O quadro de pano









Uma pobre mulher viúva, morava com seus três filhos numa pequena aldeia ao pé da montanha.
Os dois filhos mais velhos não queriam  saber de trabalhar, passavam os dias espreguiçando-se ao sol.
O caçula, menino ainda, era quem ajudava com pequenos serviços: limpar a casa, catar gravetos  para manter o fogo aceso, carregar água para os banhos e para a comida.
Esta mulher passava todo o dia tecendo lindos panos que, aos domingos levava  para vender na feira de uma cidadezinha próxima. Era com o dinheiro dessa venda que comprava os mantimentos com que sustentava a família durante a semana seguinte.
Certo domingo, tendo vendido rapidamente sua mercadoria, sobrou-lhe tempo de passear pela feira. Sua atenção foi chamada para um lindo quadro que, junto  com outros de igual beleza, estavam à venda numa barraca. Era uma pintura reproduzindo uma paisagem parecida com o lugar onde morava: as mesmas montanhas azuis, o mesmo riacho de águas prateadas. Mas as casas eram bem diferentes. Em vez de casebres pobres e cercados por terrenos secos, viam-se casas pintadas de cores alegres, rodeadas de jardins. Em verdes pastagens viam-se aves domésticas, cabras, ovelhas, bois e cavalos.
Como seria bom se a realidade do lugar onde morava fosse igual àquele quadro, pensou. Encantou-se tanto por ele que teve o desejo de comprá-lo. Perguntou o preço,  era tão caro, custava quase todo o dinheiro de que dispunha e que deveria ser usado na compra dos víveres. Rodou, rodou pela feira, mas o quadro não lhe saia da cabeça. Num impulso, voltou à banca onde estava exposto o comprou-o.
Com o dinheiro restante comprou arroz. Era o que ela e seus filhos comeriam na semana seguinte.
Quando os dois filhos mais velhos viram a loucura que a mãe cometera ao comprar um objeto tão supérfluo, e que por causa disso teriam de passar dias e dias  comendo apenas arroz, irritaram-se e revoltaram-se. Só o caçula nada disse e ainda observou que o quadro era realmente muito bonito. Sugeriu à mãe, fazer um tecido copiando aquela paisagem.
A mãe entusiasmou-se com a sugestão. Quando foi à cidade, comprou linhas de seda de várias cores e começou a tecer.
Como seria um projeto demorado e a família precisava ser alimentada, ela só trabalhava no quadro de seda à noite, depois que fazia os tecidos habituais para venda.
Fazendo aquele trabalho extra, à luz de vela, seus olhos cansados chegavam a sangrar, mas não esmorecia. O prazer ao executar a tarefa era tanto, que superava o cansaço sentido. Ao fim de dois anos o quadro de pano ficou pronto. Ficou realmente uma pequena maravilha. A mulher contemplou o seu trabalho e pensou que não fora em vão o enorme sacrifício.
Os dois filhos mais velhos então se pronunciaram quase em coro:
__ Oh! Este quadro poderá ser vendido por um bom dinheiro!
__ Não, reagiu a mãe, este quadro eu o fiz para mim. Não o venderei por dinheiro nenhum.
As vizinhas, ao saberem do quadro pronto, vieram admirá-lo. Ela levou-o para fora da casa. A claridade do dia realçaria toda a beleza de seu trabalho.
De repente o vento soprou muito forte, tão forte que arrebatou o quadro das mãos da mulher. Todos o viram ser levado pelos ares, através dos campos e sumir atrás da montanha.
A pobre mulher ficou desolada. Tanto sacrifício e acontecer isso!
O golpe sofrido foi tão rude que ela adoeceu, ficou de cama dias e dias.
Pediu ao filho mais velho:
__ Procure o meu quadro, do contrário, poderei morrer de tristeza.
O filho mais velho partiu. Seguiu a direção em que o vento soprava quando levou o quadro. Numa encruzilhada viu uma casa de pedra onde morava uma velha. Perguntou-lhe se vira um quadro de pano se levado pelo vento.
__ Vi sim, respondeu a mulher. As fadas da montanha do sol o roubaram e o levaram  para o castelo que ficava além do mar de gelo e da montanha de fogo. Apenas  aquele cavalo de pedra poderá levá-lo até lá. Mas para isto é preciso que ele se fortaleça comendo os morangos que estão na relva a seus pés. Como ele não tem dentes, você deverá arrancar os seus e colocá-los na boca do animal. Depois  ele estará em condições de levá-lo à montanha das fadas. O rapaz desistiu da empreitada. A velha deu-lhe uma bolsa cheia de moedas de ouro para que, de volta à casa, se sustentassem enquanto a mãe estivesse doente.
Como o dinheiro, o rapaz foi direto para a cidade: só pensava em  divertir-se.
Vendo que o filho mais velho não voltava, a mãe implorou ao segundo que fosse  procurar o seu bordado.
Repetiu-se o mesmo com ele. Em poucos dias já estava na cidade gastando as moedas de ouro que a velha lhe dera.
O mais novo ofereceu-se para ir procurar o quadro de pano. Ele nem questionou quando a velha lhe disse que teria de ficar sem seus dentes. Imediatamente arrancou-os, colocou-os na boca do cavalo, esperou que ele comesse os morangos, montou-o e partiu.
A viagem foi longa e penosa. A travessia do mar de gelo e da montanha de fogo deixou-o aterrorizado, mas conseguiu se  dominar.
Entrou sem maiores dificuldades, no castelo das fadas. Foi encontrá-las num grande salão, ao redor do quadro  de seda de sua mãe. Elas o estavam copiando, quase concluindo o trabalho.
As fadas o receberam muito bem e prometeram lhe devolver o quadro no dia seguinte. Trabalharam a noite inteira, enquanto o rapaz descansava da viagem. Quando as fadas se  retiraram o rapaz percebeu que uma delas continuou um bom tempo ainda bordando na pontinha do quadro. Não no quadro que as fadas copiaram, mas no quadro feito por sua mãe. Esta fada, a mais jovem delas, muito graciosa, havia sido a que dispensou mais atenção ao rapaz.
No dia seguinte, de posse do bordado e de muitos presentes das fadas para sua mãe, o rapaz montou no cavalo e iniciou o caminho de volta. Novamente atravessou a montanha de fogo, o mar de gelo, e chegou à casa de pedra da velha.
O cavalo petrificou-se, os dentes caíram na relva. A velha recolocou-os na gengiva do rapaz, de onde pareciam nunca terem saído. Como premio deu-lhe sandálias mágicas que o transportaram, imediatamente à casa de sua mãe.
A pobre mulher que, jazia no leito e vivia graças aos cuidados das vizinhas, criou alma nova ao reconhecer o seu quadro. Olhou-o com atenção e observou num dos cantos estava um elemento novo, não havia sido bordado por ela. Era a graciosa figura de uma fadinha. Levou-o com muito cuidado para fora e estendeu-o no chão de sua porta, como um tapete.
Fato maravilhoso e inexplicável aconteceu. O bordado foi crescendo por todos os lados, , alcançando os campos próximos, estendendo-se às montanhas. A paisagem vista, agora, era idêntica à do quadro, tornara-se real. A fadinha bordada surgiu em carne e osso. Sorrindo para o rapaz, explicou-lhe que aquela tinha sido a maneira encontrada para vir com ele.
Claro que o rapaz ficou muito feliz. Ela, a fadinha e a mãe viveram na maior felicidade por muitos anos.
Quanto aos dois irmãos mais velhos, o que se  soube é que depois de gastarem as moedas de ouro, continuaram andando pelo mundo, como cachorros sem dono.

(Fonte : volta ao mundo em 52 histórias, Neil Philip, Cia das letrinhas)

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