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O gato e a barata






A baratinha velha subiu pelo pé do copo que, ainda
com um pouco de vinho, tinha sido largado a um canto
da cozinha, desceu pela parte de dentro e começou a
lambiscar o vinho. Dada a pequena distância que nas
baratas vai da boca ao cérebro, o álcool lhe subiu logo
a este. Bêbada, a baratinha caiu dentro do copo. Debateu–
se, bebeu mais vinho, ficou mais tonta, debateu–
se mais, bebeu mais, tonteou mais e já quase morria
quando deparou com o carão do gato doméstico que
sorria de suas aflições, do alto do copo.
- Gatinho, meu gatinho – pediu ela – Me salva, me salva. Me salva que assim que eu sair eu deixo
você me engolir inteirinha, como você gosta. Me salva.
- Você deixa mesmo eu engolir você? – disse o gato.
- Me saaaalva! – implorou a baratinha. – Eu prometo.
O gato então virou o copo com uma pata, o líquido escorreu e com ele a baratinha que, assim que
se viu no chão, saiu correndo para o buraco mais perto, onde caiu na gargalhada.
- Que é isso? – perguntou o gato. – Você não vai sair daí e cumprir sua promessa?
Você disse que deixaria eu comer você inteira.
- Ah, ah, ah – riu então a barata, sem poder se conter. – E você é tão imbecil a ponto de acreditar
na promessa de uma barata velha e bêbada?

Moral: Às vezes a autodepreciação nos livra do pelotão.

FERNANDES, Millôr. Fábulas fabulosas. 8. ed. Rio de Janeiro, Nórdica, 1963. p. 15-6.


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