A Coruja Julieta





Julieta, a coruja, é teimosa como mula e só segue o que lhe manda o seu nariz. Por isso os seus pais passam a vida a dizer-lhe que ela faz tudo de pernas para o ar. Ao contrário das outras corujas, dorme de noite e brinca de dia.
O pai e a mãe bem se cansaram de lhe explicar que ela é um animal “notívago” e por isso, como qualquer coruja que o seu nome não suja deve descansar enquanto o sol alumia para, mal a lua vem para a rua, estar alerta para a presa caçar, de garra crua.
Mas Julieta não quer saber e amua.
Os ponteiros do seu relógio trocaram o passo e quando os pais chegam da caçada, arcando no corpo muita maçada, para descansar, no tronco oco do velho salgueiro, é a vez de a Julieta largar o ninho, indo embora com a aurora.
A corujinha tem mais amigos em toda a floresta que pernas tem uma centopeia.
O papai e a mamãe até arrancam as penas quando descobrem que a Julieta se dá muito bem com uma família de arganazes recém-instalados num extremo da floresta.
Uma desonra para uma coruja honesta!
É que toda a gente sabe que as corujas caçam os tais de arganazes, mais os musaranhos e outros animais dos mesmos tamanhos. Mas não, a menina Julieta só segue o que manda o seu nariz. Ela prefere contentar o bico com magros insetos e minúsculos vermes da terra, tornando-se companheira de brincadeira dos pequenos animais do campo. Uma vergonha maior que cegonha.
Ontem, alguém a viu num voar rasteiro ao prado, esvoaçando uma comprida fita presa nas suas patas, à qual se agarravam os pequenos arganazes da família Roiganaz, rindo a bandeiras despregadas. Que figura mais tola!
Até os laparotos do senhor e senhora Coelho quiseram fazer o seu batismo do ar servindo-se da fita presa nas patas da coruja. Toda a gente levou as mãos à cabeça.
— Três caçapos para levantar voo é muita areia numa avioneta! — exclamou a Julieta, rindo.
Hoje de manhã, enquanto os seus pais ressonam no ninho, a Julieta toma um banho na companhia dos seus amigo musaranhos, enquanto escutam as lérias da pega Amélia.
De tarde, vamos encontrar a nossa amiga em grande tagarelice com a família Ratónio, que comenta comicamente o movimentado batismo do ar dos intrépidos caçapos.
— Podemos fazer montanhas de amigos quando saímos de dia! — diz ela para os seus pais.
Ah! Deus assim quis: que Julieta só siga o seu nariz!


Os animais nossos amigos
Porto, Editora Asa, 2000

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