Era
uma vez uma bolacha Maria que disse que Maria, só Maria, não chegava.
Queria
ser, ao menos, Maria Emília. Bolacha Dona Maria Emília, com todo o respeito.
As
outras companheiras do pacote fizeram-lhe a vontade.
Mas,
quando uma bolacha Maria começa com exigências, oh! oh! nunca mais para…
—
Pensando melhor, não dispenso os apelidos. Quero passar a ser tratada por Dona
Maria Emília de Melo e Sousa Trigo de Reboredo Farinha.
Um
nome tão comprido e retorcido não é fácil de decorar. Algumas das simplesmente
Maria chamavam-na de Maria de Trigo Melo e Sousa não sei quê Farinha. Outras,
de Maria Reboredo Farinha de Melo Trigo de Sousa Emília. E as mais esquecidas,
apenas de Maria Farinha de Trigo, o que a punha fula.
—
Distingam-me. Separem-me. Marquem a diferença. Eu sou uma bolacha especial. Uma
bolacha Dona Maria Emília de Melo e Sousa Trigo de Reboredo Farinha.
—
Tá bem — diziam as outras, que não eram de despiques.
Alguém
abriu o pacote e começou a provar daquelas bolachas torradinhas e saborosas.
Elas não se importavam. Sabiam para o que estavam destinadas e davam-se por
contentes. Proporcionar um pouco de prazer ao paladar era a vocação delas.
A
Maria que não ia com a outras, por sinal a última do pacote, não seguiu o
caminho das demais. Ficou a aguardar novo acesso de apetite de quem, daquela
vez, já estava de barriga cheia.
Ficou
sozinha. Ficou esquecida.
Amoleceu.
Quando,
passado dias, deram por ela, disseram:
—
Esta bolacha já está mole. Não presta.
E
chamaram:
—
Bobi, anda cá. Toma.
O
Bobi, de rabinho a abanar, muito saracoteante e salivante, veio, tomou, e foi
assim que a excelentíssima bolacha Dona Maria Emília de Melo e Sousa Trigo de
Reboredo Farinha acabou na boca do cão.
Esta
história é pequenina e sabe a pouco? Pois é.
O
Bobi também achou o mesmo.
António
Torrado
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