Algo se passara na alcateia. A mãe loba tinha tido um bebê. Nunca se pensara que nascesse um lobinho naquele covil, nem tão pouco a mamãe loba pensara que ainda teria filhos. Podes imaginar quão feliz ficou! Os irmãos e irmãs do recém-nascido também ficaram contentes. Exceto o mais pequeno, que tinha três ou quatro anos, e que pensava que iria ser sempre o benjamim. Tinham-no mimado como se fosse um bebê. Tinha sempre o focinho colado ao da mãe.
Agora, de repente, pedia-se-lhe que apanhasse galinhas e coelhos. Sozinho! Quando fechava os olhos, via o coração da mãe e dentro deste via o bebê, que agora o preenchia integralmente, tal como preenchia a barriga da mãe. Ou então, imaginava o focinha da loba colado ao do bebê. E tinha pena. Então, o lobito, com a carinha baixa, começou a seguir a mãe, e a emitir latidos de cão, enquanto abanava a cauda. Tornou-se um verdadeiro cãozinho! Já não se parecia com um lobo em nada. Nem nos dentes, que começaram a recuar, nem nos olhos que passaram a ser castanhos e úmidos, em vez de amarelos.
O seu belo pelo negro clareou e as orelhas começaram a descair como se fossem orelhas de cachorros. Agora, já não devorava as galinhas de uma só dentada, mas comia-as aos pedacinhos, osso após osso, como se fosse um cão. Os amigos troçavam dele:
— Quem quer preparar o biberão do cachorrinho?
Os lobos fazem sempre troça dos cães. A mãe não compreendeu de imediato o que estava a passar-se. Pensava: “Deve ter adoecido. Que pouca sorte a minha. Já tenho tanto que fazer com o bebê.” A mãe não estava contente e perguntou-lhe:
— Será que vais deixar esse ar de cão prostrado? O que é feito dos teus olhos amarelos, tão belos e orgulhosos? Tenho a impressão de estar a viver com um bastardo.
Eram palavras terríveis para o nosso lobinho, que pensava que já não o amavam. E continuava a caminhar, com as orelhas cabisbaixas, os olhos úmidos e o rabo entre as pernas. E óbvio que quanto mais se parecia com um cão abatido mais a mãe se irritava com ele. Estava tão cansada e ocupada com o bebê que nem sequer via que o seu lobinho estava triste. É claro que o filhote poderia ter dito isso mesmo à mãe. Dizer-lhe:
— Podias ao menos mostrar-me que ainda existo.
Mas, quando se é criança, é difícil exprimir verbalmente tais sentimentos. Então, exprimia-os através do corpo, do pelo, dos olhos tristes e dos modos de cão que tinha adoptado. Talvez pensasse: “Ao menos os cães são acariciados e as pessoas têm pena deles. Não andam a passo de lobo. Conseguem fazer-se ouvir. Dão latidos e amuam, para que reparem neles. Se eu me transformar em cão, talvez a mãe comece a reparar em mim.”
Às vezes, isto é o que acontece com as crianças. Às vezes, transformam-se para que possamos vê-los melhor. Alguns põem-se novamente a fazer de conta que são bebês, outros fazem birras, ou partem a louça. Podemos imaginar mil formas de chamar a atenção e obter o amor dos adultos. Mas o nosso lobinho não ficou cão durante muito tempo. Esta história terminou no dia em que os pais lhe disseram até que ponto ele era importante para eles. Com a pata direita, a mãe desenhou uma bola muito redondinha.
Virou-se então para o filho:
— Vês, este é o meu coração.
Depois desenhou cinco bolinhas dentro da bola maior.
— Estes são os meus filhos todos.
Um brilho amarelo iluminou o olhar do filhote. Endireitou o focinho e as costas com orgulho e sorriu, com as bochechas arrebitadas. Tal e qual um lobo!
A mãe exclamou:
— Com és bonito e grande! Gosto tanto de ti!
https://historiasparaosmaispequeninos.wordpress.com/2008/01/23/conto-do-pequeno-lobo-que-se-transformou-em-cao/
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