Era uma noite fria antes do
Natal, mas dentro da casa do Doutor Stahlbaum estava quentinho. Os filhos dele
falavam animados lá da cozinha sobre os presentes de natal que estavam atrás da
porta da sala - embrulhados com muito cuidado em papéis coloridos. “Tenho
certeza que nesse ano o tio Drosselmeier vai nos dar um exército de soldados!”
disse Fritz. “Eles lutarão uns contra os outros com armas e canhões!”
“Eu espero que ele não dê! Eu
quero que ele nos dê algo mais bonito do que isso - algo como um teatro mágico!
Imagina - com uma orquestra tocando e bailarinas dançando pelo palco!” disse a
irmã dele, com ar de sonhadora. “Ai, coitadinha, como acredita nessas coisas?!
O tio Drosselmeier não faz mágicas!”, disse Fritz. “Será que não faz mesmo?”,
Clara persistiu.
Não foi fácil juntar a grande
família na sala, mas logo, todos estavam reunidos na frente da árvore de Natal.
Os presentes atraíram as crianças, que começaram a abrir - bonecas e soldados
de chumbo saíam das caixas.
Só quem não estava lá, era o Tio
Drosselmeier. “Viu! Ele está se escondendo da gente!” disse Clara, mas Fritz
não concordava “Eu aposto que ele nem se lembra que hoje é noite de Natal. Ele
é tão estranho às vezes…”
As crianças não disseram nada
sobre isso, elas não acharam educado perguntar. Mas Clara depois aproximou-se
de um homem. Ela segurava um desenho de uma fada, que ela mesma tinha feito.
“Fiz isso para você, tio Drosselmeier!”
O velho homem ficou emocionado
com o presente de Clara. Ele então pegou um pequeno embrulho no bolso do
casaco. “O que será isso que tenho para minha pequena Clara e o menino Fritz?
Qual de vocês dois quer abrir?”
Fritz ficou decepcionado pois o
presente era muito pequeno, então ele disse: “A Clara, pode abrir.” Ela adorou
a oportunidade e começou a olhar o pequeno embrulho antes de abri-lo. “É um
boneco”, sussurrou para si mesma, e abriu o presente.
E era realmente um boneco.
Porém, um boneco diferente. Era um soldado e ao mesmo tempo, um quebra-nozes. A
boca do soldado ficava toda aberta, que cabia uma noz inteirinha para ser
quebrada.
“Sinceramente, não é um
brinquedo muito bonito, mas pelo menos o soldado é engraçado”, pensou Clara, e
agradeceu o tio pelo presente. Fritz não gostou nada do brinquedo. “Ele é tão
inútil, exceto para quebrar nozes.” murmurou ele.
E foi exatamente isso que a
família fez depois do jantar. Clara teve dificuldades em apertar o quebra-
nozes com as nozes dentro, enquanto que o Fritz era forte o suficiente para
quebrar as nozes, até que ele tentou quebrar uma noz muito grande e dura. Ele
ficou apertando e apertando...
...Até que quebrou! O soldado
ficou apenas com metade da sua boca, e agora ficou mais feio ainda.
“Por que você fez isso?” gritou
Clara, que pegou o soldado de chumbo e sua mandíbula com cuidado, e correu para
sua mãe dizendo a ela o que aconteceu. “Ai, filha...Eu prometo que quando eu
disser isso para o tio Drosselmeier, ele vai fazer um novo quebra-nozes tão bom
quanto esse,” disse sua mãe.
Isso não ajudou muito, porque
Clara gostava daquele quebra-nozes-soldadinho, e agora que ele estava ferido,
Clara sentiu-se muito pior só de pensar em substituí-lo por outro. Ela então
deixou o soldadinho embaixo da árvore de Natal, mas depois imaginou que ele
poderia sentir-se muito sozinho, então Clara dormiu junto com ele, entre os
presentes de Natal.
À meia noite o relógio tocou e
acordou Clara. Primeiramente ela ficou meio perdida, pois não estava na cama.
Mas depois ela olhou para frente, e não pôde acreditar no que estava vendo. Era
o tio Drosselmeier sentado no topo da árvore de Natal, no lugar do anjo. “Tio
Drosselmeier!” gritou Clara, mas ele não a escutava, pois ele era apenas um
boneco.
Aí, ela olhou para o
quebra-nozes. Ele estava caído no chão, e uma das suas partes estava faltando.
De repente, o soldadinho virou seu rosto e sorriu para Clara, com sua metade da
boca.
“Aaaah!” Ela virou e saiu
correndo, mas quando começou a correr, viu que o chão todo estava coberto de
ratos. E todos os ratos vestiam uniformes de soldados, com armas. Eles eram
comandados por uma terrível criatura com sete cabeças. Cada cabeça tinha uma
coroa de ouro. Essa criatura era o Rei dos Ratos.
Clara era muito corajosa, mas
você tem que concordar que um rato com sete cabeças pode assustar qualquer um.
Ela queria correr, mas quando olhou para trás, viu que o Quebra-Nozes estava
comandando um exército de brinquedos atrás dele. Quando estavam todos alinhados
e prontos para a batalha, o Rei dos Ratos e o Quebra-Nozes deram o sinal para
que seus soldados começassem a atacar.
O choque foi grande, mas ainda
mais espetacular foi a luta entre os dois líderes. O Quebra-Nozes lutou muito
contra do Rei dos Ratos, que estava mordendo o corpo do Soldado com suas sete
cabeças. Se ao menos o Soldado- Quebra-Nozes pudesse morder os pescoços do
ratos com suas mandíbulas.. mas ele só podia usar as pernas saltando e chutando
o Rei dos Ratos.
Os ratos soldados cercaram o
Quebra-Nozes, pegaram ele pelos pés e o levantaram, mas Clara jogou um dos
chinelos que estava usando no Rei dos Ratos. Ele correu e se escondeu em um
buraco da parede. Os soldados dele também se esconderam, pois ficaram
assustados com a boneca gigante e seu chinelo.
Os brinquedos começaram a dançar
e festejar. E festejaram por toda a noite. Quando chegou a manhã, foram todos
para suas caixas. Clara também foi dormir em sua cama.
De manhã, o tio Drosselmeier já
estava esperando por ela na cozinha com um quebra-nozes em suas mãos - ele
consertou a boca e o soldadinho. Ele estava como novo. “Muito obrigada, tio!
Ele é o melhor presente que eu tive na vida!” e aí Clara contou-lhe o sonho que
teve. “Realmente, é um sonho muito interessante. Isso me lembrou uma história…”
disse ele.
“Em um Natal, muitos ratos
invadiram um palácio e comeram toda a comida que seria servida no almoço do
Rei. O Rei ordenou ao seu inventor especial, que também se chamava
Drosselmeier, que criasse ratoeiras e que as espalhasse por toda a cozinha.
Diversos ratos foram presos nas
ratoeiras e a Rainha deles ficou furiosa. Ela então achou o quarto da Rainha
humana e em uma noite, subiu no vestido dela. “Como ousa você matar minhas
crianças?” gritou a Rainha rata. “Eu farei vocês pagarem pelo que fizeram. Vou
transformar o rosto lindo de sua filha em algo tão feio, que você não vai
querer mais olhar para ela,” disse a rata, e correu para trás das cortinas.
Quando o Rei soube da ameaça,
ele ordenou que sete gatos tomassem conta da cama da princesa à noite, e não
deixassem nenhum rato chegar perto dela. Mas como os gatos dormem à noite, a
Rainha dos ratos conseguiu chegar até a cama da princesa e jogou o feitiço
nela.
De manhã, quando a princesa
olhou-se no espelho, gritou de pavor. Seu nariz estava enorme e os olhos
pequenininhos. Ela se parecia com um rato. Seus cabelos eram bagunçados e ela
tinha verrugas no queixo. A Rainha e o Rei ficaram furiosos quando viram o que
tinha acontecido com a filha.
O Rei ordenou que Drosselmeier
inventasse alguma coisa que fizesse a princesa voltar a ser como era, e deu-lhe
o prazo de um mês. Mas o pobre inventor não era mágico, e ele não tinha a
mínima ideia de como faria isso. Então, ele pediu um conselho a um amigo. “A
princesa deverá comer a noz mais dura de abrir. Mas, só quem poderá abrir essa
noz, será um rapaz que nunca fez a barba, e ele deverá fazer isso de olhos
fechados. Depois, o rapaz deverá dar sete passos para trás sem tropeçar. Só
assim a princesa estará curada.” Esse conselho era bastante estranho, mas como
ele não tinha escolha, Drosselmeier aceitou.
O inventor procurou a noz com a
casca mais dura de todo o reino. Na segunda semana, conseguiu finalmente
encontrar, e foi até o Rei. “Agora temos apenas que achar o rapaz certo para
fazer o trabalho,” disse ele. O Rei anunciou a todos que o homem que
conseguisse curar a princesa, se casaria com ela. Vieram muitos rapazes, que
tentaram, mas nenhum deles foi forte o suficiente para quebrar a noz com suas
próprias mãos.
Até que um dia, o sobrinho de
Drosselmeier veio visitar seu tio. Já tinha se passado quase um mês inteiro, e
o velho inventor pediu para que o sobrinho tentasse a sorte também. Ele era
jovem, e nunca tinha feito a barba, então era um bom candidato. Quando deram a
noz para ele, ele a colocou na boca entre os dentes, fez força, e conseguiu
quebrar a noz. Depois, deu os sete passos para trás.
Mas… Ele tropeçou no sétimo
passo. Mesmo assim, ele conseguiu curar a princesa. Só que, por conta de seu
tropeço, o rosto dele ficou feio. O sorriso lindo dele tornou-se um sorriso
bobalhão, e a cabeça dele cresceu. Uma barba grisalha cobriu seu rosto, junto
com um bigode comprido. E ele não só parecia um feio, mas um bobo.
E apesar de ele ter sido o único
que conseguiu cumprir a tarefa, a princesa recusou-se a casar com um homem tão
feio. O Rei teve que concordar que uma linda princesa não poderia se casar com
um rapaz feio e bobalhão. Todos começaram a caçoar do sobrinho do Drosselmeier
e nem o deixaram mais ir para a escola por conta de sua aparência feia. Ele
nunca mais saiu de casa depois disso.”
Clara não conseguiu dormir
naquela noite. Quando ela foi para a cama, ficou escutando a voz do Rei dos
Ratos. “Ou você me dá seus doces, ou vou comer a cabeça do seu boneco.” Clara
imediatamente foi pegar todos os doces que ela tinha guardado e os deu para o
Rei dos Ratos. Ele rapidamente os devorou, e pediu mais.
Então, ela foi para o térreo da
casa e pegou todos os doces que conseguiu achar - mas o Rei dos Ratos queria
mais e mais, aí ela deu a ele o pudim de Natal, um bolo e biscoitos. Os doces
estavam acabando e Clara não tinha mais idéia do que fazer. Ainda mais quando
imaginou a reação da sua mãe no dia seguinte… e ela começou a chorar. O
Quebra-Nozes escutou o choro de Clara e correu para encontrá-la. Quando ele
chegou, não esperou. Agora que a boca dele estava concertada, ele mordeu as
cabeças do Rei dos Ratos uma por uma.
Clara levou o seu herói para a
cama com ela, e eles assistiram ao mais fabuloso show de brinquedos que se
possa imaginar. Os bonecos dançaram pelo chão a noite toda.
Clara acordou de manhã, e foi
correndo ao encontro da mãe para dizer o que tinha acontecido durante a noite.
Mas depois que sua mãe escutou a história sobre a luta entre o Rei dos Ratos e
o corajoso Quebra-Nozes, ela disse “Clara, pare de acreditar nos seus sonhos!”
mas a menina tirou sete coroas de ouro do seu bolso para provar que não se
tratava de imaginação. Mesmo assim, a mãe não acreditou nela.
Clara voltou para o quarto
chorando. “Eu vou ficar com o Quebra-Nozes para sempre. E se ele fosse um
menino de verdade, eu o amaria pelo seu bom coração. Não importa o quão feio
ele fosse.” Clara disse isso e uma lágrima caiu em seu peito. Logo depois,
escutou a voz do seu tio.
Clara correu para dizer ao seu
tio o que ela estava pensando, mas ficou surpresa ao ver que o tio Drosselmeier
não estava sozinho. O sobrinho dele estava lá. Ele não era mais feio, ao
contrário, era lindo e com um sorriso doce. No momento que Clara tinha dito que
“amaria o Quebra-Nozes pelo seu bom coração”, ela fez com que o feitiço se
quebrasse. E agora o seu corajoso Soldado estava bem na sua frente. E no
primeiro momento que seus olhos se encontraram, souberam que um dia eles se
casariam e viveriam felizes para sempre.
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