O BURRO E AS RELÍQUIAS







          Certa vez, já faz muito tempo, um burro foi carregado com relíquias sagradas e levado pelos sacerdotes a diversas regiões da terra onde certo povo habitava. Por todos os lugares onde o cortejo religioso passava, o povo se postava em oração diante do burro transformado em altar, cantando hinos e queimando incenso em honra às divindades representadas pelas imagens e objetos que ele carregava.

          Vendo aquilo tudo o burro, supondo que o adorado era ele, mais e mais soberbo se tornava, até que quando a situação chegou a um ponto em que nem mesmo os serviçais dos sacerdotes o estavam suportando, alguém que vinha observando a transformação sofrida pelo o animal chegou junto ao seu ouvido e sussurrou:

          - Por favor, burro tolo, afasta de tua cabeça a ideia de que a ti são dirigidas as homenagens prestadas pelo povo, porque eles fazem isso em louvor e glória às relíquias que tens em teu lombo, e não a ti, que apenas as carregas. É diante delas, e não de ti, que eles se curvam enquanto fazem suas preces, porque são elas que merecem respeito e veneração. Não te esqueças que até mesmo o juiz que nada sabe, ou que não se preparou o bastante para exercer com sabedoria e imparcialidade a sua autoridade, também tem a toga saudada pelos cidadãos que se submetem a seu julgamento, porque é ela, e não o homem que a veste, o símbolo da justiça.

          Moral da história: Não é a roupa que transmite ao homem a dignidade e o respeito com que ele pretende ser tratado.


Baseado em uma fábula de La Fontaine

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