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A DISCIPLINA DO AMOR







        Foi na França, durante a Segunda Grande Guerra; um jovem tinha um cachorro que todos os dias, pontualmente, ia esperá-lo voltar do trabalho.
Postava-se na esquina, um pouco antes das seis da tarde. Assim que via o dono, ia correndo ao seu encontro e, na maior alegria, acompanhava-o com seu passinho saltitante de volta a casa. A vila inteira já conhecia o cachorro e as pessoas que passavam faziam-lhe festinhas e ele correspondia, chegava a correr todo animado atrás dos íntimos. Para logo voltar atento ao seu posto e ali ficar sentado até o momento em que seu dono apontava lá longe.
      Mas eu avisei que o tempo era de guerra, o jovem foi convocado. Pensa que o cachorro deixou de esperá-lo? Continuou a ir diariamente até a esquina, fixo o olhar ansioso naquele único ponto, a orelha em pé, atenta ao menor  ruído que pudesse indicar a presença do dono bem-amado. Assim que anoitecia, ele voltava para casa e levava a sua vida normal de cachorro a´te chegar o dia seguinte. Então, disciplinadamente, como se tivesse um relógio preso à pata, voltava ao seu posto de espera.
      O jovem morreu num bombardeio, mas no pequeno coração do cachorro não morreu a esperança. Quiseram prende-lo, distraí-lo. Tudo em vão. Quando ia chegando aquela hora ele disparava para o compromisso  assumido todos os dias. Todos os dias.
       Com o passar dos anos (a memória dos homens!) as pessoas foram se esquecendo do jovem soldado que não voltou. Casou-se a noiva com um primo. Os familiares voltaram-se para outros familiares. Os amigos, para outros amigos. Só o cachorro, já velhíssimo (era jovem quando o jovem partiu), continuou a esperá-lo na sua esquina. As pessoas estranhavam, mas quem esse cachorro está esperando?... Uma tarde (era inverno) ele lá ficou, o focinho voltado para aquela direção.
                                                                 

 Lygia Fagundes Telles

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