O leão Jubinha resolveu fazer um churrasco. Acendeu o fogo e pôs a carne para assar. O cheiro estava bom demais. Enquanto a carne assava, o leão arrumava a mesa. Foi aí que apareceu um lobo, desgarrado da sua alcateia, com dois pedaços de pão, um em cada pata, e pediu ao leão uma fatia de carne para fazer um sanduíche. Jubinha disse que não lhe daria carne alguma porque aquela que estava assando mal dava para saciar a sua fome. O lobo implorou dizendo que há três dias não comia nada e que o seu estômago já estava grudado nas costas de tanta fome.
O leão não se comoveu. Disse não e não. O lobo ficou ali segurando o pão e pensando num jeito de conseguir um naquinho daquele saboroso churrasco. Mais uma vez o lobo pediu e o leão disse não. Foi então que o lobo perguntou:
- Onde você caçou esta bela e gorda capivara?
- Eu não cacei. Eu a encontrei escondida entre os galhos de uma moita. E como não tinha ninguém e nem tinha nenhuma marca eu, o rei dos animais, confisquei o achado. Portanto é de minha propriedade. – respondeu Jubinha estufando o peito.
- Saiba que fui eu quem caçou o bicho. Eu o deixei ali só por um instante, só o tempo de ir beber água no rio. Quando eu voltei não tinha mais nada. – reclamou o lobo Lobão.
- Por que não deixou um aviso? - perguntou Jubinha.
- E você respeitaria se tivesse deixado? Eu penso que não. – respondeu o lobo.
- E se eu pagar pelo pedaço de carne, você me dará? – perguntou Lobão.
- Não tem acordo. – respondeu Jubinha.
- Então só vejo uma solução. – disse o lobo.
- Qual é? – pergunta o leão coçando a juba com impaciência.
- Vamos ao tribunal dos bichos para que um juiz decida de quem é a capivara. – propôs o lobo.
- Então vamos! – exclamou o leão retirando a carne da fogueira para levá-la como prova.
E lá se foram os dois levando o churrasco para o tribunal da bicharada. Chegaram. O tribunal ficou lotado de animais e aves, umas vindas de muito longe porque um papagaio tagarela espalhou pelos quatro cantos o que estava acontecendo e, com isso, despertou a curiosidade dos habitantes da floresta.
Como terminaria aquela questão? Quem venceria? Todos queriam saber. A zoeira estava demais, ninguém conseguia ouvir ninguém, quando entrou um jacaré todo empertigado, em pé nas duas patas traseiras, vestindo uma casaca marrom espinhosa, e abrindo a bocarra cheia de dentes gritou:
- Façam silêncio no tribunal! – silêncio total, não se ouvia nem uma mosca voando. E o jacaré gritou novamente:
- Todos de pé! - neste momento entrou o juiz, um enorme urso pardo, que mandou todo mundo se acomodar sem muito ruído.
- Qual é a questão? – perguntou o juiz Ursolino.
E começaram a falar ao mesmo tempo o leão e o lobo. A plateia estava dividida. Uma metade era a favor do leão e a outra a favor do lobo. Os que apoiavam o leão gritavam:
- Jubinha, Jubinha, Jubinha! Já ganhou, já ganhou! – o mesmo acontecia com a turma que torcia pelo Lobão. E virou bagunça. O juiz Ursolino, levantando-se com dificuldade devido ao seu grande peso, deu um murro na mesa gritou:
- Ordem no tribunal! – e a bicharada sossegou.
- Falem um de cada vez – advertiu o juiz.
E leão contou a sua história. Ao final disse:
- Portanto a capivara é minha e eu não dou nem o cheiro dela para esse lobo folgado.
Chegou a vez do lobo. Ele contou a sua versão dizendo que só queria um pedacinho de carne para colocar entre as duas fatias de pão porque a sua fome era muita. Mas como o leão era intransigente, ele resolveu apelar para a justiça.
Fato exposto e ouvido atentamente pelo juiz, foi dado um intervalo para que ele deliberasse e lavrasse a sentença que o assunto merecia. Meia hora depois ele voltou ao plenário. Sentou-se e começou:
- Quem caçou a capivara foi o lobo que, displicentemente, a deixou sem proteção em um lugar qualquer. O leão a encontrou. Não tinha identificação. Simplesmente estava ali, naquele lugar, abandonada, e como achado não é roubado ele a levou para fazer este saboroso churrasco que aí está. Sendo esta uma situação inusitada, eu deliberei o seguinte: o lobo caçou. O leão achou. Um teve o trabalho de perseguir e apanhar a capivara, o outro teve o trabalho de limpar, temperar e acender o fogo para assar a carne. Que seja dividido o churrasco. Metade para o lobo e metade para o leão.
Deu um murro na mesa encerrando a tumultuada sessão. A plateia aplaudiu o juiz Ursolino pelo seu senso de justiça, gritando:
- É o maior, é o maior, é o maior...!
Só assim, indo as barras do tribunal, que o lobo pode colocar um pedaço de carne no meio das fatias de pão e acabar com a sua fome. Depois de um tempo ele voltou para a sua alcateia onde viveu até a idade avançada sempre ensinando aos mais jovens que a justiça é o melhor meio de solução para as disputas.
Maria Hilda de Jesus Alão
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