Era uma vez uma mãe que tinha medo de lagartixa. No
resto, era valente: ficava sozinha, cantava no escuro, tomava sopa quente.
Era mesmo corajosa: enfrentava barata, discutia com o chefe,
tomava injeção toda prosa.
De bicho de pena e de bicho de pelo, ela gostava muito.
Filho dela podia ter cachorro, gato, coelho, periquito, curió, canário,
porquinho da índia. Nem que fosse tudo ao mesmo tempo, ela não se incomodava,
até animava, mais ainda inventava.
Peixe e jabuti, também ela deixava como ninguém. E tinha aquário
redondo com peixe vermelho e tinha varanda vermelha com jabuti redondo. Se os
filhos descobrissem macaco de asa, ela era capaz de deixar em
casa.
Se para uma vaca encontrasse lugar, não ia ser ela quem ia atrapalhar.
Mas sapo? Minhoca? Perereca? Camaleão? Nem queria saber. Disfarçava e ia
se esconder. Os filhos explicavam:
___ Mamãe, que é que tem? Um bicho tão bonzinho, não faz nada, olha aí!
Ela
olhava. Mas não gostava.
E
aqueles lagartinhos nas pedras do sol?
___
Um bichinho à toa, mãe deixava de ser boba!
Mas
aí ela era boba. Tão boba que, no caminho da praia, pelo meio de matinho ia
pisando forte e falando alto, fazendo barulho só para assustar os lagartinhos –
que saíam correndo, morrendo de medo de uma mulher tão grande e barulhenta.
Mas o medo maior era o que a mãe tinha de lagartixa.
Ana Maria Machado
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