— Mãe, já não sou uma
criança — disse Akli. — Quero ir buscar a minha espada na casa do tio, na
cidade.
— És demasiado novo, filho. Para chegares à cidade, tens de atravessar o deserto. Se fores sozinho, arriscas-te a encontrar os Kel Essuf, esses gênios malvados e horrendos como monstros.
— Mas eu não tenho medo deles — falou Akli.
Como o pai não estava em casa e a mãe não o proibira de ir, Akli decidiu pôr-se a caminho. Procurou, então, Abdallâh, um beduíno que conhecia todos os trilhos.
— Levas-me até ao meu tio, Abdallâh? Quero ir buscar a minha espada.
— És demasiado jovem para teres uma espada e nem sequer tens uma moeda para me dar. Põe-te a andar!
Akli não se deixou desencorajar e pediu a um camelo:
— Azumar, leva-me à cidade, já que gostas tanto de viajar.
— Estou velho demais — respondeu o camelo.
— Dar-te-ei uma sela de prata — prometeu Akli.
Ao ouvir estas palavras, Azumar ficou radiante e aceitou a proposta do rapaz, que pensou para consigo: "Que camelo mais pateta! Acreditou mesmo que vou dar-lhe uma sela de prata. Como é fácil enganá-lo."
Quando já viajavam há três horas, Akli avistou um gênio. Era escuro como madeira queimada e ameaçou:
— Ou me dás de beber ou não te deixarei passar!
Akli só tinha um cantil de água. Não podia dá-lo ao gênio. Então, teve uma ideia. Pôs-se a cantar a canção mais triste que conhecia. Ao ouvi-la, o monstro começou a chorar. Em breve, chorava tão copiosamente que bebeu todas as suas lágrimas e acabou por deixar passar o rapaz.
— Como vês, Azumar — disse Akli, algum tempo depois — já sou um homem. Não tive medo. Sou o grande príncipe do deserto.
— Não te alegres antes do tempo, meu rapaz — advertiu o camelo. — Ora vê o que vem lá.
A areia mexeu-se. Um outro gênio avançou, do tamanho de uma nuvem.
— Ou me fazes rir ou não te deixo passar!
Akli ficou atrapalhado. Não conhecia nenhuma história que fizesse rir um gênio. Este pareceu zangar-se. Então, o camelo aproximou-se dele e começou a lamber-lhe os dedos dos pés. O gênio desatou a rir e deixou-os passar.
Um pouco mais à frente, aproximou-se um outro gênio, maior do que uma duna.
— Ou me metes medo ou não te deixo passar!
Akli ficou novamente atrapalhado. Não conhecia nenhuma história que metesse medo a um gênio. O camelo aproximou-se do monstro e virou-se de costas para ele. Bruscamente, expeliu do traseiro uma enorme quantidade de ar, que soou como um tiro de espingarda.
O gênio, apavorado, deu um grito e deixou-os passar.
— É a segunda vez que te salvo — comentou Azumar, algum tempo depois. Penso que mereço bem a minha sela de prata.
— Claro que mereces. És como um irmão para mim — respondeu Akli, fazendo-lhe festas.
De repente, Azumar deu um grito de alegria:
— Olha! Conseguimos! Chegamos à cidade.
Akli nunca tinha visto uma cidade tão grande, com tantas coisas para comprar. Tinha duas pequenas moedas no bolso e com elas comprou um grande bolo de mel para si e um menor para o camelo.
— E a minha sela de prata? — perguntou Azumar.
— Compro-te mais tarde. Prometo! — respondeu Akli.
Enquanto comia o bolo, o rapaz pensava: "Deixa-o sonhar. É tão fácil enganá-lo."
Akli foi visitar o tio, que ficou surpreendido de o ver.
— Os teus pais deixaram-te viajar sozinho pelo deserto, com a tua idade? — perguntou-lhe.
— Deixaram. Na minha aldeia todos sabem que já sou um homem.
O tio deu-lhe, então, uma bela espada, ornamentada com duas pedras azuis como o céu.
Nessa mesma noite, deitado numa esteira, Akli adormeceu tranquilo, com a espada apertada contra si. Azumar dormiu ao relento, preso a uma corda, mas não estava triste.
— De certeza que amanhã receberei a minha sela — pensava, fechando os olhos docemente.
No dia seguinte, Akli agradeceu ao tio as suas hospitalidade e oferta, e montou Azumar. No deserto, o vento soprava sem parar e Akli divertiu-se a aparar os grãos de areia com a espada.
— Não te alegres antes do tempo — avisou o camelo. — Vê só o que vem aí.
De repente, levantou-se uma tempestade de areia. Os gênios tinham-se escondido porque têm sempre pavor do vento. Como haviam de avançar e descobrir o trilho na areia? Mas Azumar era forte e corajoso. Não fraquejou e seguiu, determinado, em frente.
— Acho que mereço bem a minha sela de prata — gritou para Akli, por entre as rajadas de vento.
À noite, o rapaz chegou ao acampamento.
— Obrigado, Azumar. Dava-te uma lua de prata, se pudesse. Adeus! — despediu-se.
E fugiu, envergonhado.
Desapareceu tão depressa que o camelo nem teve tempo de replicar.
Akli correu em direção à tenda, a fim de mostrar a espada ao pai e aos outros homens.
O pai sorriu-lhe. Serviu-lhe chá e pediu que contasse a viagem. Akli relatou tudo o que se passara e os homens ouviram-no com atenção. Quando terminou o relato, o pai disse-lhe :
— Estou orgulhoso de ti, filho. Mereceste bem a tua espada. Aproxima-te, quero dar-te uma prenda.
O pai ofereceu-lhe uma sela, mais branca e brilhante do que a lua. Akli ficou surpreendido com o presente, mas compreendeu logo o significado do gesto do pai. Saiu da tenda e foi colocar a sela docemente no dorso de Azumar, que também adormecera.
Carl Norac
Akli-Prince du Désert
Paris, l’ecole des loisirs, 2006
— És demasiado novo, filho. Para chegares à cidade, tens de atravessar o deserto. Se fores sozinho, arriscas-te a encontrar os Kel Essuf, esses gênios malvados e horrendos como monstros.
— Mas eu não tenho medo deles — falou Akli.
Como o pai não estava em casa e a mãe não o proibira de ir, Akli decidiu pôr-se a caminho. Procurou, então, Abdallâh, um beduíno que conhecia todos os trilhos.
— Levas-me até ao meu tio, Abdallâh? Quero ir buscar a minha espada.
— És demasiado jovem para teres uma espada e nem sequer tens uma moeda para me dar. Põe-te a andar!
Akli não se deixou desencorajar e pediu a um camelo:
— Azumar, leva-me à cidade, já que gostas tanto de viajar.
— Estou velho demais — respondeu o camelo.
— Dar-te-ei uma sela de prata — prometeu Akli.
Ao ouvir estas palavras, Azumar ficou radiante e aceitou a proposta do rapaz, que pensou para consigo: "Que camelo mais pateta! Acreditou mesmo que vou dar-lhe uma sela de prata. Como é fácil enganá-lo."
Quando já viajavam há três horas, Akli avistou um gênio. Era escuro como madeira queimada e ameaçou:
— Ou me dás de beber ou não te deixarei passar!
Akli só tinha um cantil de água. Não podia dá-lo ao gênio. Então, teve uma ideia. Pôs-se a cantar a canção mais triste que conhecia. Ao ouvi-la, o monstro começou a chorar. Em breve, chorava tão copiosamente que bebeu todas as suas lágrimas e acabou por deixar passar o rapaz.
— Como vês, Azumar — disse Akli, algum tempo depois — já sou um homem. Não tive medo. Sou o grande príncipe do deserto.
— Não te alegres antes do tempo, meu rapaz — advertiu o camelo. — Ora vê o que vem lá.
A areia mexeu-se. Um outro gênio avançou, do tamanho de uma nuvem.
— Ou me fazes rir ou não te deixo passar!
Akli ficou atrapalhado. Não conhecia nenhuma história que fizesse rir um gênio. Este pareceu zangar-se. Então, o camelo aproximou-se dele e começou a lamber-lhe os dedos dos pés. O gênio desatou a rir e deixou-os passar.
Um pouco mais à frente, aproximou-se um outro gênio, maior do que uma duna.
— Ou me metes medo ou não te deixo passar!
Akli ficou novamente atrapalhado. Não conhecia nenhuma história que metesse medo a um gênio. O camelo aproximou-se do monstro e virou-se de costas para ele. Bruscamente, expeliu do traseiro uma enorme quantidade de ar, que soou como um tiro de espingarda.
O gênio, apavorado, deu um grito e deixou-os passar.
— É a segunda vez que te salvo — comentou Azumar, algum tempo depois. Penso que mereço bem a minha sela de prata.
— Claro que mereces. És como um irmão para mim — respondeu Akli, fazendo-lhe festas.
De repente, Azumar deu um grito de alegria:
— Olha! Conseguimos! Chegamos à cidade.
Akli nunca tinha visto uma cidade tão grande, com tantas coisas para comprar. Tinha duas pequenas moedas no bolso e com elas comprou um grande bolo de mel para si e um menor para o camelo.
— E a minha sela de prata? — perguntou Azumar.
— Compro-te mais tarde. Prometo! — respondeu Akli.
Enquanto comia o bolo, o rapaz pensava: "Deixa-o sonhar. É tão fácil enganá-lo."
Akli foi visitar o tio, que ficou surpreendido de o ver.
— Os teus pais deixaram-te viajar sozinho pelo deserto, com a tua idade? — perguntou-lhe.
— Deixaram. Na minha aldeia todos sabem que já sou um homem.
O tio deu-lhe, então, uma bela espada, ornamentada com duas pedras azuis como o céu.
Nessa mesma noite, deitado numa esteira, Akli adormeceu tranquilo, com a espada apertada contra si. Azumar dormiu ao relento, preso a uma corda, mas não estava triste.
— De certeza que amanhã receberei a minha sela — pensava, fechando os olhos docemente.
No dia seguinte, Akli agradeceu ao tio as suas hospitalidade e oferta, e montou Azumar. No deserto, o vento soprava sem parar e Akli divertiu-se a aparar os grãos de areia com a espada.
— Não te alegres antes do tempo — avisou o camelo. — Vê só o que vem aí.
De repente, levantou-se uma tempestade de areia. Os gênios tinham-se escondido porque têm sempre pavor do vento. Como haviam de avançar e descobrir o trilho na areia? Mas Azumar era forte e corajoso. Não fraquejou e seguiu, determinado, em frente.
— Acho que mereço bem a minha sela de prata — gritou para Akli, por entre as rajadas de vento.
À noite, o rapaz chegou ao acampamento.
— Obrigado, Azumar. Dava-te uma lua de prata, se pudesse. Adeus! — despediu-se.
E fugiu, envergonhado.
Desapareceu tão depressa que o camelo nem teve tempo de replicar.
Akli correu em direção à tenda, a fim de mostrar a espada ao pai e aos outros homens.
O pai sorriu-lhe. Serviu-lhe chá e pediu que contasse a viagem. Akli relatou tudo o que se passara e os homens ouviram-no com atenção. Quando terminou o relato, o pai disse-lhe :
— Estou orgulhoso de ti, filho. Mereceste bem a tua espada. Aproxima-te, quero dar-te uma prenda.
O pai ofereceu-lhe uma sela, mais branca e brilhante do que a lua. Akli ficou surpreendido com o presente, mas compreendeu logo o significado do gesto do pai. Saiu da tenda e foi colocar a sela docemente no dorso de Azumar, que também adormecera.
Carl Norac
Akli-Prince du Désert
Paris, l’ecole des loisirs, 2006
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