Era uma vez um homem. Um homem-menino. Em meio às preocupações
corriqueiras e responsabilidades que chegam com a vida adulta, o menino quase
havia desaparecido dentro dele, ou melhor, estava escondido.
Certa tarde esse homem caminhava por uma avenida movimentada
quando passou por uma loja. Parou de repente. Não era uma loja de carros
importados, nem artigos esportivos, e sim de artesanatos. Alguma coisa ali na
vitrine chamara sua atenção. Fixou o olhar. Era um caminhão de madeira, desses
de brinquedo. Entrou na loja e dirigiu-se à prateleira. Pegou. Examinou o
caminhãozinho por todos os lados, enquanto seus olhos brilhavam. Quem por ele
passou naquele momento não podia imaginar a torrente de memórias que tomava
conta de sua mente…
Viu-se pequeno, outra vez menino, dentro do carro velho da
família com seu pai. Passaram por um vendedor na estrada – era um vendedor de
caminhões de madeira. O olhar curioso do menino logo se transformou em
querência: “Pai, me dá um caminhãozinho?” O pai lançou um olhar sério para o
filho, sem nada dizer. Outras vezes mais o menino passaria com seu pai por
aquele vendedor e seus olhinhos fitariam os caminhões de madeira.
Um dia o menino voltou da escola e, para sua surpresa, encontrou
um caminhão de madeira em cima da cama! Correu para dar um abraço forte no pai,
que explicou: “Fui eu que fiz para você, meu filho.” Brincou a tarde toda. Era
seu, só seu, aquele caminhão de madeira! E era especial, porque seu pai o tinha
feito. Muitas vezes mais brincou com o caminhão, e como foi feliz naqueles
dias!
Essas foram as memórias que passaram pela mente daquele
homem-menino. Não conseguiu segurar seu impulso: pegou o celular e discou.
“Pai? Oi, pai! Eu queria te contar que estava passando por uma loja e vi um
caminhão de madeira, e me lembrei daquele que o senhor fez para mim quando eu
era criança, lembra? Eu gostava tanto dele!”
Do outro lado da linha, silêncio total.
Era uma vez um homem. Um homem-ancião, marcado pelas batalhas da
vida. Estava esse homem um dia assolado por uma tristeza dessas que vem não sei
de onde e teimam em ficar. De repente, o telefone tocou. Era seu filho, que
morava bem longe. Ouviu-o e silenciou. Uma torrente de memórias apoderou-se de
sua mente…
Viu-se novo, muito mais novo, dirigindo seu carro velho com o
filho. Passaram por um vendedor de caminhões de madeira e, naturalmente, o
filho lhe pediu um. Ele não soube o que dizer. Mal sobrara dinheiro naquele mês
para pagar a gasolina do carro. A comida em casa era pouca. O trabalho de
pedreiro era duro. Não tinha dinheiro para presentes. Outras vezes mais
passaram pelo vendedor e o menino sempre com aquele olhar.
Decidiu ele mesmo fazer o caminhão. De marcenaria não entendia
muita coisa, mas não podia ser tão difícil. Só que foi. Todos os dias, antes de
sair para o trabalho de madrugada, trabalhava um pouco no caminhãozinho,
serrando a madeira aqui, montando ali. O resultado não foi tão bom quanto
gostaria, mas foi o melhor que conseguiu fazer. Acomodou o caminhão sobre a
cama do filho antes que ele chegasse da escola. O abraço apertado foi a
recompensa pelo trabalho!
Agora, naquele momento, tantos anos depois, o telefonema do
filho sobre o caminhãozinho de madeira…
Uma lágrima escorreu por um olho, e atrás vieram outras. Um
calor gostoso tomou conta de seu peito e substituiu a tristeza.
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