A mãe de São Pedro era uma velhinha
muito má, rezinguenta, somítica, com cara de poucos amigos. Não tinha
amizades, todos lhe fugiam.
Aconteceu que um dia estava a lavar
num córrego um molhe de folhinha de cebolas, quando uma delas se desprendeu,
ganhou a correnteza e lá se foi pela água abaixo.
A velha tentou reavê-la, e, não o
conseguindo, exclamou:
– Ora, seja tudo pelo amor de Deus!
Não levou muito tempo morreu e foi
apresentar-se no céu. Foi pesada na balança de S. Miguel e não houve outro
remédio senão mandá-la para o inferno, tão grande era o peso de seus
pecados.
O filho ainda andava pelo mundo. Não
lhe podia valer.
Quando S. Pedro morreu foi nomeado
chaveiro do céu.
Das profundezas do abismo, avistou a
velha ao filho no gozo e posse das glórias celestes e pediu-lhe por gestos
que a salvasse.
O santo chaveiro, que não podia
resolver nada por si, foi ter com o Senhor.
– Salva minha mãe, Divino Mestre.
O Senhor respondeu-lhe assim por
estas palavras:
– Se houver registada no livro das
almas, na vida de tua mãe, ao menos uma boa ação, estará salva, caso ela
saiba aproveitá-la.
Examinou-se o livro e às folhas
tantas, nas contas da mãe de São Pedro, se encontrou a folhinha de cebola,
nada mais! Era a mesma que motivara aquele dizer com que a velha, ao menos
uma vez, se mostrara conformada:
– Seja tudo pelo amor de Deus!
O Senhor disse a Pedro:
– Lança uma das pontas da folhinha em
direção ao inferno. Tua mãe que se agarre a ela. Tu puxarás. Se conseguir
subir até cá, estará salva.
Pedro fez tudo o que o Senhor lhe
ordenara.
A velhinha agarrou-se à folha, mas
uma porção de almas, querendo aproveitar o ensejo de salvação, segura-se
às pernas da velha. Apesar disto esta subia.
Quando já estava o grupo a certa
altura, outras almas se iam apegando às pernas das primeiras.
A velha indignada, de avara que era,
esperneou e atirou novamente ao inferno as companheiras, não querendo
levá-las para o céu.
Mas, no mesmo instante, a folha de cebola
partiu-se, e a mãe de São Pedro ficou no espaço.
Não tinha por onde subir ao céu e o
pedacinho da folha que conservava nas mãos não a deixava voltar ao
inferno.
E assim vive até hoje: nem na terra,
nem no céu.
Colhida em Juiz de Fora, Minas Gerais
– Lindolfo Gomes, “Contos Populares, etc.”, volume IIº, p. 86, Ciclo de S.
Pedro.
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