A gente tem muitos bichos na vida. Eu, como toda
criança, tive meu bicho papão particular, chamado medo. Bicho
Papão, aparecia nas horas mais escuras da noite, naquelas horas em que a cabeça
da gente começava a imaginar besteira, imagina, imagina, de repente o medo toma
conta do mundo. Bicho Papão a gente inventa.
O meu foi inventado por uma cozinheira gorda,
chamada Guiomar. Guiomar era preta, gordíssima e vivia contando histórias
terríveis, de botar cabelo em pé. Eu tenho cabelo crespo,
até hoje, por culpa da Guiomar. Ela me contou cada uma, arrepiei tanto, que arrepiada fiquei!
Dizem que a gente não deve contar histórias de meter medo pra crianças, por isso não vou contar o que Guiomar contava.
até hoje, por culpa da Guiomar. Ela me contou cada uma, arrepiei tanto, que arrepiada fiquei!
Dizem que a gente não deve contar histórias de meter medo pra crianças, por isso não vou contar o que Guiomar contava.
Lembrei de uma reza que Guiomar tinha me ensinado
pra espantar todos os males do mundo. Era uma reza complicada, precisava rezar e dar uns pulinhos e umas
voltas. Pra rezar aquilo seria necessário sair de baixo do cobertor. Deus me
acuda!
Meu Bicho Papão era assim: tinha pés pra trás e eram de pato. Às vezes
eram só de pato, virados pra frente mesmo.
Resolvi tomar coragem, mas o pavor não passava. Era preciso rezar a reza
de Guiomar, pois comecei a ouvir a voz de papai, como se ele tivesse uma voz
com sotaque papônico. Aí, era
preciso sair da cama e rezar a reza!
preciso sair da cama e rezar a reza!
Pulei da cama, rápido, acendendo a luz de cabeceira. Sombras enormes
projetavam-se nas paredes, a cortina continuava a dançar, enquanto o vento
gemia lá fora: uuuuuuuuuuuuuuuuuuuu!
Nesta exata hora meu pai entrou no quarto :
Nesta exata hora meu pai entrou no quarto :
– Você precisa dormir, menina. Amanhã o colégio começa cedo.
Resolvi espiar. Eu ia dar uma olhadinha rápida nos pés do meu pai, era só tomar coragem.
Suava frio, tremia toda, apavorada.
Resolvi espiar. Eu ia dar uma olhadinha rápida nos pés do meu pai, era só tomar coragem.
Suava frio, tremia toda, apavorada.
– Você está com frio?
– Pronto! Ele perguntou isso só pra me soprar o fogo de suas ventas! Era
a mula-sem-cabeça, fingindo ser papai. Tinha pé de pato, com certeza
absoluta!Tomei coragem, virei os olhos pra baixo pra espiar. Neste segundo, ele
apagou a luz, dizendo:
– Boa noite.
Fiquei sem saber se era meu pai, ou se era o Bicho Papão. Até hoje meu
cabelo é duro de pentear. Espetou, arrepiado pra sempre!
(Sylvia
Orthof)
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