João,o sujão - Professora: Heliania - Creche Raimunda Gomes de Azevedo










A tesoura e a agulha








Desde pequena, a moça se acostumara a conviver com tecidos, tesouras, agulhas e linhas de diversos padrões e cores. Sua mãe, exímia costureira, sustentava toda a família com muito trabalho e honestidade.
A moça casara com um frio empresário que gastava as energias com os negócios e dava muita importância ao que ela nem sempre julgava essencial.
Já estava acostumada a ver o marido cortar os passeios com os filhos por um almoço de negócios, já não agüentava ouvir o marido falar em cortes, mudanças precipitadas... Isso sem falar nas inúmeras vezes que foi cortada ao tentar argumentar, discutir os problemas do cotidiano...
Numa rara noite em que todos estavam em casa, a caçula começou a implicar com o irmão.
O pai, sempre ocupado, não suportava o barulho e sem querer ouvir ou entender a situação mandou as duas crianças para o quarto, sem conversa.
A mulher simplesmente pegou sua caixinha de costura com alguns retalhos e chamou o marido:
- Agora não, meu bem!
- Agora sim, querido!
O homem percebendo que não tinha escolha, sentou-se e ficou olhando os retalhos, a agulha, a tesoura, carretéis de linha sem nada compreender.

- Meu bem, para que serve a tesoura? - perguntou brandamente a mulher.
- Para cortar, aparar...
- E a agulha?
- Para costurar, ora!
- Você consegue fazer uma colcha de retalhos só cortando?
- Na verdade não faria de jeito nenhum - não sei costurar, lembra?
- Não estou brincando! Você já viu ou soube de alguma costureira que costura sem linha e agulha, só com tesoura?
- Claro que não, meu amor.
- Minha mãe me falou um dia, quando meu pai nos deixou, que nossa família era como uma colcha de retalhos. Cada um de nós era um retalho colorido. Para que nossa colcha fique sempre bonita precisamos usar a agulha e as linhas.
- E daí?
- Daí que você só sabe usar a tesoura. Corta nossos momentos de lazer, corta a minha palavra, corta o diálogo com as crianças. Você só separa, separa...
- Eu?
- Sim. Aprenda a unir nossa família. Aprenda a unir o seu trabalho à nossa família, unir os seus amigos aos meus... Qualquer dia você perceberá o quanto nos cortou de sua vida e talvez seja tarde.
O marido nada disse - sinal de que ia pensar, refletir. Mudanças demandam tempo.

- Não vou mais falar sobre isso. Só quero que você pense, tá? Estou no quarto das crianças. Vou costurá-las porque não quero dois retalhos tão importantes de minha vida separados. Boa noite!
- Boa noite.
Dali a meia hora o marido entrou no quarto em que brincavam as crianças, enquanto a mulher costurava uma bonita colcha de retalhos.
A cena enterneceu o homem e o fez juntar-se aos três. Abraçou-os e os levou para jantar.

Do livro: Histórias que Motivam
Autor: Assis Almeida
Editora: Premius Editora

O Camponês Ling e Suas Sete Máscaras









Era uma vez um camponês que tinha medo, muito medo. Tanto medo que saía pouco. Plantava e criava animais em sua própria terra, para não precisar sair muito. Como saía pouco, cada vez foi ficando com mais medo e pensou que uma forma de esconder o medo era usar uma máscara. Fez uma, mas achou que em certas ocasiões talvez fosse melhor fazer mais uma e assim fez duas, depois três, quatro, cinco, seis e sete. E mais não fez porque não tinha como colocá-las. Aí parou de fazer máscaras, usava uma sobre a outra. Estas máscaras pesavam, incomodavam, via pouco, ouvia pouco, perdeu a noção de calor e frio, desaprendendo a viver sem máscaras. Passou a sair menos ainda porque assim não tinha que responder perguntas, nem ver gente. Plantava, colhia, cuidava dos animais. Fazia grandes provisões para sair cada vez menos. Um dia percebeu que não tinha mais sal, mas para não ter que sair passou sem sal, a comida perdeu o sabor e um de seus poucos prazeres terminou. Apesar disto resistiu muito, comendo a comida sem sal até resolver que precisava ir à vila mais próxima para comprar sal. Mas, fazia tanto tempo que não saía, que não lembrava mais do caminho. Só conseguia lembrar vagamente que precisava encontrar uma trilha dentro do bosque. Adiou, adiou até que resolveu enfrentar o medo e foi. Entrou no bosque e havia várias trilhas, escolheu uma, andou muito, anoiteceu e o LING percebeu que não sabia mais chegar à vila. Então teve muito medo. Teve medo do escuro, do frio, dos animais e dos salteadores. Só que não tinha escolha, pois não sabia voltar, encolheu-se e dormiu. No meio da noite foi acordado, eram os salteadores. Queriam dinheiro. Não havia dinheiro. Tinha apenas alguns ovos que usaria para trocar pelo sal. Os salteadores irritados levaram os ovos, suas roupas, sapatos, as máscaras e também lhe deram uma surra.
O camponês LING machucado e com medo encolheu-se e chorou. Depois o cansaço foi maior que o medo e LING dormiu. Foi acordado por um forte calor e viu uma claridade que não sabia o que era, nem de onde vinha. Desta vez não teve medo, sentiu-se bem, espreguiçou-se, esquentou-se e dançou. Ficou alegre e lembrou que aquele calor e aquela luz eram do sol, e ficou espantado tentando entender como havia esquecido do Sol.
LING caminhou nu e feliz, descobrindo cores, cheiros, novas trilhas e muitas coisas com novos sabores para comer nestes caminhos. Riu e pulou feliz com as descobertas e esqueceu de que havia saído para buscar o sal. Quando chegou ao fim de uma das trilhas, ficou surpreso pois havia voltado ao começo do caminho, e estava perto da casa.
LING improvisou uma canção ao ver sua casa, deu comida aos animais, cuidou de suas plantas e colheu o que havia para ser colhido. Aí lembrou-se do sal e que afinal tudo tinha acontecido por causa dele. Zangado, LING começou a esbravejar, e a querer destruir tudo a sua volta. Na sua fúria virou uma tina em que há muito tempo havia colocado água do mar e para sua surpresa esparramou-se uma grande quantidade de poeira branca. LING provou uma pitada da poeira e descobriu que no fundo da tina, na qual não mexia há anos, havia se acumulado uma grande quantidade de sal...


(Fábula chinesa oriunda de tradição oral - Autor anônimo)

Sempre Não






Um cavaleiro, casado com uma dama nobre e formosa, teve de ir fazer uma longa jornada: receando acontecesse algum caso desagradável enquanto estivesse ausente, fez com que a mulher lhe prometesse que enquanto ele estivesse fora de casa diria a tudo: – Não. Assim pensava o cavaleiro que resguardaria o seu castelo do atrevimento dos pajens ou de qualquer aventureiro que por ali passasse. O cavaleiro já havia muito que se demorava na corte, e a mulher aborrecida na solidão do castelo não tinha outra distração senão passar as tardes a olhar para longe, da torre do miradouro. Um dia passou um cavaleiro, todo galante, e cumprimentou a dama: ela fez-lhe a sua mesura. O cavaleiro viu-a tão formosa, que sentiu logo ali uma grande paixão, e disse:
– Senhora de toda a formosura! Consentis que descanse esta noite no vosso solar?
Ela respondeu:
– Não!
O cavaleiro ficou um pouco admirado da secura daquele não, e continuou:
– Pois quereis que seja comido dos lobos ao atravessar a serra?
Ela respondeu:
– Não.
Mais pasmado ficou o cavaleiro com aquela mudança, e insistiu:
– E quereis que vá cair nas mãos dos salteadores ao passar pela floresta?
Ela respondeu:
– Não.
Começou o cavaleiro a compreender que aquele Não seria talvez sermão encomendado, e virou as suas perguntas:
– Então fechais-me o vosso castelo?
Ela respondeu:
– Não.
– Recusais que pernoite aqui?
– Não.
Diante destas respostas o cavaleiro entrou no castelo e foi conversar com a dama e a tudo o que lhe dizia ela foi sempre respondendo
– Não.
Quando no fim do serão se despediam para se recolherem a suas câmaras, disse o cavaleiro:
– Consentis que eu fique longe de vós?
Ela respondeu:
– Não.
– E que me retire do vosso quarto?
– Não.
O cavaleiro partiu, e chegou à corte, onde estavam muitos fidalgos conversando ao braseiro, e contando as suas aventuras. Coube a vez ao que tinha chegado, e contou a história do Não; mas quando ia já a contar a modo como se metera na cama da castelã, o marido já sem ter mão em si, perguntou agoniado:
– Mas onde foi isso cavaleiro?
O outro percebeu a aflição do marido e continuou sereno:
– Ora quando ia eu a entrar para o quarto da dama, tropeço no tapete, sinto um grande solavanco, e acordo! Fiquei desesperado em interromper-se um sonho tão lindo.
O marido respirou aliviado, mas de todas as histórias foi aquela a mais estimada.


Conto Português

A Formiguinha







Diz que era um dia que era uma formiguinha, foi comer pela manhã. Quando ela estava comendo, a neve pegou o pé. Ela disse:

— Neve, tu é tão valente
Que o meu pé prende?

A neve disse:
— Mais valente é o sol
Que me derrete

Ela foi à procura do sol:
— Ó, sol, tu é tão valente
Que derrete a neve
Que o meu pé prende?

O sol disse:
— Mais valente é a parede
Que me encobre

Ela foi para a parede:
— Ô, parede, tu é tão valente
Que encobre o sol
O sol derrete a neve
E a neve o meu pé prende?
A parede disse:
— Mais valente é o rato
Que me rói
Ela foi à procura do rato:
— Ô, rato, tu é tão valente
Que rói a parede
A parede encobre o sol
O sol derrete a neve
E a neve o meu pé prende?

O rato disse:
— Mais valente é o gato
Que me come

A formiguinha disse:
— Ô gato, tu é tão valente
Que come o rato
O rato rói a parede
A parede encobre o sol
O sol derrete a neve
E a neve que o meu pé prende?

Ele disse:
— Mais valente é a cobra
Que me morde

— Ô, cobra, tu é tão valente
Que morde o gato
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
E a neve que o meu pé prende?
— Mais valente é o pau
Que me mata

— Ô, pau, tu é tão valente
Que mata a cobra
A cobra que morde o gato
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
E a neve que o meu pé prende?

— Mais valente é o fogo
Que me queima

— Ô, fogo, tu é tão valente
Que queima o pau
O pau que mata a cobra
A cobra que morde o gato
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
A neve que o meu pé prende?

— Mais valente é a água
Que me apaga

— Ô, água, tu é tão valente
Que apaga o fogo
O fogo queima o pau
O pau que mata a cobra
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
A neve que o meu pé prende?

— Mais valente é o boi
Que me bebe

— Ô, boi, tu é tão valente
Que bebe a água
A água apaga o fogo
O fogo que queima o pau
O pau que mata a cobra
A cobra que morde o gato
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
E a neve que o meu pé prende?

— Mais valente é o homem
Que me mata

— Ô, homem, tu é tão valente
Que mata o boi
O boi que bebe a água
A água que apaga o fogo
O fogo que queima o pau
O pau que mata a cobra
A cobra que morde o gato
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
E a neve que o meu pé prende?

— Mais valente é Deus
Que me criou

— Ô, Deus, vós é tão valente
Que mata o homem
O homem que mata o boi
O boi que bebe a água
A água que apaga o fogo
O fogo que queima o pau
O pau que mata a cobra
A cobra que morde o gato
O gato que come o rato
O rato que rói a parede
A parede que encobre o sol
O sol que derrete a neve
E a neve que o meu pé prende?

Ele disse:
— Ô xente!... que desaforo você vim aqui...
Aí Deus pegou, deu um cocorote — pá! — na cabeça da formiguinha... se retorceu toda, quando caiu em baixo... esses formigueiros todos que têm pelo mundo foi gerado dessa formiguinha.

Versão procedente de Maruim, SE, colhida em Aracaju, em 14 de abril de 1972. Informante: Dona Caçula.