Lá fora está a chover
muito, muito.
— Mas que dilúvio! — diz a mãe.
— Nós temos sorte — diz o pai — aqui sossegados e no quentinho.
Zoe está à mesa com a irmã mais velha, Marina, o pai, a mãe, e o irmãozinho mais novo está sentado ao lado deles na cadeira alta, porque ainda é bebê.
Marina, que já vai à escola porque é grande, tem coisas importantes para dizer e, para as contar, usa frases compridas:
— Esta manhã, no recreio, o Mateus, sabe, o amigo do Frederico, aquele que tem uma camisola vermelha com o Zorro, bem, ele atacou a Maria, sabe, aquela que era minha amiga mas que agora já não é porque foi dizer à Clara, na piscina, sabe, ontem ao meio-dia, que as minhas meias cheiravam a queijo Camembert podre.
Zoe, que é mais pequena, pôs-se a rir. Ela não entendeu a história toda, só percebeu que uma menina tinha dito que as meias da Marina cheiravam a camembert podre. E isso deu vontade de rir.
— Não tem graça! — respinga Marina. — Para de rir, Zoe, ou nunca mais falo contigo!
— É preciso mudar de meias todas as manhãs, querida! — é o conselho da mãe.
— Pois — resmunga Marina. — É o que eu faço. As minhas meias nem cheiram mal!
— Ora deixa ver — pede Zoe.
Marina tira a pantufa com um pontapé e pousa a perna em cima da mesa para pôr o pé debaixo do nariz de Zoe, que o fareja cuidadosamente.
— Não, não cheira a camembert podre. Só um bocadinho a gruyère ralado! — diz Zoe.
— Eh, Marina, onde é que pensa que está? — resmunga o pai. — Porta-te bem à mesa, se faz favor. Vá, come.
Zoe bem gostava de contar montes de coisas apaixonantes, como a irmã, mas não sabe o quê. Então lembra-se de dizer:
— Hoje tive um sonho.
— Oh, que frase tão bonita que acabaste de dizer, minha querida. Um dia, uma pessoa importante disse a mesma coisa que você…
— Eu também tive um sonho! Muitos, até! — disse Marina muito rapidamente, para não julgarem que Zoe era a única a sonhar na família.
E continua:
— Sonhei que estava uma banana descascada na banheira e que eu não conseguia agarrá-la porque ela escorregava como um sabonete!
Zoe desata a rir. O sonho da Marina é mesmo engraçado! A irmã mais velha tem sorte em ter sonhos daqueles.
Toda a gente se ri do sonho da Marina. Até o Leonardo lhe acha graça e ri às gargalhadas, batendo com a colher no prato para mostrar a sua boa disposição.
— Bem, vamos lá acalmar-nos! — disse a mãe, porque o purê do Leonardo está a borrifar tudo e as paredes não precisam de comer purê para crescer, ao passo que o bebê, sim.
— E você, minha querida, com o que é que sonhou? — pergunta o pai a Zoe.
— Com animais — diz Zoe, muito timidamente.
Ninguém se ri, evidentemente. Sonhar com animais é menos engraçado do que sonhar com uma banana numa banheira.
Zoe suspira. É pena que o seu sonho não faça rir ninguém.
— Que animais eram e o que é que estavam a fazer? — pergunta a mãe.
Zoe já não se lembra lá muito bem. Procura inventar qualquer coisa engraçada, qualquer coisa de extraordinário que cause espanto a toda a gente à mesa.
Mas não lhe vem nada à cabeça. E depois a Marina atrapalha-a um pouco porque diz:
— Eu sei! As vacas mugiam, as cabras baliam, os leões rugiam, os patos grasnavam… e as galinhas… as galinhas cacarejavam!
Ela julga que sabe tudo, a Marina! Até sobre os animais do sonho de Zoe ela pensa que sabe! Mete uns nervos!
— Não! — diz Zoe. — O meu sonho não era nada disso. Você não sabe porque nem sequer lá estava. Só eu. Eu, e os animais, vê?
Isto faz calar o bico à Marina.
— Então o que é que os teus animais estavam a fazer, hã? Anda, diz lá, já que você é que sabe! — ordena Marina.
De repente, Zoe tem uma ideia. E diz:
— Estavam a casar-se.
Silêncio em volta da mesa. Zoe pergunta-se se disse alguma asneira. Mas não. O pai disse:
— Devia ser bonito!
— Era — diz Zoe. — Era muito bonito. O Sr. Leão com a Sr.ª Leão, o Sr. Porco com a Sr.ª Porco, o Sr. Galinha com a Sr.ª Galinha, o Sr. Vaca com a Sr.ª Vaca…
— Quer dizer, a porca com o porco, o galo com a galinha, o touro com a vaca… — interrompe Marina.
— Não! — grita Zoe. — Fique calada. Nem estava no meu sonho, portanto não sabe!
E continua:
— Estavam os animais todos aos pares, em filinha indiana a casar-se todos. E pronto. E só lá estava eu a ver.
E quanto mais pensa no que disse, mais Zoe se convence que sonhou mesmo com aquilo. Ela quase se lembra e até está a vê-los!
— E depois, esses animais todos para onde é que foram? — perguntou a mãe.
Naquele instante, Zoe interroga-se por uns momentos.
Depois diz:
— Foram, foram…
Marina sugere:
— Para o mar?
Zoe está tentada a dizer que sim. É lindo, um casamento no mar. Diz que sim com a cabeça e Marina está contente porque adivinhou.
— Sim — confirma Zoe. — foram para o mar.
— E lá — diz o pai – e baixa a voz para criar mistério – entraram para o barco da Zoe!
Zoe fica de boca aberta.
— Como é que soube? — pergunta Marina. — Você também não estava no sonho dela!
— Não estava — diz o pai — mas adivinho!
— Pois é, o pai adivinhou, tem esse direito! — proclama Zoe.
Marina amua um pouco.
— Se adivinho — diz o pai — é porque, um dia, há muito tempo, aconteceu uma história como esta. Os animais, para escaparem a um dilúvio bem pior do que este, entraram aos pares, o macho e a fêmea, para um barco muito bem fechado que vagueou durante muito, muito, muito tempo, quarenta dias e quarenta noites! Um barco maravilhoso a que se deu o nome de arca! E sabem como se chamava a pessoa que os fez entrar na arca?
— Noé! — grita Marina.
— Sim, Zoe! — grita Zoe encantada.
— Quase! — o pai ri-se.
— Quase.
— Então a Zoe copiou o sonho! — resmungou Marina. — Já alguém o tinha sonhado.
Zoe sente-se um pouco triste.
— Não é verdade! — diz ela.
— Ora — diz o pai — ninguém sonha o mesmo sonho de outra pessoa, é impossível. Mas, por vezes, talvez, ao longo de muito tempo, os sonhos se juntem. Talvez…
Continua a chover.
— Não vamos poder ir brincar para o jardim público — lamenta-se Marina.
— Não — diz a mãe — não vão poder, mas não importa. Inventem uma brincadeira engraçada para fazer em casa.
— Não — diz Marina amuada. — Não vamos encontrar nada de engraçado para fazer em casa. O único divertimento vai ser ficar aborrecidas.
Mas Zoe tem uma ideia.
— Eu vou fazer a arca debaixo da mesa.
— A arca de Noé?
— Sim, a arca de Zoe — responde Zoe.
— Eu vou ajudar — decide Marina.
Zoe vai ao quarto. Pega no urso de calças e Marina pega no dela, que tem uma saia, e sentam-nos debaixo da mesa, que está coberta por uma toalha e faz dela uma ótima arca secreta.
— O Sr. Urso e a Sr.ª Ursa! — exclama Marina.
Voltam ao quarto e pegam numa moto e num caminhão pequeninos.
— Vamos lá, Sr. Caminhão! Para o barco com a Sr.ª Moto!
E metem ainda uma Barbie com o Super-Homem e um balão com uma bolinha.
E a seguir, vão procurar por toda a casa outras coisas para casar e levarem para a arca de Zoe:
O Sr. Pente e a Sr.ª Escova;
O Sr. Sapato e a Sr.ª Chinela;
O Sr. Copo e a Sr.ª Chaleira… de café;
A Sr.ª Garrafa e o Sr. Frasco de perfume;
O Sr. Pijama e a Sr.ª Camisa de dormir;
A Sr.ª Mostarda e o Sr. Ketchup;
A Sr.ª Bolacha e o Sr. Biscoito de chocolate!
Leonardo também aparece com duas meias mal-cheirosas.
— Vai embora, Leo, que isso cheira mal! — diz Marina a rebentar de riso.
— Não quero isso na minha arca! — protesta Zoe. — Vai embora, Leo!
A mãe tira-lhe as meias.
De gatas, Leonardo tenta entrar na arca. Desarruma um pouco as coisas, senta-se em cima do Sr. Ketchup, entorna a Sr. Garrafa.
— Papai, mamãe! — gritam Marina e Zoe. — Venham buscar o Leo, está a nos aborrecer!
— Então, meninas! — diz o pai. — Ainda há um lugarzinho na arca para o Leo!
— Não — diz Marina. — Já não há lugar, o barco vai sair
— Façam um esforço! — continua o pai.
As meninas pensam um pouco.
— Ele pode ficar — diz Zoe a Marina. — Ele é o Sr. Irmão e você é a Sr.ª Irmã!
— Está bem.
— Leo! Ele está a comer o Sr. Biscoito!
— Então nós vamos ter de comer a Sr.ª Bolacha…
— Com ketchup… — acrescenta Zoe, mergulhando o seu resto de bolacha no ketchup que escorre por debaixo da mesa.
— Venham ver! — diz a mãe. — O sol já voltou!
As crianças põem todas a cabeça fora da arca para ver.
— Não haverá por acaso um arco-íris, meninas? — pergunta o pai.
Marina e Zoe correm para a janela. Esticam o pescoço para ver, mas não veem.
— Não — diz Marina. — Não há.
— Sou eu que digo — diz Zoe. — Não, pai, não há.
— É pena — diz o pai com um sorriso. — Passamos bem sem ele.
— Mas no meu sonho havia lá um — afirma Zoe. — Com oito cores!
— Sete! — contradiz Marina.
— Oito! — berrou Zoe. — E cala a boca. Você não estava lá!
Jo Hoestlandt
L’arche de Zoe
Arles, Actes Sud, 2003
— Mas que dilúvio! — diz a mãe.
— Nós temos sorte — diz o pai — aqui sossegados e no quentinho.
Zoe está à mesa com a irmã mais velha, Marina, o pai, a mãe, e o irmãozinho mais novo está sentado ao lado deles na cadeira alta, porque ainda é bebê.
Marina, que já vai à escola porque é grande, tem coisas importantes para dizer e, para as contar, usa frases compridas:
— Esta manhã, no recreio, o Mateus, sabe, o amigo do Frederico, aquele que tem uma camisola vermelha com o Zorro, bem, ele atacou a Maria, sabe, aquela que era minha amiga mas que agora já não é porque foi dizer à Clara, na piscina, sabe, ontem ao meio-dia, que as minhas meias cheiravam a queijo Camembert podre.
Zoe, que é mais pequena, pôs-se a rir. Ela não entendeu a história toda, só percebeu que uma menina tinha dito que as meias da Marina cheiravam a camembert podre. E isso deu vontade de rir.
— Não tem graça! — respinga Marina. — Para de rir, Zoe, ou nunca mais falo contigo!
— É preciso mudar de meias todas as manhãs, querida! — é o conselho da mãe.
— Pois — resmunga Marina. — É o que eu faço. As minhas meias nem cheiram mal!
— Ora deixa ver — pede Zoe.
Marina tira a pantufa com um pontapé e pousa a perna em cima da mesa para pôr o pé debaixo do nariz de Zoe, que o fareja cuidadosamente.
— Não, não cheira a camembert podre. Só um bocadinho a gruyère ralado! — diz Zoe.
— Eh, Marina, onde é que pensa que está? — resmunga o pai. — Porta-te bem à mesa, se faz favor. Vá, come.
Zoe bem gostava de contar montes de coisas apaixonantes, como a irmã, mas não sabe o quê. Então lembra-se de dizer:
— Hoje tive um sonho.
— Oh, que frase tão bonita que acabaste de dizer, minha querida. Um dia, uma pessoa importante disse a mesma coisa que você…
— Eu também tive um sonho! Muitos, até! — disse Marina muito rapidamente, para não julgarem que Zoe era a única a sonhar na família.
E continua:
— Sonhei que estava uma banana descascada na banheira e que eu não conseguia agarrá-la porque ela escorregava como um sabonete!
Zoe desata a rir. O sonho da Marina é mesmo engraçado! A irmã mais velha tem sorte em ter sonhos daqueles.
Toda a gente se ri do sonho da Marina. Até o Leonardo lhe acha graça e ri às gargalhadas, batendo com a colher no prato para mostrar a sua boa disposição.
— Bem, vamos lá acalmar-nos! — disse a mãe, porque o purê do Leonardo está a borrifar tudo e as paredes não precisam de comer purê para crescer, ao passo que o bebê, sim.
— E você, minha querida, com o que é que sonhou? — pergunta o pai a Zoe.
— Com animais — diz Zoe, muito timidamente.
Ninguém se ri, evidentemente. Sonhar com animais é menos engraçado do que sonhar com uma banana numa banheira.
Zoe suspira. É pena que o seu sonho não faça rir ninguém.
— Que animais eram e o que é que estavam a fazer? — pergunta a mãe.
Zoe já não se lembra lá muito bem. Procura inventar qualquer coisa engraçada, qualquer coisa de extraordinário que cause espanto a toda a gente à mesa.
Mas não lhe vem nada à cabeça. E depois a Marina atrapalha-a um pouco porque diz:
— Eu sei! As vacas mugiam, as cabras baliam, os leões rugiam, os patos grasnavam… e as galinhas… as galinhas cacarejavam!
Ela julga que sabe tudo, a Marina! Até sobre os animais do sonho de Zoe ela pensa que sabe! Mete uns nervos!
— Não! — diz Zoe. — O meu sonho não era nada disso. Você não sabe porque nem sequer lá estava. Só eu. Eu, e os animais, vê?
Isto faz calar o bico à Marina.
— Então o que é que os teus animais estavam a fazer, hã? Anda, diz lá, já que você é que sabe! — ordena Marina.
De repente, Zoe tem uma ideia. E diz:
— Estavam a casar-se.
Silêncio em volta da mesa. Zoe pergunta-se se disse alguma asneira. Mas não. O pai disse:
— Devia ser bonito!
— Era — diz Zoe. — Era muito bonito. O Sr. Leão com a Sr.ª Leão, o Sr. Porco com a Sr.ª Porco, o Sr. Galinha com a Sr.ª Galinha, o Sr. Vaca com a Sr.ª Vaca…
— Quer dizer, a porca com o porco, o galo com a galinha, o touro com a vaca… — interrompe Marina.
— Não! — grita Zoe. — Fique calada. Nem estava no meu sonho, portanto não sabe!
E continua:
— Estavam os animais todos aos pares, em filinha indiana a casar-se todos. E pronto. E só lá estava eu a ver.
E quanto mais pensa no que disse, mais Zoe se convence que sonhou mesmo com aquilo. Ela quase se lembra e até está a vê-los!
— E depois, esses animais todos para onde é que foram? — perguntou a mãe.
Naquele instante, Zoe interroga-se por uns momentos.
Depois diz:
— Foram, foram…
Marina sugere:
— Para o mar?
Zoe está tentada a dizer que sim. É lindo, um casamento no mar. Diz que sim com a cabeça e Marina está contente porque adivinhou.
— Sim — confirma Zoe. — foram para o mar.
— E lá — diz o pai – e baixa a voz para criar mistério – entraram para o barco da Zoe!
Zoe fica de boca aberta.
— Como é que soube? — pergunta Marina. — Você também não estava no sonho dela!
— Não estava — diz o pai — mas adivinho!
— Pois é, o pai adivinhou, tem esse direito! — proclama Zoe.
Marina amua um pouco.
— Se adivinho — diz o pai — é porque, um dia, há muito tempo, aconteceu uma história como esta. Os animais, para escaparem a um dilúvio bem pior do que este, entraram aos pares, o macho e a fêmea, para um barco muito bem fechado que vagueou durante muito, muito, muito tempo, quarenta dias e quarenta noites! Um barco maravilhoso a que se deu o nome de arca! E sabem como se chamava a pessoa que os fez entrar na arca?
— Noé! — grita Marina.
— Sim, Zoe! — grita Zoe encantada.
— Quase! — o pai ri-se.
— Quase.
— Então a Zoe copiou o sonho! — resmungou Marina. — Já alguém o tinha sonhado.
Zoe sente-se um pouco triste.
— Não é verdade! — diz ela.
— Ora — diz o pai — ninguém sonha o mesmo sonho de outra pessoa, é impossível. Mas, por vezes, talvez, ao longo de muito tempo, os sonhos se juntem. Talvez…
Continua a chover.
— Não vamos poder ir brincar para o jardim público — lamenta-se Marina.
— Não — diz a mãe — não vão poder, mas não importa. Inventem uma brincadeira engraçada para fazer em casa.
— Não — diz Marina amuada. — Não vamos encontrar nada de engraçado para fazer em casa. O único divertimento vai ser ficar aborrecidas.
Mas Zoe tem uma ideia.
— Eu vou fazer a arca debaixo da mesa.
— A arca de Noé?
— Sim, a arca de Zoe — responde Zoe.
— Eu vou ajudar — decide Marina.
Zoe vai ao quarto. Pega no urso de calças e Marina pega no dela, que tem uma saia, e sentam-nos debaixo da mesa, que está coberta por uma toalha e faz dela uma ótima arca secreta.
— O Sr. Urso e a Sr.ª Ursa! — exclama Marina.
Voltam ao quarto e pegam numa moto e num caminhão pequeninos.
— Vamos lá, Sr. Caminhão! Para o barco com a Sr.ª Moto!
E metem ainda uma Barbie com o Super-Homem e um balão com uma bolinha.
E a seguir, vão procurar por toda a casa outras coisas para casar e levarem para a arca de Zoe:
O Sr. Pente e a Sr.ª Escova;
O Sr. Sapato e a Sr.ª Chinela;
O Sr. Copo e a Sr.ª Chaleira… de café;
A Sr.ª Garrafa e o Sr. Frasco de perfume;
O Sr. Pijama e a Sr.ª Camisa de dormir;
A Sr.ª Mostarda e o Sr. Ketchup;
A Sr.ª Bolacha e o Sr. Biscoito de chocolate!
Leonardo também aparece com duas meias mal-cheirosas.
— Vai embora, Leo, que isso cheira mal! — diz Marina a rebentar de riso.
— Não quero isso na minha arca! — protesta Zoe. — Vai embora, Leo!
A mãe tira-lhe as meias.
De gatas, Leonardo tenta entrar na arca. Desarruma um pouco as coisas, senta-se em cima do Sr. Ketchup, entorna a Sr. Garrafa.
— Papai, mamãe! — gritam Marina e Zoe. — Venham buscar o Leo, está a nos aborrecer!
— Então, meninas! — diz o pai. — Ainda há um lugarzinho na arca para o Leo!
— Não — diz Marina. — Já não há lugar, o barco vai sair
— Façam um esforço! — continua o pai.
As meninas pensam um pouco.
— Ele pode ficar — diz Zoe a Marina. — Ele é o Sr. Irmão e você é a Sr.ª Irmã!
— Está bem.
— Leo! Ele está a comer o Sr. Biscoito!
— Então nós vamos ter de comer a Sr.ª Bolacha…
— Com ketchup… — acrescenta Zoe, mergulhando o seu resto de bolacha no ketchup que escorre por debaixo da mesa.
— Venham ver! — diz a mãe. — O sol já voltou!
As crianças põem todas a cabeça fora da arca para ver.
— Não haverá por acaso um arco-íris, meninas? — pergunta o pai.
Marina e Zoe correm para a janela. Esticam o pescoço para ver, mas não veem.
— Não — diz Marina. — Não há.
— Sou eu que digo — diz Zoe. — Não, pai, não há.
— É pena — diz o pai com um sorriso. — Passamos bem sem ele.
— Mas no meu sonho havia lá um — afirma Zoe. — Com oito cores!
— Sete! — contradiz Marina.
— Oito! — berrou Zoe. — E cala a boca. Você não estava lá!
Jo Hoestlandt
L’arche de Zoe
Arles, Actes Sud, 2003
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