Guilherme Augusto Araújo Fernandes



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Juliana pra lá de bacana - Cláudia Cotes





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Creche José Maria de O. Camerino - Contação de histótia: O livre conta do sabiá no dia 14/05/2015, no Infantil V "A" - Professora Aurineide






A Pequena Sereia




Era o dia do concerto no reino do rei Tritão, no fundo do mar. Sereias e tritões apressavam-se em direção ao recinto para arranjar um bom lugar. Sebastião, o caranguejo compositor, dava os primeiros sinais para organizar a orquestra e assim poder começar o concerto. Ia ser uma noite muito especial pois além de seis das filhas do rei Tritão irem cantar e dançar no palco, ao som da orquestra subaquática, também a sereia Ariel iria cantar o seu primeiro solo!

Os primeiros sons começaram a ouvir-se e as sereias começaram a cantar uma melodia mágica que encantava a todos os que a ouviam. Quando chegou a vez de Ariel cantar, a grande concha onde ela deveria estar abriu-se e, surpresa das surpresas, estava vazia!

O rei, enfurecido, gritou por Ariel e mandou os seus tritões procurá-la.

Perto dali, Ariel e o seu amigo linguado nadavam em volta de um navio naufragado, tentando encontrar alguma coisa interessante. Ariel tinha-se esquecido completamente do concerto! Estavam tão distraídos, que só se deram conta da presença de um tubarão quando este estava mesmo junto deles. Os dois amigos nadaram desesperadamente para poderem fugir do tubarão mas este, como era mais rápido, estava prestes a alcançá-los. Ariel puxou então o linguado, fazendo-o passar por um pequeno buraco de uma âncora. Quando o grande tubarão tentou fazer o mesmo, ficou preso, sem se conseguir mexer. “Bem feita!” Disse o linguado, e Ariel e o seu amigo afastaram-se tranquilamente.

Entretanto, nas profundezas do mar, a bruxa Úrsula olhava pela sua bola mágica para espiar Ariel. Úrsula ansiava por poder ficar com a maravilhosa voz da Ariel.

No navio naufragado, Ariel tinha encontrado um garfo, e como não sabia o que era aquilo, mostrou-o à gaivota Sabichão. “Isto é um garfo. Pertence ao mundo dos humanos e serve para pentear os cabelos”, dizia o Sabichão, muito convencido do que dizia.

Ariel regressava a casa quando, pelo caminho se lembrou do concerto: “Oh, esqueci-me do concerto! O pai vai ficar tão zangado…”. E apressou-se a regressar a casa. Quando o rei falou com a Ariel, ficou a saber não só que ela se tinha esquecido do concerto como tinha vindo à superfície em busca de tesouros que pertenciam aos humanos. “Ordeno-te que não voltes à superfície!”, Gritou o pai, enfurecido. E a seguir, o rei foi falar com o caranguejo Sebastião para que vigiasse a Ariel.
Ariel continuava a sonhar com o mundo dos humanos e não percebia como é que um mundo que fazia coisas tão bonitas podia ser tão mau, como o pai lhe dizia. 


Numa noite de tempestade, um navio atravessava os mares com bastante dificuldade. Nele viajava o jovem príncipe Eric. O mar tornava-se cada vez mais agitado até que um dos seus marinheiros gritou: “Vem aí um furacão Senhor!”. Mas antes que pudessem fazer alguma coisa para se protegerem, ondas gigantes atiraram o barco contra as rochas e este afundou-se, lançando o príncipe Eric para o mar. Ariel ao dar-se conta que o príncipe se afundava, nadou até ele para o salvar. O príncipe foi levado pela sereia até à praia e cantou até ele acordar. Assim que acordou e olhou para Ariel, ouviu-a dizer: “Um dia hei de fazer parte do teu mundo”, e rapidamente se afastou do príncipe e mergulhou até ao fundo do mar.

O príncipe foi encontrado por um criado que o levou até o palácio. Pelo caminho, Eric contou ao empregado que tinha sido salvo por uma linda rapariga com uma voz maravilhosa.

Novamente o rei Tritão descobriu que Ariel tinha ido outra vez à superfície e ficou muito zangado, e, mais uma vez disse: “Ariel, os humanos são todos iguais! São selvagens e incapazes de amar!”. E com um golpe só, vindo do seu tridente, destruiu todos os tesouros de Ariel, deixando-a desconsolada.

Enquanto Ariel chorava, duas enguias malvadas disseram a Ariel que todos os seus sonhos poderiam ser realizados se falasse com Úrsula, a bruxa do mar. Ariel decidiu ir ter com a bruxa e esta concordou em ajudar a sereia em troca da sua voz! Ariel queria tanto ter pernas para ir ter com o príncipe por quem se apaixonara e por isso aceitou. Mas a bruxa acrescentou: ” Terás três dias, até ao por do sol, para que o príncipe se apaixone por ti. Se isso não acontecer, voltarás a ser sereia e minha escrava para sempre!”.

Ariel concordou e passado pouco tempo encontrava-se na praia, com a sua cauda transformada em lindas pernas. O príncipe Eric que passeava com o seu cão na praia viu Ariel e correu até ela, perguntando-lhe se já se conheciam. Mas Ariel, sem a sua voz, só conseguiu acenar que sim com a cabeça. Eric sentia que Ariel era a sereia que a tinha salvado, mas como? Ela não conseguia falar quanto mais cantar! Eric levou Ariel para o palácio e apresentou-a a todos. Os dias iam passando e os dois estavam muito felizes juntos.

Entretanto no fundo do oceano, o rei Tritão estava preocupado pois não encontrava Ariel.

Úrsula, com a sua bola mágica, observava Ariel e o príncipe, cada vez mais apaixonados. Então imaginou um plano para os separar. Transformou-se numa bela menina chamada Vanessa e usou a voz da Ariel, que se encontrava guardada num búzio mágico ao pescoço da bruxa, para enganar o príncipe. Quando o príncipe ouviu Vanessa cantar, ficou logo enfeitiçado e decidiu casar com ela. Ariel tinha perdido o amor da sua vida e iria ser escrava de Úrsula para sempre!

Sabidão, a gaivota amiga de Ariel, que se encontrava a bordo do barco onde iam casar Eric e Vanessa, conseguiu descobrir que Vanessa afinal era Úrsula disfarçada e avisou o Sebastião. Os dois, juntamente com outros animais do mar tentavam impedir o casamento. No meio da confusão, o buzio da bruxa caiu ao chão e Ariel recuperou de novo a sua voz! Ao ver Eric, chamou por ele: ”Eric!”. O príncipe olhou para Ariel e exclamou. “Tu consegues falar… afinal és tu! Foste sempre tu…”. Ariel e Eric estavam prestes a beijar-se quando Úrsula se transformou num monstro marinho e arrastou Ariel para si.

A noite caiu e as pernas de Ariel voltaram a ser cauda de sereia. O rei Tritão apareceu e

Úrsula falou-lhe do acordo que tinha feito com a sua filha. O rei propôs à bruxa que libertasse Ariel ficando o rei como seu escravo. Úrsula aceitou e assim que adquiriu os poderes do rei, ficou ainda maior e mais malvada e gritou: “Agora sou eu quem manda no oceano!”.

Ao ver isto, o corajoso príncipe levou o navio em direção a Úrsula, fazendo com que a parte da frente do barco lhe atravessasse o seu frio coração! O corpo da bruxa afundou-se no mar e os poderes do rei voltaram. O rei Tritão percebendo que Eric e Ariel gostavam um do outro, transformou a cauda de Ariel em pernas novamente, para que Ariel pudesse viver feliz para sempre junto do seu príncipe Eric.

O pássaro trinador de flores




Conto iraniano reproduzido por Marie-Louise von Franz

Era uma vez um Rei que tinha três filhos: Malik Mhuhammad, Malik Dschamschid e Malik Ibrahim. Ibrahim era o mais moço e seu pai o amava, tal como o filho amava o pai. Tendo o Rei adoecido, os médicos de todo o império não conseguiram descobrir qual o remédio para sua doença. Mas aí um certo doutor declarou que o remédio existia, desde que se conseguisse encontrá-lo: pois havia no mar um peixe verde que trazia um anel de ouro na mandíbula, e se alguém conseguisse pescá-lo, abrindo-lhe a barriga e colocando um pedacinho do coração de tal peixe sobre o coração do Sultão, este certamente se restabeleceria. Os três filhos ofereceram dinheiro a vários mergulhadores e pescadores para que os mesmos procurassem o tal peixe, e afinal, após alguns dias, estes conseguiram pescá-lo e o trouxeram a Malik Ibrahim. Tomando-o nas mãos, o moço ficou tremendamente impressionado com a grande beleza do peixe e, examinando-o, verificou que ele trazia inscrito na testa: “Alá é o único Deus, Maomé é seu profeta e Ali é seu sucessor”. Bem, é esse o credo Shiita maometano. Ora, ao ler aquilo, Malik Ibrahim sentiu-se profundamente comovido e exclamou: “Mesmo que meu pai possa ser curado por este peixe, não posso matá-lo”, e lançou o peixe de volta ao mar.
Enquanto isso, todos aguardavam que ele trouxesse o peixe e, abrindo-lhe a barriga, curasse o pai, até que descobriram que o rapaz devolvera o peixe ao mar, o que os fez morder os dedos de espanto, sem conseguir entender o fato. Quando disseram isso ao Rei, este ficou furioso e falou: “Se na verdade Malik Ibrahim está esperando que eu morra para se apoderar do trono, eu o deserdarei".
Daí em diante o Rei foi piorando cada vez mais, não tendo mais paz nem de dia nem de noite; mais uma vez os médicos se reuniram em torno de seu leito e declararam: “Ainda existe um remédio que conhecemos, que é o Pássaro Trinador de Flores. Toda vez que ele gorjeia, cai-lhe do bico uma linda flor e, se alguém conseguir aprisioná-lo e colocar uma dessas flores sobre o coração do Rei, ele ficará curado de sua enfermidade”.
O Rei beijou seus outros dois filhos, dizendo-lhes: “Agora, minha única esperança é que vocês encontrem o Pássaro Trinador de Flores”. Então os dois filhos montaram seus cavalos e partiram, sendo seguidos por Ibrahim, pouco tempo depois. Os irmãos perguntaram o que estava fazendo ele ali, ao que Ibrahim respondeu que também ele ia em busca do pássaro, de modo que resolveram prosseguir juntos. Chegando a uma encruzilhada onde havia uma árvore e uma fonte, desceram dos cavalos para descansar um pouco. Tendo os seus irmãos adormecido, Ibrahim foi dar um pequeno passeio, e de repente avistou uma tábula de pedra onde estava escrito: “Aqueles que chegarem a esta encruzilhada precisam saber que a estrada da direita não apresenta perigo e é agradável, mas a da esquerda é cheia de perigos e nenhum viajante que por ela seguir poderá ter esperança de voltar”.
Os dois irmãos, naturalmente, tomaram o caminho da direita, enquanto a Ibrahim coube o da esquerda. Mas havia na tábula uma outra inscrição que dizia que quem tomasse o caminho da esquerda deveria levá-la consigo. E assim fez Ibrahim. Primeiramente, foi dar a um castelo cercado de um lindo jardim onde encontrou uma bela jovem que o flertou; ele se apaixonou por ela e esta já sabia o seu nome. De repente porém Ibrahim se lembrou da tábula que trouxera consigo e, retirando-se para um recanto do jardim, viu que nela estava escrito: “Se tomares o caminho da esquerda, encontrarás belíssima e sedutora jovem, mas não te deixes atrair por suas tramas pois ele é uma astuta feiticeira que deseja matar-te. Ela vai te desafiar para uma luta e, quando isso ocorrer, tens de arrancar-lhe a blusa e então verás em seu ombro um sinal negro. Toma tua faca e enterra-a com toda força nessa mancha negra, tratando porém de não errares o alvo, pois se isso acontecer tu serás transformado em pedra negra”.
Aconteceu tudo como fora previsto e Ibrahim conseguiu mergulhar sua adaga na mancha negra da feiticeira. Então surgiu um furacão, com raios e trovões, tendo Ibrahim desmaiado de terror. Ao recobrar os sentidos viu a seu lado o cadáver de uma terrível e decrépita velha; quanto ao jardim e ao palácio, tudo desaparecera e ele se achava num deserto.
Então Ibrahim prosseguiu caminho e logo se achou num jardim muito semelhante ao primeiro; no centro havia um lago e nele vagava um barco. Nadou até o barco e ali encontrou dez homens, dos quais apenas um manifestava sinais de vida. Malik Ibrahim alimentou-o fazendo-o comer pedacinhos de maçã, pois o homem estava demasiado fraco e faminto para poder falar. Após se sentir mais reconfortado, o homem contou a Ibrahim que o barco fora colhido por um redemoinho e que, diariamente, ao meio-dia, surgia das profundezas uma grande mão que arrebatava um deles para dentro do lago, quer estivesse vivo ou morto, e que antes havia vinte homens a bordo, dos quais dez haviam sido agarrados e os demais tinham morrido de fome. Ibrahim recorreu novamente à tábula, na qual leu: “Se chegares a este barco, não te deixes distrair por qualquer coisa que vejas, ou que aconteça, ou que a dona da mão te relate. Essa mão que emerge do fundo das águas pertence à irmã da primeira feiticeira. Tens que apertá-la com toda a tua força, que é para romperes a maldição. Caso sejas superado na luta, perderás para sempre tua liberdade”.
Aí surgiu da água uma linda mão enquanto uma voz o saudava dizendo: “Apertemos as mãos, em sinal de amizade!” Ao que Ibrahim respondeu: “Sim, com todo prazer”, e estendeu-lhe a mão; reparando porém que a outra o ia puxando cada vez mais para a água, ele se colocou sob a proteção de Deus e, com quantas forças tinha, apertou tanto a tal mão, que a esmagou; novamente desabou uma tempestade e ele viu a seu lado o cadáver da feiticeira, achando-se perdido novamente no deserto.
Pôs-se então a caminho e foi dar a um lugar onde havia uma árvore alta e uma fonte, com muitos macacos em torno da árvore. Ele não sabia como explicar a presença de tantos macacos, mas estes o cercavam, olhando-o com olhos tristes. Ibrahim recorreu à tábula e leu: “Agora que mataste a feiticeira hás de chegar a uma árvore cheia de macacos e a uma fonte. Segue o veio da água e irás dar a um enorme edifício, onde encontrarás uma jovem; mas também é feiticeira e tentará te cativar e te iludir. Desta vez, terás que atirar-lhe à testa esta tábula, para que lhe quebres a cabeça e rompas o encantamento”. Tudo aconteceu como ali estava escrito e, logo que atirou a pedra à cabeça da feiticeira, todos os macacos viraram lindas donzelas. A líder das moças era uma Fada-princesa, que fora à caça de uma gazela com suas damas. Mas a gazela que ela caçava era a própria feiticeira e, mal as jovens entraram na floresta, a gazela começou a correr em círculos transformando-se numa mulher horrorosa e, no mesmo instante, transformou as jovens em macacos. Agora que Ibrahim matara a bruxa-gazela, as moças estavam libertas do encanto.
Ibrahim levou a Fada-princesa de volta à casa de seu pai e pediu-a em casamento, porém o Rei confessou a Ibrahim que não tinha só essa filha, Maiúne, que ele desencantara, mas também um filho que tentara dar combate às feiticeiras e fora morto, achando-se sepultado num cemitério próximo. Todas as noites, porém, chegavam as feiticeiras e, como a bruxa de Endor, da qual fala a Bíblia, retiravam da tumba o corpo do filho do Rei, ainda envolto nos restos da sua mortalha; e a cada manhã o cadáver tinha que ser novamente sepultado até que, na noite seguinte, tudo se repetisse.
Por isso Ibrahim se colocou, à noite, perto do túmulo e, tendo sido outra vez instruído do que lhe competia fazer, tomou uma lança e, quando duas feiticeiras apareceram para reiniciar suas artimanhas, em um só golpe ele as degolou, tendo-se desencadeado, no mesmo instante, uma terrível tempestade. Quando, porém, tudo se acalmou, o Príncipe morto ressuscitou e declarou que, por ter sido libertado por Ibrahim, fazia-se seu escravo para sempre.
Depois disso Malik Ibrahim se casou com a Fada-princesa, embora continuasse determinado a partir em busca do Pássaro Trinador de Flores. Alguém lhe disse que o pássaro se encontrava numa grande montanha rodeada por milhares de demoniozinhos e que ninguém podia por ali passar. Mas Ibrahim simplesmente se dirigiu aos mil demoniozinhos e, quando estes o atacaram, destemidamente os fez estacar, o que os deixou curiosos por saber o que é que aquele simpático e ingênuo rapaz pretendia ali. Em lugar de o matarem imediatamente, deram-lhe a chance de dizer porque viera. Ibrahim então confessou que desejava o Pássaro Trinador de Flores. Abertamente contou-lhes toda a verdade e os demoniozinhos então disseram que o pássaro se achava ali na montanha e que pertencia a Tarfe Banu, filha do Rei; acrescentaram que eles não lhe podiam trazer o pássaro e que Ibrahim teria que roubá-lo sozinho; eles não se importariam. Chegaram mesmo a conduzir Ibrahim ao castelo encantado, onde, num dos aposentos, encontrou Tarfe Banu adormecida sobre um coxim todo ornamentado com pedras preciosas. Ela era tão bela que não existe linguagem humana capaz de descrever-lhe a beleza. À sua cabeceira se achava uma linda gaiola, dentro da qual estava o Pássaro Trinador de Flores, e a cada trinada que este emitia caíam-lhe do bico flores suavemente perfumadas. Ibrahim com grande rapidez se apoderou da gaiola e fugiu, pedindo aos demoniozinhos que o levassem para casa. Quando já se achava próximo do castelo onde morava, pendurou a gaiola numa árvore e caiu no sono. Então, como se pode imaginar, os irmãos apareceram e roubaram o pássaro, levando-o para o Rei, a quem disseram terem sido eles mesmos que o haviam encontrado. Mas o pássaro não cantava!
Ibrahim consegue chegar à corte e, ao vê-lo, o pássaro logo se põe a cantar e as flores a lhe tombarem do bico, de modo que o Rei logo fica curado. Eis, porém, que chega ali um exército. Ao redor do palácio surge grande número de tendas e os irmãos, horrorizados, descobrem que Tarfe Banu viera em busca de quem lhe roubara o Pássaro. O ladrão, disse ela, teria que comparecer à sua presença, pois não falaria com qualquer outra pessoa. Todos empalideceram, mas Ibrahim se declarou disposto a ir. Vestiu-se principescamente e compareceu diante da Princesa, que o recebeu muito afavelmente, declarando-lhe ter feito um juramento de se casar com ele porque, a despeito da perseguição das feiticeiras, conseguira encontrá-la, bem como ao pássaro, e que por isso era ele o único que merecia se tornar seu esposo.
Ibrahim se casou, portanto, com Tarfe Banu, permitindo que mais tarde Maiúne viesse se reunir a ele e todos viveram felizes até o fim de suas vidas, como manda o destino.

GUILHERME AUGUSTO ARAÚJO FERNANDES



(MEM FOX)

Era uma vez um menino chamado Guilherme Augusto Araújo Fernandes e ele nem era tão velho assim.
Sua casa era ao lado de um asilo de velho e ele conhecia todo mundo que vivia lá. Ele gostava da Sra. Silvano que tocava piano. Ele ouvia as histórias arrepiantes que lhe contava o Sr. Cervantes.Ele brincava com o Sr. Valdemar que adorava remar. Ajudava a Sra. Mandala que andava com uma bengala. E admirava o Sr. Possante que tinha voz de gigante.
Mas a pessoa que ele mais gostava era a Sra. Antonia Maria Dinis Cordeiro, porque ela também tinha quatro nomes, como ele.
Ele a chamava de Dona. Antonia e contava-lhe todos os seus segredos.
Um dia, Guilherme Augusto escutou sua mãe e seu pai conversando sobre Dona. Antonia.
- Coitada da velhinha - disse sua mãe.
- Por que ela é coitada? - perguntou Guilherme Augusto.
- Porque ela perdeu a memória - respondeu seu pai.
- Também, não é para menos - disse sua mãe.
- Afinal, ela já tem noventa e seis anos.
- O que é uma memória? - perguntou Guilherme Augusto. Ele vivia fazendo perguntas.
- É algo de que você se lembre - respondeu o pai.
Mas Guilherme Augusto queria saber mais; então, ele procurou a Sra. Silvano que tocava piano.
- O que é uma memória? - perguntou.
- Algo quente, meu filho, algo quente.
Ele procurou o Sr. Cervantes que lhe contava histórias arrepiantes.
- O que é uma memória? - perguntou.
- Algo bem antigo, meu caro, algo bem antigo.
Ele procurou o Sr. Valdemar que adorava remar.
- O que é uma memória? - perguntou.
- Algo que faz chorar, meu menino, algo que faz chorar.
Ele procurou a Sra. Mandala que andava com uma bengala.
- O que é uma memória? - perguntou.
- Algo que o faz rir, meu querido, algo que o faz rir.
Ele procurou o Sr. Possante que tinha voz de gigante.
- O que é uma memória? - perguntou.
- Algo que vale ouro, meu jovem, algo que vale ouro.
Então, Guilherme Augusto voltou para casa, para procurar memórias para Dona Antonia, já que ela havia perdido as suas.
Ele procurou uma antiga caixa de sapato cheia de conchas, guardadas há muito tempo, e colocou-as com cuidado numa cesta. Ele achou uma marionete, que sempre fizera todo mundo rir, e colocou-a na cesta também.
Ele lembrou-se, com tristeza, da medalha que seu avô lhe tinha dado e colocou-a delicadamente ao lado das conchas.
Depois achou sua bola de futebol, que para ele valia ouro; por fim, entrou no galinheiro e pegou um ovinho fresquinho, ainda quente, debaixo da galinha.
Aí, Guilherme Augusto foi visitar Dona Antonia e deu à ela, uma por uma, cada coisa de sua cesta.
"Que criança adorável que me traz essas coisas maravilhosas", pensou Dona Antonia.
E então ela começou a se lembrar.
Ela segurou o ovo ainda quente e contou a Guilherme Augusto sobre um ovinho azul, todo pintado, que havia encontrado uma vez, dentro do ninho, no jardim da casa de sua tia.
Ela encostou uma das conchas no ouvido e lembrou da vez que tinha ido à praia de bonde, há muito tempo, e como sentira calor com suas botas de amarrar.
Ela pegou a medalha e lembrou com tristeza, de seu irmão mais velho, que havia ido para a guerra e que nunca voltou.
Ela sorriu para a marionete e lembrou da vez em que mostrara uma para sua irmãzinha, que rira às gargalhadas, com a boca cheia de minguau.
Ela jogou a bola de futebol para Guilherme Augusto e lembrou do dia em que se conheceram e de todos os segredos que haviam compartilhado.
E os dois sorriram e sorriram, pois toda a memória perdida de Dona Antonia tinha sido encontrada, por um menino que nem era tão velho assim.

História do coqueiro


Numa linda manhã, bem no alto de um morro nasceu um majestoso e imponente coqueiro.
A cada dia ele crescia e era admirado por todos, mas bem à distância. Só o coqueiro é que crescia sobre o morro, as outras plantas ficavam lá longe.
Até que um dia, ao pé do coqueiro, trazida pelo vento ou por um passarinho, uma sementinha começou a brotar e se transformou numa minúscula e frágil flor.
_ Ai, ai, oh, céus...óh...
_ Que meleca! Quem ousa perturbar o meu sossego?
Então a florzinha se dá conta que nasceu ao lado de um imenso coqueiro. Sem ter outra planta ao seu redor, se sentindo muito só, começou a puxar conversa com o coqueiro:

_ Seu Coqueiro! Seu Coqueiro! Conversa comigo, Seu Coqueiro!
_ Quem é que tem a ousadia de me incomodar?
_ Sou eu, Seu Coqueiro, a Florzinha. Conversa comigo, Seu Coqueiro, estou tão sozinha.
_ Ora, que puxa!!! Não me amole. Não vou perder meu precioso tempo com qualquer um.
_ Ah, Seu Coqueiro, conversa comigo! Você já reparou como o dia está lindo hoje?
_ Lindo? Não vejo nada de lindo além de mim.
_ Seu Coqueiro, como é a vista aí de cima? Aqui embaixo eu não vejo nada. Conta pra mim.
_ Não me amole, não quero saber de conversa!
Neste instante aparecem nuvens negras no horizonte, que vão chegando e escurecendo todo o céu.
_ Seu Coqueiro, o que tá acontecendo, Seu Coqueiro?
_ Pra mim não está acontecendo nada. Agora pra você vai acontecer uma tempestade que vai te levar daqui pra sempre! Ah! Ah! Ah!
_ Seu Coqueiro, eu to com medo, Seu Coqueiro! O que nós vamos fazer?_ Eu não vou fazer é nada, pode vir tempestade!
O temporal chegou!
E o vento mandava o coqueiro para um lado e depois para o outro lado. E a Florzinha gritava:
_ Socorro, Seu Coqueiro!
Quando de repente.... Cai o coqueiro!
A chuva cessa e a florzinha:
_Seu Coqueiro? Ué?! Ele morreu. Ele era tão bonzinho, me fazia tanta companhia, conversava tanto comigo. Agora ele está lá no céu dos cocos. Agora ele tá em paz...
Quanto maior a altura, maior o tombo!

(História enviada por Amauri de Oliveira)

A Primeira Só



(Marina Colasanti)
 
Era linda, era filha, era única. Filha de rei. Mas de que adiantava ser princesa se não tinha com quem brincar?Sozinha, no palácio, chorava e chorava. Não queria saber de bonecas, não queria saber de brinquedos. Queria uma amiga para gostar.
De noite o rei ouvia os soluços da filha. De que adiantava a coroa se a filha da gente chora à noite? Decidiu acabar com tanta tristeza. Chamou o vidraceiro, chamou o moldureiro. E em segredo mandou fazer o maior espelho do reino. E em silêncio mandou colocar o espelho ao pé da cama da filha que dormia.

Quando a princesa acordou, já não estava sozinha. Uma menina linda e única olhava para ela, os cabelos ainda desfeitos do sono. Rápido saltaram as duas da cama. Rápido chegaram perto e ficaram se encontrando. Uma sorriu e deu bom dia. A outra deu bom dia sorrindo.

- Engraçado – pensou uma - , a outra é canhota.

E riram as duas.Riram muito depois.

Felizes juntas, felizes iguais. A brincadeira de uma era a graça da outra. O salto de uma era o pulo da outra. E quando uma estava cansada, a outra dormia.

O rei, encantado com tanta alegria, mandou fazer brinquedos novos, que entregou à filha numa cesta. Bichos, bonecas, casinhas e uma bola de ouro. A bola no fundo da cesta. Porém tão brilhante, que foi o primeiro presente que escolheram.

Rolaram com ela no tapete, lançaram na cama atiraram para o alto. Mas quando a princesa resolveu jogá-la nas mãos da amiga, a bola estilhaçou jogo e amizade.

Uma moldura vazia, cacos de espelho no chão.

A tristeza pesou nos olhos da única filha do rei. Abaixou a cabeça para chorar. A lágrima inchou, já ia cair, quando a princesa viu o rosto que tanto amava. Não um só rosto de amiga, mas tantos rostos de tantas amigas. Não na lágrima que logo caiu mas nos cacos que cobriam o chão.

- Engraçado são canhotas – pensou.

E riram.Riram por algum tempo depois. Era diferente brincar com tantas amigas. Agora podia escolher. Um dia escolheu uma e logo se cansou. No dia seguinte preferiu outra, e esqueceu-se dela logo em seguida. Depois outra e outra, até achar que todas eram poucas. Então pegou uma, jogou contra a parede e fez duas. Cansou das duas, pisou com o sapato e fez quatro. Não achou mais graça nas quatro, quebrou com o martelo e fez oito. Irritou-se com as oito partiu com uma pedra e fez doze.

Mas duas eram menores do que uma, quatro menores do que duas, oito menores do que quatro, doze menores do que oito.

Menores cada vez menores.Tão menores que não cabiam em si, pedaços de amigas com as quais não se podia brincar. Um olho, um sorriso, um pedaço de si. Depois, nem isso, pó brilhante de amigas espalhado pelo chão.

Sozinha outra vez a filha do rei.Chorava Nem sei.

Não queria saber das bonecas, não queria saber dos brinquedos.

Saiu do palácio e foi correr no jardim para cansar a tristeza.

Correu, correu, e a tristeza continuava com ela. Correu pelo bosque, correu pelo prado. Parou à beira do lago.

No reflexo da água a amiga esperava por ela.

Mas a princesa não queria mais uma única amiga, queria tantas, queria todas, aquelas que tinha tido e as novas que encontraria. Soprou na água. A amiga encrespou-se, mas continuou sendo uma.

Então a linda filha do rei atirou-se na água de braços abertos, estilhaçando o espelho em tantos cacos, tantas amigas que foram afundando com ela, sumindo nas pequenas ondas com que o lago arrumava sua superfície.

Flocos de Carinho



Havia uma pequena aldeia onde o dinheiro não entrava.
Tudo o que as pessoas compravam, tudo o que era cultivado e
produzido por cada um, era trocado.
A coisa mais importante, e valiosa era a AMIZADE.
Quem nada produzia, quem não possuía coisas que pudessem ser trocadas por alimentos, ou utensílios, dava seu CARINHO.
O CARINHO era simbolizado por um floquinho de algodão.
Muitas vezes, era normal que as pessoas trocassem floquinhos sem querer nada em troca.
As pessoas davam seu CARINHO pois sabiam que receberiam
outros num outro momento ou outro dia.
Um dia, uma mulher muito má, que vivia fora da aldeia,
convenceu um pequeno garoto a não mais dar seus floquinhos.
Desta forma, ele seria a pessoa mais rica da cidade e teria o que quisesse. Iludido pelas palavras da malvada, o menino, que era uma das pessoas mais populares e queridas da
aldeia, passou a juntar CARINHOS e em pouquíssimo tempo sua casa estava repleta de floquinhos, ficando até difícil de circular dentro dela.

Daí então, quando a cidade já estava praticamente sem floquinhos, as pessoas começaram a guardar o pouco CARINHO que tinham e toda a harmonia da cidade desapareceu.
Surgiram a ganância a desconfiança, o primeiro roubo, ódio, a discórdia, as pessoas se xingaram pela primeira vez e passaram ignorar-se pelas ruas.
Como era o mais querido da cidade, o garoto foi o primeiro a sentir-se triste e sozinho, o que o fez procurar a velha para perguntar-lhe e dizer-lhe se aquilo fazia parte da riqueza que ele acumularia.
Não a encontrando mais, ele tomou uma decisão. Pegou uma grande carriola, colocou todos os seus floquinhos em cima e caminhou por toda a cidade distribuindo aleatoriamente seu CARINHO.
A todos que dava CARINHO, apenas dizia: Obrigado por receber meu carinho.
Assim, sem medo de acabar com seus floquinhos, ele distribuiu até o último CARINHO sem receber um só de volta.
Sem que tivesse tempo de sentir-se sozinho e triste novamente, alguém caminhou até ele e lhe deu CARINHO.
Um outro fez o mesmo...Mais outro... e outro... até que definitivamente a aldeia voltou ao normal.

(História enviada por Elisabete Batista) 



História do Indiozinho Chuí

 
 
 
No meio da floresta amazônica vivia uma tribo de índios. Nesta tribo vivia um indiozinho pequenininho, mas com um nome muito grande: Chuiacanga Parapitanga Piriri Pororó. O nome era tão grande e o indiozinho tão pequeno que todos o chamavam de Chuí.
A mãe de Chuí, a Chuôa tinha que sair para cuidar da roça de mandioca e disse:
_ Chuí, você fica aqui dentro da oca e não saia, que é perigoso. E saiu para cuidar da roça.
Chuí esperou, mas estava tão chato que ele colocou a cabeça para fora da oca. Olhou para um lado, olhou para o outro e saiu correndo.
Mais a frente parou. Olhou para um lado, olhou pro outro e como não tinha ninguém, saiu passeando, no meio das árvores. E reparou que as árvores eram altas, altas, altas.
No meio das árvores tinha pássaros, voando, voando, voando.
Chuí continuou andando, até que chegou num rio caudaloso e viu uma ponte de corda que balançava pra lá e pra cá. No rio estavam os jacarés, que abriam a boca para ele. Ele foi andando na ponte. Saiu da ponte e continuou o seu passeio.
Chegou a um morro de pedrinhas. Ele subiu pelo morro de pedrinhas. Acabando o morro ele continuou andando. Até que chegou à boca de uma caverna. Ele entrou na caverna. Que foi ficando escura, escura, escura. Lá dentro, de repente ele encontrou em alguma coisa. Alguma coisa grande, alguma coisa larga, alguma coisa alta.
Foi quando ele percebeu que a caverna não era escura. Era ele que estava de olhos fechados. Quando ele abriu os olhos ele viu... uma onça!
Saiu correndo. Desceu o morro das pedrinhas, Continuou correndo. Passou pela ponte de corada. Continuou correndo. Passou pelos jacarés. Continuou correndo. Pelos passarinhos. Continuou correndo. Pelas árvores altas, altas, altas. Continuou correndo. Até que chegou na oca. Ele entrou e sabem quem ele encontrou esperando por ele? A mãe!
_Chuí! A mãe não falou pra você não sair da oca? É perigoso!
A mãe de Chuí, que é índia e não igual as nossa, ficou brava, mas não bateu em Chuí. Nem aquelas palmadinhas “pra educar”. Índio não faz isso. Ela conversou com ele. E Chuí nunca mais saiu da oca sem a permissão de sua mãe. Principalmente quando ela estava olhando.
 
(História enviada por Amauri de Oliveira)

A BORBOLETINHA E O GATINHO SOLITÁRIO






A Borboleta de óculos mágicos voava perto de umas árvores imensas quando ouviu um barulho estranho que vinha lá debaixo.
Olhou para o chão e viu um belo gatinho solitário brincando com um monte de folhas secas. Ele era tão engraçadinho que ela resolver conhecê-lo. Afinal ainda não tinha um amigo gato. Ao se aproximar teve uma visão mágica. As estrelinhas começaram a brilhar e viu um gato feliz da vida, brincando de bola com o macaquinho Nico.
E de repente aconteceu. O gatinho num pulo agarrou a borboleta com as duas patas.
Ela deu um grito: -  Aiiiiiiiiiiii.... seus óculos caíram no chão e as estrelinhas desapareceram...
- Me larga - gritou ela com medo. O gato olhou para a Borboleta e depois sorrindo disse:
- Calma, linda Borboleta . Não tenha medo de mim. Não vou te comer !
- Não ? Então ponha me no chão - ordenou ela - e pegue meus óculos por que não enxergo sem eles. O gato obedeceu. 

- Desculpe - começou ele - só queria brincar um pouco com você.
- Brincar ? Você me deu o maior susto e só queria brincar ? - disse com desespero. Depois olhou bem para o gatinho e disse:
- Muito bem, obrigado por ter me soltado - colocou os óculos e arrumou a roupa.
- Estava passando quando ouvi o barulho das folhas. Por que você brinca com as folhas ?
- Sou o gato Tufique, não tenho irmãos e nem amiguinhos para brincar. Sou um gato solitário. Por isso me distraio com essas folhas secas.
- Não tem amigos ? perguntou a borboleta.
- Nenhum. - respondeu com tristeza.
- Não acredito, você parece ser um gato legal, é simpático e mesmo assim não tem amigos. Por que ? 

- Olha borboleta, quando era pequeno todos me achavam muito bonito.
- Mas ainda é muito bonito com esses olhos azuis - respondeu ela encantada.
- Mas eu era também muito exibido, porque recebia muitos elogios. Passei a me achar o melhor entre os animais. Virei um gato orgulhoso.
- Não creio,  Tufique !  disse a borboleta.
- Aí os bichinhos foram se afastando de mim e hoje não tenho amigos para brincar. Sou obrigado a me divertir com as folhas secas que caem das árvores.
- Entendo - respondeu a borboleta, limpando seus óculos.
- Mas eu cresci e mudei. Hoje sei que sou um gato normal como todos os outros. Nem melhor nem pior. Mas agora eles não querem mais a minha amizade !
- Mas nunca é tarde para fazer novas amizades. - disse a Borboletinha Mágica - Acaba de fazer uma.
- Você vai ser minha amiga ? perguntou o gatinho.
- Claro que sim, podemos brincar de muitas coisas e posso te apresentar outros amiguinhos.
A borboleta lembrou das visões e do Nico.
- Obrigado, isso é muito importante para mim.
Curioso perguntou: - Você usa óculos ?
- Uso sim - respondeu ela com satisfação.
- Agora que percebi, mas eu nunca tinha visto uma borboletinha de óculos.
- Agora está vendo. No começo, eu trombava nas árvores e me machucava toda. Até que Dr. Sabiá me receitou esse par de óculos e minha vida mudou completamente. Explicou.
- Mudou ?! Como assim ?
- Conhecei a enxergar muito melhor, fiquei muito mais bonita e as visões mágicas apareceram.
- Visões mágicas ?! - insistiu ele.
- Nada, não, Tufique, estou brincando com você. Agora vamos, vou te apresentar meus amigos.
E partiram para o lago Azul. A Borboletinha apresentou o gatinho para todos os bichinhos que moravam por lá.
- Seja bem vindo - disse a dona Margarida - Espero que se divirta aqui.
- Que bichinho lindo ! - comentou a joaninha - dá vontade de apertar !
- Venha brincar comigo aqui dentro do lago - gritou o sapo Neneu.
- Não, não - respondeu ele - eu não gosto muito de água, o máximo que faço com água  é beber um pouquinho. Brincar não !!!
- Segura aí - gritou o macaquinho Nino, jogando uma bola colorida para o gatinho. Ele devolveu com a pata e começaram a brincar e assim foi. Após algum tempo chegou a onça Olga. O porquinho Léo foi logo apresentando o gatinho para ela.
- Nossa como você se parece comigo - disse o gatinho - apenas a cor e o tamanho são diferentes.
- Sabe porque somos parecidos ? perguntou dona Olga.
- Não ! respondeu o gatinho.
- Porque somos parentes, da mesma família. Na natureza os animais se dividem em famílias.
- E qual é a nossa ? perguntou o gatinho curioso.
- Pertencemos a família dos felinos, os leões e o tigres também são nossos parentes.
- Não sabia que tinha tantos parentes assim. É tem sim...um mais bonito que o outro - respondeu ela com orgulho.
- O mais importante para mim agora é amizade. Você vai ser minha amiga ? perguntou com curiosidade o gatinho. A onça respondeu:
- Claro sim e com o maior prazer.
Diante da resposta Tifique comentou com a Dona Borboletinha:
- Estou muito feliz. Agora sei como é gostoso brincar com amigos de verdade.
- É isso aí. - respondeu ela, sorrindo.
-  Quero ver se consegue pegar essa - gritou o Nico, chutando a bola. O gatinho, na maior felicidade, saiu correndo atrás.


Como se fosse dinheiro - Ruth Rocha




Todos os dias Catapimba levava dinheiro para escola para comprar o lanche.
Chegava no bar, comprava um sanduíche e pagava seu Lucas.
Mas seu Lucas nunca tinha troco.
Um dia, Catapimba reclamou de seu Lucas:
- Seu Lucas, eu não quero bala, quero meu troco em dinheiro.
- Ora, menino, eu não tenho troco. Que é que eu posso fazer?
- Ah, eu não sei! Só sei que quero meu troco em dinheiro!
- Ora, bala é como se fossa dinheiro, menino? Ora essa...
Catapimba ainda insistiu umas duas ou três vezes.
A resposta era sempre a mesma:
- Ora, menino, bala é como se fosse dinheiro... Então, leve um chiclete, se não gosta de bala.
Aí, Catapimba resolveu dar um jeito.
No dia seguinte, apareceu com um embrulhão de baixo do braço. Os colegas queriam saber o que era. Catapimba ria e respondia;
- Na hora do recreio, vocês vão ver...
E, na hora do recreio, todo mundo viu.
Catapimba comprou o seu lanche. Na hora de pagar, abriu o embrulho. E tirou de dentro... uma galinha.
Botou a galinha em cima do balcão.
- Que é isso, menino? - perguntou seu Lucas.
- É pra pagar o sanduíche, seu Lucas. Galinha é como se fosse dinheiro... o senhor pode me dar troco, por favor?
Os meninos estavam esperando para ver o que seu Lucas ia fazer.
Seu Lucas ficou um tempão parado, pensando...
Aí colocou uma moedas no balcão:
- Está aí seu troco, menino!
E pegou a galinha, para acabar com a confusão.
No dia seguinte, todas as crianças apareceram com embrulhos debaixo do braço.
No recreio, todo mundo foi comprar lanche.
Na hora de pagar...
Teve gente que queria pagar com raquete de pingue-pongue, com papagaio de papel, com vidro de cola, com geléia de jabuticaba...
O Armandinho quis pagar um sanduíche de mortadela com o sanduíche de goiabada que ele tinha levado...
Teve gente que também levou galinha, pato, peru...
E, quando seu Lucas reclamava, a resposta era sempre a mesma;
- Ué, seu Lucas, é como se fosse dinheiro...
Mas seu Lucas ficou chateado mesmo quando apareceu o Caloca puxando um bode.
Aí, seu Lucas correu e chamou a diretora.
Dona Júlia veio e contaram pra ela o que estava acontecendo.
E sabe o que ela achou?
Pois achou que as crianças tinham razão..
- Sabe, seu Lucas - ela falou -, bode não é como se fosse dinheiro. Galinha também não é. Até aí o senhor tem razão. Mas bala também não é como se fosse dinheiro muito menos chiclete.
Seu Lucas se desculpava:
- É, mas eu não tive troco?
- Aí, o senhor anota, e no outro dia paga.
Os meninos fizeram uma festa, deram pique-pique pra dona Júlia e tudo.
Naquele dia, nem houve mais aula.
Mas o melhor de tudo é que todos do bairro ficaram sabendo do caso.
E, agora, seu Pedro da farmácia não dá mais compridos de troco, seu Ângelo do mercado não dá mais mercadoria como se fosse dinheiro.
Afinal, ninguém quer receber um bode em pagamento, como se fosse dinheiro. É, ou não é?
 
 

A VOLTA DO PÁSSARO ENCANTADO






Um dia ele voltou. Mas estava diferente. Triste .
– Você mudou – disse a Menina!
– Eu sei, ele respondeu. – Perdi a alegria. Não mais tenho vontade de voar!
– Como foi que isto aconteceu? – perguntou a Menina.
– Estou velho. Não sou como era…—ele respondeu.
– Quem lhe contou isto?
– O espelho…
Com estas palavras, o Pássaro tirou de dentro de suas penas um espelho de ouro e começou a contemplar o seu rosto.
– Não me lembro desse espelho – disse a Menina.
– Foi presente de alguém! Deixado à minha porta –explicou o Pássaro.
“Como seu Pássaro mudara!”, a Menina pensou. Ela nunca o havia visto se olhando num espelho. Seus olhos estavam sempre cheios de mundos, de montanhas e campos nevados, florestas e mares… Tão cheios de mundos, que não havia neles lugar para sua própria imagem. Mas agora era como se os mundos não mais existissem. Os olhos do Pássaro estavam cheios do seu próprio reflexo. A Menina percebeu que seu Pássaro fora enfeitiçado. Com certeza alguém com inveja, como a madrasta da Branca de Neve. E que instrumento mais terrível para o feitiço que um espelho? Mais terrível que as gaiolas. De dentro da gaiola todos querem sair, mas dentro dos espelhos todos querem ficar.
A Menina entristeceu… E jurou que tudo faria para quebrar qualquer feitiço.
Mas de feitiços ela nada entendia. Procurou então os conselhos de um velho mago, que lhe revelou os segredos de todos os bruxedos.
– Uma pessoa fica enfeitiçada quando se torna incapaz de amar. E, para isso, não existe nada mais forte que um espelho. O espelho faz com que as pessoas só vejam a si mesmas. E quem vê somente o próprio reflexo não consegue amar. Adoece e morre. Narciso morreu assim, enfeitiçado por sua própria beleza, refletida na água da fonte. E foi a beleza da madrasta da Branca, refletida no espelho, que a transformou de mulher linda em bruxa horrenda! Contra o feitiço do espelho existe só um remédio: é preciso redescobrir o amor, ficar de novo apaixonado. Somente o amor tem poder suficiente para arrancar as pessoas de dentro da armadilha do espelho. Mas não há receitas… Somente quem ama a pessoa enfeitiçada pode salvá-la…
A Menina pensou que, talvez, as coisas que o Pássaro sempre amara, no passado, teriam o poder para fazê-lo amar agora, no presente. E se lembrou da alegria que ele tinha nas frutas do pomar. Trouxe-lhe então as mais queridas: caquis, pitangas, mangas, romãs, jabuticabas, mexericas, aquelas que guardavam as memórias de infância escondida em sua carne. Mas o Pássaro se recusou a comer. Não tinha fome de frutas. Sua boca estava adormecida, como se não existisse… Só tinha olhos, olhos que fitavam o espelho em busca da beleza perdida, ausente…
A Menina não se deu por vencida. Resolveu tentar a sedução dos perfumes. Os perfumes são sutis: penetram fundo, nas profundezas da alma. Lembrou-se de que o Pássaro amava o cheiro bom das plantas. Foi então ao jardim e ali colheu flores de jasmim, magnólia, madressilva, flor-do-imperador e as folhas de hortelã, manjericão, rosmaninho e alecrim… “Ah!”, ela pensava, “não existe bruxedo que resista aos perfumes, pois eles entram na alma, aonde nem mesmo os pensamentos e os olhares enfeitiçantes conseguem chegar…”
Mas o Pássaro também se tornara incapaz de sentir os perfumes. Ele era só olhos, em busca de uma imagem perdida…
– Minha tristeza mora num lugar mais fundo que o lugar dos perfumes, ele explicou à Menina.
– Tenho saudades de mim mesmo, daquilo que já fui. Procuro, no espelho, um rosto passado, um tempo perdido… E a tristeza é por isso, porque sei que não é possível reencontrar!
A Menina pensou, então, que a ciência poderia ajudar. Procurou médicos de perto e de longe e voltou para casa carregada de pílulas e injeções cheias de alegria. Mas os milagres eram curtos e a alegria se ia tão depressa quanto chegara.
– Minha doença não é do corpo – disse o Pássaro – Ela mora na alma. Se eu não vôo, não é porque minhas asas ficaram fracas. Elas ficaram fracas porque não desejo mais voar. E quando o desejo se vai, vai-se também a alegria… E então o corpo envelhece!
A Menina, chorando, lhe perguntou:
– Mas não existe remédio para a tristeza?
– Sei que existe – disse o Pássaro. – Mas num lugar muito longe (ou será muito perto?), que não sei onde é. Mas para chegar até lá, há de se saber voar. Você já voou? – o Pássaro perguntou à Menina.
– Voar, eu? Sou uma menina, não tenho asas…
– Mas você já tem asas – ele afirmou. – E nem sequer percebeu… É que as asas das meninas, diferente das asas dos pássaros e das borboletas, não são vistas com os olhos. São invisíveis… Só podem ser vistas com os olhos da imaginação!
A Menina nunca havia pensado nisto, que um dia ela teria asas. Parecia tão absurdo! E, de repente, se lembrou… Um presente muitos anos atrás, que seu Pássaro lhe trouxera de uma de suas viagens: um pôster colorido, uma menina, com asas de borboleta, que leve voava sobre a superfície de um lago. E ela lhe perguntara, espantada:
– Uma menina com asas?
E o Pássaro respondera:
– Mas você nunca percebeu as asinhas que já começam a crescer em suas costas?
E os dois riram de felicidade.
Pois é: chegara o momento em que teria que começar a voar.
– A quem devo procurar? – ela perguntou.
– Procure aqueles que sabem voar: os poetas. Eles têm asas mágicas, feitas com palavras e se chamam poemas !…
E a Menina partiu em busca do remédio que faz retornar a alegria à alma, a fim de dar leveza ao corpo…
Encontrou um poeta e fez seu pedido. O poeta a olhou com um olhar de bondade e lhe disse:
– Não posso atender seu pedido. Também eu estou procurando. Sabe por que sou poeta? Porque sinto em tudo só uma pitada de alegria. Mas ela se vai tão depressa, misturada à tristeza. Passa depressa como o Vento… Até um poeta já disse:
Leve, muito leve,
Um Vento passa ,
E vai-se sempre muito leve!…
Assim é a alegria….
Nós a cantamos, quando ela aparece. Bem que gostaríamos de sermos mágicos para chamá-la e distribuí-las pelo mundo… Mas não podemos ajudá-la! Quem sabe os monges… Eles têm asas de luz… Consta que descobriram o segredo da alegria!…
A Menina amou o poeta e até quis ficar com ele mais tempo. Mas lembrou-se de seu Pássaro… E continuou. Voou alto, muito alto, para o cume de uma montanha deserta e nevada, onde monges se dedicavam à busca de Deus.
– Sim, Menina, Deus é a suprema alegria. Por vezes a sentimos. Mas passa rápido, muito rápido. Como o sol que se pões. E nada há que possa detê-la. Passa rápido como a beleza do crepúsculo. Sabe porque fizemos o nosso mosteiro tão alto? Para que a alegria do por-do-sol demore um pouco mais. Queremos a beleza da luz que se vai, onde mora Deus, onde mora a alegria. Venha comigo!…
E tomando a menina pela mão levou-a até um templo, lugar sagrado… E a luz do crepúsculo filtrava-se pelos vitrais de muitas cores…
– Veja como entra pelos vitrais. Como é suave esta alegria. Mas logo se vai e a noite chega. Com a noite vem a tristeza e o medo… Felizmente, com o nascer do sol, ela volta. O choro dura uma noite toda, mas a alegria vem pela manhã… Vivemos assim, entre a tristeza que vem e a alegria que foge… Não, Menina, não conseguimos prender a alegria. Só conseguimos aprender a cantar quando ela vem… Quem sabe os revolucionários, que desejam construir o paraíso sobre a terra. Eles têm asas de fogo!…
A Menina amou aqueles homens e achou lindo o que estavam fazendo, celebrando a luz que vem e que vai… Quis ficar. Mas havia um Pássaro triste, lá embaixo, que esperava por ela. Abriu suas asas e se foi, em busca dos revolucionários. Encontrou-os nas montanhas. Moravam nas alturas, não porque quisessem subir para as estrelas como os monges, mas porque queriam descer para os vales. Amavam a terra e por ela dariam suas vidas.
– Como gostaria de ter a resposta para sua pergunta, Menina – disse um deles, de rosto enigmático, estranha combinação de dureza e ternura. – Sei o que tira a alegria. Os corpos famintos, perseguidos, sofridos, dos pobres e fracos – ah!, como é difícil que se alegrem! A fome, a dor, a doença, as injustiças são todas inimigas da alegria. E para ela queremos preparar o caminho: quebrar as espadas, queimar as botas, abrir as prisões, distribuir as terras, perdoar as dívidas… Isto nós sabemos fazer. Mas alegria é coisa mágica que vem de dentro, não de fora. O que fazemos é preparar a terra para que ela possa vir das funduras de onde mora. Ela mora no lugar dos sonhos, aonde os nossos não podem ir! Para ter alegria é preciso sonhar. Mas este segredo nós não sabemos. Talves os intérpretes de sonhos… Eles têm asas de luar!…
A Menina amou o rosto duro e terno daquele homem, admirou sua coragem, mas sentiu uma discreta tristeza em sua fala. Também ele não havia encontrado a alegria. Abriu suas asas… Já estava ficando cansada. E partiu em busca dos intérpretes dos sonhos.
Sonhos: como são estranhos… Aparecem à noite, quando dormimos. Vêm de muito fundo, lá onde moram nossos desejos adormecidos. Eles são entidades tímidas. Só aparecem com o brilho do luar…
– Ah! Menina, você nos pergunta sobre o segredo da alegria. Sabemos que é nos sonhos que ela se realiza, como quando se espera a volta da pessoa amada. Antes é a saudade, o vazio. Depois o abraço. Alegria é isso: poder abraçar o que se ama. Mas é preciso primeiro saber, primeiro, o nome do que se ama. E é este nome que aparece, disfarçado, nos sonhos. Conte-nos os sonhos do seu Pássaro!
Mas o Pássaro havia parado de sonhar.
– Então não podemos ajudá-la. Mas sabemos que os que sonham são os apaixonados. Eles têm asas feitas de saudade. Quem sabe eles lhe dirão o segredo!…
E a Menina partiu, triste. Já estava cansada, longe, muito longe de seu amado Pássaro… E pensou se não seria melhor estar com ele, em sua tristeza. E dentro dela a saudade foi crescendo, doendo, um desejo enorme de voltar…
Muito longe dali, o Pássaro se olhava no espelho e chorava os sinais do tempo gravados no seu rosto e a única coisa que via era sua própria imagem. De repente, entretanto, algo passou bem no fundo da sua alma, Como se fosse um Vento leve, bem leve; ou um raio de sol crepuscular; uma pequena chama de fogueira no frio das montanhas; um sonho bonito, em meio à noite… E ele se lembrou da Menina. Onde estaria ela? Deixou sobre a mesa o espelho e saiu “em busca das marcas da sua Ausência”, no perfume das flores, no gosto dos frutos, no quarto vazio… Havia, por todos os lugares, a presença da sua Ausência. E naquele corpo, por tanto tempo morto dentro do espelho, o Desejo cresceu, o rosto sorriu, as asas se abriram e o que era pesado voou…
Ressuscitou…
E cada um deles partiu, ignorando o que o outro fazia, em busca do reencontro…
O feitiço fora quebrado.
Estavam apaixonados.
Voavam leves, ao Vento, com as asas da saudade…
E ambos traziam, no brilho dos olhos, os sinais da juventude eterna que os anos não conseguem apagar… Porque os que estão apaixonados, não envelhecem jamais…

Rubem Alves