"Quem tiver o seu segredo,
Não conte a mulher casada,
Esta conta ao seu marido,
O marido aos camaradas...
Em algum lugar lá pelo interior desse Brasil, um marido tinha uma mulher
que gabava-se em saber guardar segredo. Vivia dizendo que as outras eram saco
rasgado e ninguém podia confiar senão no juízo dela.
Tanto se gabou e se gabou que o marido pensou em fazer uma experiência
para ver se a mulher era mesmo segura de língua.
Uma noite, voltando tarde para casa, o homem trouxe um grande ovo de
pata, que é muito maior do que os da galinha, e deitou-se na cama. Lá para as
tantas da madrugada, acordou a mulher, todo assustado e, pedindo que ela
guardasse todo segredo, contou que acabara de pôr um ovo!
A mulher só faltou morrer de admiração, mas o marido mostrou o ovo e ela
acreditou, jurando que nem ao padre confessor havia de dizer o que soubera.
Ora muito bem. Pela manhã, assim que o marido saiu para o trabalho a
mulher correu para a vizinha e, pedindo segredo de amiga, contou que o marido
pusera um ovo na cama e estava todo aborrecido com essa desgraça.
A vizinha prometeu que ninguém saberia, mas passou o dia contando o
caso, ao marido, aos vizinhos, aos conhecidos, sempre pedindo segredo.
E, como quem conta um conto aumenta um ponto, toda vez que a história
passava adiante o ovo ia mudando de número. Primeiro era um, depois dois, deppois
três... e ao anoitecer o homem já pusera meio cento de ovos.
Voltando para casa, o marido encontrou-se com um amigo e este lhe disse
que havia novidade naquela rua.
- Qual a novidade ?
- Não soube ? Uma coisa bem esquisita! Imagine que um morador nesta rua
pôs, penso eu, quase um cento de ovos, seu mano ! Diz que está muito doente e
que cada ovo tem duas gemas. É mesmo o fim do mundo.
O marido não quis saber quem estava de vigia. Entrou em casa, chamou a
mulher, agarrou uma bengala e passou-lhe a lenha com vontade, dando uma surra
de preceito, que a deixou de cama, toda moída e com panos de água e sal.
Depois o homem saiu contando como o caso começara e a mulher ficou
desmoralizada."
Essa estória foi publicada no livro "Contos tradicionais do
Brasil", de Câmara Cascudo (Ediouro, 1999)
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