Quando eu era criança, costumava passar férias na fazenda do meu
avô materno, Juca Jambi ‘’José Honório Medeiros’’. Lembro-me que, na época,
estava iniciando a construção da rodovia do oeste, hoje rodovia castelo branco.
Era trator pra todo lado. A casa sede ficaria hoje exatamente no km 69.5, bem
no alto de um grande morro que foi cortado ao meio. Éramos um bando de
moleques: eu, meus primos e tios. Lembro-me como se fosse hoje. Quando
anoitecia nos juntávamos ao redor da casa grande e ficávamos horas caçando vaga
lumes e colocando-os dentro de uma garrafa, a qual usávamos depois como lampião
em nosso quarto, pois na época, quando anoitecia, era tudo um verdadeiro breu.
Deitávamos todos juntos. Os colchões eram tantos que era impossível
nos locomovermos de um lado para o outro sem pisarmos em alguém. A gente só
sossegava quando meu tio Zé Medeiros vinha pro quarto e começava a contar suas histórias, que eram sempre escabrosas.
De todas que me lembro, uma ficou na minha memória, a história do Betão
forquilha, sujeito de meia idade, alto, forte e que trabalhava como retireiro
na fazenda há muitos anos. Desde garoto, Betão Furquilha tinha esse nome, por
ter as pernas envergadas como uma forquilha de estilingue, como se estivesse
montado num cavalo, mas sem o cavalo por debaixo dele.
Meu tio começou a história, dizendo que há muito tempo, quando Betão
tinha uns 18 anos de idade, saiu pra uma cavalgada pras bandas do morro do
saboo. Era uma noite muito escura e ameaçava um temporal daqueles. Naquelas
bandas, bem próximo de onde ele estava cavalgando, morava um chinês que tinha
fama de ser muito mal.
Sem outra alternativa, e o temporal já começando, Betão tocou seu
cavalo rumo à casa do chinês. Assim que ele chegou ao destino e foi bater na
porta, ela já foi aberta por uma linda moça, vestida num quimono de seda. Ela
imediatamente pediu para Betão entrar. Deu-lhe roupa seca e, no jantar,
apresentou seu avô, Chuan Chen. Homem sério, de poucas palavras, muito
observador e, devido a suas tradições orientais, era também uma pessoa muito
conservadora.
Terminaram o jantar, mas a chuva e os trovões não paravam por nenhum
segundo. Betão não estava se importando nem pouco com o que acontecia lá fora,
pois seus olhos não desgrudavam da linda menina chinesa. Foi aí que, com
segundas intenções, Betão teve a ideia mais infeliz de sua vida, a de pedir
permissão para Chuan Chen de dormir ali aquela noite devido ao mau tempo que
fazia.
Chuan Chen permitiu, mas disse:
- Se moço
bole com neta minha, vai sofrer três torturas chinesas.
Essas foram as únicas palavras daquele chinês o tempo todo.
Lá pelas tantas, o velho foi se deitar, deixando sozinhos sua neta e o hóspede
Betão na sala da casa. Bastou uma boa conversa e Betão convenceu a chinesinha a
se deitar com ele para terem uma noite de prazeres. No quarto, durante as
preliminares ela disse:
- Betão não
tem medo das três torturas chinesas.
E Betão com um grande sorriso respondeu:
- Você vale
mais do que qualquer tortura.
Foi sexo e amor a noite inteira.
Pela manhã bem cedinho, Betão acordou com um peso no peito,
abriu os olhos e avistou uma imensa pedra em cima dele, na qual estava escrita
a seguinte frase:
- Primeira
tortura chinesa: pedra no peito.
Betão, com muito esforço, conseguiu tirar a pedra de cima dele e a
empurrou pela janela do quarto. Assim que a pedra virou e começou a cair, ele
viu outra frase escrita.
- Segunda
tortura chinesa: corda amarrada na pedra e no testículo direito.
Ahhhh, mais que depressa Betão se jogou pela janela junto com
a pedra. Daí, enquanto os dois caiam, viu outra frase...
- Terceira tortura
chinesa: corda amarrada no pé da cama e no testículo esquerdo.
É por isso que Betão virou Betão forquilha.
O mais interessante nesta história é que, depois de uma
pequena pausa, tio Zé disse:
- Vamos lá
pessoal, podem separar os joelhos. É apenas uma história.
Obs: há poucos anos, estive na região do saboo, procurando o
tal chinês e sua neta, não encontrei ninguém. A única coisa que achei por ali
foi uma casa quase que totalmente destruída pelo tempo e embaixo de uma de suas
janelas uma imensa pedra fincada no chão.
Contada por Zé Paulo Medeiros.
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