ainda estavam acordadas, ouviram toda a conversa. Assim que os velhos adormeceram, Joãozinho levantou-se novamente para sair de mansinho, como da outra vez, para catar os seixos lá fora; mas a madrasta havia trancado a porta e ele não pôde sair. Entretanto, consolou a irmãzinha, dizendo-lhe:
- Não chores Margarida, dorme sossegada; o bom Deus nos há de ajudar.
Ao raiar do dia, na manhã seguinte, a madrasta tirou as crianças da cama. Cada um deles recebeu um pedaço de pão, ainda menor que da vez anterior. Em caminho para a floresta, Joãozinho esfarelou-o no bolso e, de quando em quando, parava a fim de, jeitosamente, deixar cair as migalhas.
- Que tanto olhas para trás, Joãozinho, e por que te demoras? - perguntou o pai.
- Estou olhando para o meu pompinho que está a dizer-me adeus de cima do telhado.
- És um tolo, - disse a mulher - não vês então que não é o teu pompinho, mas sim o sol nascente, que brilha na chaminé.
Entretanto, o menino fora esparramando, pouco a pouco, as migalhas pelo longo do caminho.
Dessa vez a madrasta conduziu as crianças ainda mais para o interior da floresta, para um lugar em que jamais haviam estado. Acenderam, novamente, uma grande fogueira e ela disse-lhes:
- Ficai aqui, quietinhos, meninos. Quando estiverdes cansados, deitai-vos e dormi um pouco; enquanto isso, nós iremos rachar lenha e, à tarde, ao terminar nosso trabalho, viremos buscar-vos.
Ao meio-dia, Margarida repartiu seu pedaço de pão com Joãozinho, que havia espalhado o dele pelo caminho. Depois adormeceram e anoiteceu; mas ninguém foi buscá-los. Acordaram quando ia alta a noite e a menina pôs-se a chorar. Joãozinho consolou-a, dizendo:
- Espera até surgir a lua, aí então veremos as migalhas de pão que espalhei e por elas encontraremos o caminho de casa.
Quando surgiu a lua, levantaram-se, mas não encontraram mais nem uma só migalha; os passarinhos, que andam por toda parte, tinham comido todas. Joãozinho então disse à Margarida:
- Não tem importância, havemos de encontrar o caminho de qualquer maneira.
Não encontraram o caminho e caminharam toda a noite e mais um dia inteiro sem conseguir sair da floresta. Estavam com uma fome tremenda, pois só tinham comido algumas amoras, e tão cansados que as pernas não se aguentavam mais; então, deitaram-se debaixo de uma árvore e adormeceram.
Era já a terceira manhã, depois que haviam saído da casa do pai; retomaram novamente o caminho, mas cada vez se embrenhavam mais pela floresta a dentro e, se ninguém viesse em seu socorro, certamente acabariam morrendo de fome.
Ao meio-dia, avistaram um lindo passarinho, alvo como a neve, pousado num galho; cantava tão maviosa- mente que os meninos pararam para ouvi-lo. Quando acabou de cantar, saiu a voar na frente deles, que o foram acompanhando, e assim chegaram a uma casinha onde o passarinho foi pousar no telhado. Chegando bem perto, viram que a casinha era feita de pão-de-ló e coberta de torta, com janelinhas de açúcar cândi.
- Mãos à obra! - exclamou satisfeito Joãozinho - podemos fazer uma excelente refeição. Eu comerei um pedaço do telhado e tu, Margarida, podes comer um pedaço da janela; é doce.
Joãozinho ergueu-se na ponta dos pés, estendeu as mãos e arrancou um pedaço de telhado para provar que sabor tinha. Margarida, aproximando-se dos vidros da janela, pôs-se a lambiscá-los. Então, de dentro da casa, saiu uma vozinha estridente:

- Rapa, rapa, rapinha,
Quem rapa a minha casinha?

Os meninos responderam:

- O vento, sou eu.
O filho do céu.

e continuaram comendo, sem se perturbar. Joãozinho, que achava o telhado delicioso, arrancou um belo pedaço e Margarida apoderou-se de um vidro inteiro, redondo; sentou-se no chão e comeu-o deliciada.
Mas, de repente, abriu-se a porta e num passo trôpego saiu uma velha decrépita, apoiada numa muleta. Joãozinho e Margarida assustaram-se de tal maneira que deixaram cair o que tinham nas mãos. A velhinha, porém, meneando a cabeça, disse-lhes:
- Ah, meus queridos meninos, quem vos trouxe aqui? Entrai e ficai comigo, aqui nenhum mal vos acontecerá.
Pegou-os pela mão e levou-os para dentro da casinha. Aí serviu-lhes uma deliciosa refeição, composta de leite e bolinhos, maçãs e nozes; depois foram preparadas para eles duas lindas caminhas, muito limpas e alvas; Joãozinho e Margarida, muito cansados, deitaram-se, julgando estar no céu.
A velha fingia ser muito boa, mas na verdade era uma bruxa muito má, que atraía as crianças; para isso havia construido a casinha de pão-de-ló. E, quando caía em suas mãos alguma criança, ela matava-a, cozinhava-a e comia-a, e esse dia era para a bruxa um dia de festa.
As bruxas são, geralmente, míopes e têm os olhos vermelhos, mas são dotadas de um olfato muito agudo, como os animais, o que lhes permite pressentir a chegada de criaturas humanas. Portanto, quando Joãozinho e Margarida se aproximaram da casa, ela riu sarcasticamente, dizendo com os seus botões: "Estes cairam em meu poder, não me escaparão mais."
Pela manhã, bem cedinho, antes que os meninos acordassem, levantou-se e foi espiá-los. Vendo-os bochechudos e coradinhos, a dormir como dois anjinhos, murmurou: "Que petisco delicioso vou ter!" E agarrando Joãozinho com seus dedos aduncos, levou-o para um chi- queirinho, trancando-o dentro das grades de ferro; e de nada lhe adiantou gritar e espernear.
Depois foi ter com Margarida. Com um safanão, despertou-a e gritou:
- Levanta-te, preguiçosa! Vai buscar água e prepara uma boa comidinha para teu irmão, que está preso no chiqueirinho e deve engordar. Pois, assim que estiver bem gordinho, quero comê-lo.
Margarida desatou a chorar amargamente. Mas seu pranto foi inútil e teve mesmo de fazer o que lhe ordenava a perversa bruxa.
Margarida, então, preparava os manjares mais requintados para Joãozinho, enquanto ela não recebia mais do que algumas cascas de caranguejos para comer. Cada manhã a velha arrastava-se até junto da grade e dizia:
- Joãozinho, mostra-me teu dedinho, quero ver se está gordinho!
Joãozinho, porém, mostrava-lhe sempre um ossinho e a velha, que era extremamente míope, não podendo ver direito, julgava que fosse o dedo do menino, ficando muito admirada por ele nunca engordar. Passadas quatro semanas, visto que Joãozinho continuava sempre magro, perdeu a paciência e resolveu não esperar mais.
- Vamos, Margarida, - ordenou à menina - traz água depressa; gordo ou magro não importa, matarei assim mesmo Joãozinho e amanhã o comerei.
Como chorou a pobre irmãzinha ao ter de trazer a água! Como lhe corriam abundantes as lágrimas pelas faces!
- Ah, Deus bondoso, ajuda-nos! - implorava ela. - Antes nos tivessem devorado as feras no meio da floresta! Pelo menos teríamos morrido juntas!
- Deixa de lamentações, - gritou-lhe a velha - elas de nada adiantam.
Pela manhã, bem cedinho, Margarida teve de ir buscar água, encher o caldeirão e acender o fogo.
- Primeiro vamos assar o pão, já preparei a massa, - disse a bruxa - e já acendi o forno.
Empurrou a pobre Margarida para perto do forno do qual saíram grandes labaredas.
- Entra lá dentro, - disse a velha - e vê se já está bem quente para poder assar o pão.
Assim, pensava a bruxa, quando Margarida estivesse lá dentro, fecharia a boca do forno, e a deixaria assar para comê-la também. A menina, porém, adivinhando sua intenção, disse:
- Eu não sei como se faz! Como é que se entra?
- Tonta, estúpida, - disse a velha - a abertura é bastante grande, olha, até eu poderia entrar!
Assim dizendo, abeirou-se da boca do forno, aproximando a cabeça. Margarida, então, com um forte empurrão fez entrar dentro e fechou rapidamente a porta de ferro com o cadeado. Uh! Que berros horríveis soltava a bruxa! Margarida, porém, saiu correndo e a velha acabou morrendo, miseravelmente queimada.
Chegando ao chiqueirinho, a menina abriu a portinhola, dizendo ao irmão:
- Joãozinho, corre, estamos livres; a velha bruxa morreu.
Joãozinho então saiu pulando, alegre como um passarinho ao lhe abrirem a gaiola. Com que felicidade se abraçaram e beijaram, rindo e dançando? Como nada mais tinham a temer, percorreram a casinha da bruxa
e viram espalhadas pelos cantos grandes arcas cheias de pérolas e pedrarias preciosas.
- Estas são bem melhores do que os seixozinhos!
- disse Joãozinho, enquanto ia enchendo os bolsos até não poder mais.
- Também eu, - disse Margarida - quero levar um pouco disso para casa. - E foi enchendo o avental.
- Agora vamos embora daqui, - disse Joãozinho - temos que sair da floresta da bruxa.
Após terem andado durante algumas horas, chegaram à margem de um rio muito largo.
- Não é possível atravessá-lo, - disse Joãozinho
- pois não vejo ponte alguma.
- Nem mesmo um barquinho, - disse Margarida,
- mas olha, aí vem vindo uma pata branca; se lhe pedirmos, ela certamente nos ajudará a atravessar. Pôs-se a chamá-la:

- Patinha, patinha.
Cá estão João e Guidinha.
Não podemos passar,
Queres nos levar?

A pata acercou-se da margem e Joãozinho sentou nas costas, dizendo à irmãzinha que também sentasse, bem juntinho dele. Mas Margarida respondeu:
- Não, ficaria muito pesado para a boa patinha, é melhor que ela nos transporte um de cada vez.
Assim fez a boa patinha; e quando, felizmente, chegaram ao outro lado, depois de caminhar um bom percurso, o bosque foi-se tornando sempre mais familiar até que por fim viram a casa paterna. Deitaram a correr
em sua direção, e lá chegando, precipitaram-se para dentro, onde se lançaram ao pescoço do pai, cobrindo-o de beijos.
O pobre homem nunca mais tivera uma hora feliz desde que abandonara as crianças no meio da floresta. A mulher (para felicidade de todos) havia morrido. Então Margarida sacudiu o avental, deixando rolar pelo chão as pérolas e as pedras preciosas; Joãozinho acrescentou todo o conteúdo de seus bolsos.
Acabaram-se todos os sofrimentos e preocupações e, desde esse dia, viveram os três contentes e felizes pelo resto da vida.
"Minha história acabou, um rato passou, quem o pegar, poderá sua pele aproveitar."


As Três Fiandeiras




Uma moça, bonita e prendada, não encontrava casamento, embora muito merecesse um bom estado. Ia sempre à missa das almas, pela madrugada, e rezava seu rosário para elas. Perto da casa da moça morava um homem rico e solteiro que dizia só casar-se com a melhor fiandeira da cidade. A moça sabendo essa notícia, ia comprar linho à casa do rico, dizendo fiá-lo todo num só dia. O homem ficava pasmado, vendo uma moça tão trabalhadora.

Não dando inteiro crédito ao que ouvia, uma manhã, em que a moça apareceu para mercar um pouco de linho, disse-lhe em tom de brincadeira: moça, se esse linho é fiado num dia, sem entrar pelo serão, leve-o sem pagar e irei ao anoitecer ver sua tarefa.

A moça voltou para casa muito aflita com a promessa porque não podia fiar o linho num dia, nem a metade da porção que trouxera. Pôs o linho nas rocas e começou a chorar, a chorar sem consolo. Quando, estava assim, ouviu uma voz trêmula dizendo:

- Por que chora a minha filha?

Levantou a cabeça e viu uma velha, muito velha, vestida de branco e muito pálida. Contou o que lhe sucedia e a velha disse: vá rezar seu rosário que eu vou ajudá-la um pouco.

A moça foi rezar e quando acabou todo o linho estava fiado e pronto. A velha disse: Se você casar eu virei às bodas e não se esqueça de chamar-me minha tia por três vezes.

A moça prometeu. Quando o mercador chegou e viu o linho fiado, ficou assombrado. Gabou muito a moça e no outro dia mandou, ainda uma porção maior de linho, dizendo que voltaria para ver o resultado. A moça pôs-se a chorar sem parar.

Outra velha apareceu, parecida com a primeira, e fiou o linho num amém, enquanto a moça rezava. e ao despedir-se fez o mesmo pedido que a primeira velha fizera.

Ainda uma vez o mercador visitou a moça e não teve palavras para elogiar o quanto ela fizera num dia. Mandou, de presente, ainda mais linho e o mesmo pedido. A moça voltou a lamentar-se e uma terceira velha apareceu e tudo se passou como de costume, linho fiado e promessa feita,

O mercador veio visitar a moça e pediu-a em casamento, marcando-se o dia. Como um dos presentes de noivado, recebeu a noiva muito linho para fiar, e rocas, fusos, dobraduras e mais apetrechos. A moça estava desesperada com; o seu futuro.

Quando acabou de casar, surgiram na porta as três velhas juntas. A moça, lembrada do que prometera, recebeu-as muito bem, tratando-as por tias, oferecendo comida, bebida, assento, e fazendo toda a sorte de agrados e oferecimentos. O noivo não tinha cobro do espanto que lhe causava a feição de cada uma das velhas. Não se contendo, perguntou:

- Por que as senhoras são assim, corcovadas, alhos esbugalhados e queixos para fora? Foi alguma doença?

- Não foi, senhor sobrinho - responderam as velhas - foi o fiar que nos deu essas pechas. Fiamos anos e anos e ficamos assim, corcovadas pela posição, olhos esbugalhados de acompanhar o trabalho, queixos feios pela tarefa com os tomentos.

O noivo não quis mais saber de rocas, fusos e dobraduras. Agarrou tudo e atirou o pano o meio da rua, dizendo que jamais sua mulher havia de pegar num instrumento que a faria tão feia.

Viveram muito felizes. As três velhas eram as "alminhas," agradecidas pela devoção da moça.