A vovó estava atarefada na cozinha preparando os doces para a festa de aniversário do seu neto mais novo. Cinco anos completava o menino, e ele tinha pedido como presente um bolo de chocolate bem grande.
De repente a cozinha foi invadida por um bando de crianças para ver dona Zezinha preparar o grande bolo. Ela bem sabia que a intenção não era ver fazer o bolo, mas lamber a tigela depois que ela pusesse a massa na fôrma. Era assim todos os anos e ela sempre deixava um pouco de massa para a criançada se divertir.
Como morava numa cidade do interior de São Paulo, dona Zezinha tinha fogão à lenha e, como ela sempre dizia, todo o alimento feito no fogão à lenha fica bem mais gostoso. Fogão a gás só para ferver água. Enquanto a vovó batia a massa do bolo, Quitéria, a empregada da família, atiçava as brasas e testava a temperatura do forno. Tudo pronto. O bolo foi para o forno, as crianças lamberam a tigela e ficaram ali aguardando a retirada do bolo depois de assado.
Foi quando Pedrinho, o aniversariante, olhando a lenha ardendo perguntou:
- Vovó, como surgiu o fogo?
- É mesmo! – repetiram as crianças – A senhora conta pra gente?
- Ah, meninos! Existem muitas histórias a respeito do fogo. Tem história grega, alemã, mas eu vou contar uma que é relatada pelas tribos indígenas:
Os índios contam que seus antepassados só tinham para se aquecerem a luz do sol e por isso passavam frio e comiam os alimentos crus. Um índio, de uma tribo longínqua, conhecia o fogo, mas não o dividia com as outras tribos. A filha desse índio era a guardiã da chama que nunca se apagava.
Uma outra tribo, sabedora do fato, designou o índio mais esperto para descobrir o segredo e trazer o fogo para eles. Este índio vigiou por muitos dias a cabana onde o fogo ficava sempre aceso, até que a índia guardiã saiu para tomar banho no rio. Então ele se transformou numa ave e caiu no rio. A índia, penalizada, recolheu a ave e a levou para a cabana para secar as penas ao calor do fogo. Quando as penas estavam secas, a ave voltou a ser índio e roubando uma brasa fugiu para a floresta, escondendo-se em uma gruta até que a guardiã do fogo desistisse de procurá-lo.
Percebendo que podia sair sem perigo, o índio transformou-se novamente em ave e, carregando a brasa no bico voou pousando num pinheiro. A brasa incendiou um ramo de sapé. Levando o ramo no bico, a ave voltou para sua tribo ficando a brasa entre as folhas secas. Com o vento, o fogo se espalhou pelo campo e durante muitos dias a mata ardeu em chamas. Vendo aquele fogaréu no mato, os índios de todas as tribos foram buscar brasas e ramos incendiados, levando para suas casas e, partir daí, gente, nunca mais o homem deixou o fogo se apagar.
- Na minha casa o fogo não fica sempre aceso. – disse Marieta, a amiguinha de Pedrinho.
- Para isso o homem deu tratos à bola inventando coisas para acender o fogo sempre que ele queira. – respondeu a vovó.
- Já sei. Ele inventou os fósforos, o isqueiro... – disse Carlinhos o irmão mais velho de Pedrinho.
- Isso mesmo. No começo eles acendiam o fogo batendo uma pedra na outra para gerar uma faísca e assim acender o fogo. Era muito trabalhoso e demorado – explicou dona Zezinha.
Enquanto a vovó falava o cheiro de bolo assado impregnava a cozinha e a casa toda, deixando a meninada com água na boca. E foi sob grande algazarra que Quitéria tirou o bolo fofinho do forno, colocando-o sobre a bandeja de prata para esfriar e receber a gostosa cobertura de chocolate com morangos.
- Vovó, está tão lindo o bolo! – exclamou Pedrinho.
- Viu, meu querido, se não fosse o fogo, adeus bolo de aniversário...
Maria Hilda de J. Alão.
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