Numa fazenda de café, no interior de São Paulo, vivia Rafael e sua família, composta pela esposa Luisa e dois filhos. Aninha e Fernandinho. A menina estava com oito anos e o menino com cinco. Como todos sabem, na estação do verão são comuns as tempestades. O calor fica muito forte e, em consequência, vem a forte chuva acompanhada de trovões e relâmpagos.
Quando isso acontecia, Fernandinho ficava apavorado. Corria e ia se esconder sob a cama. Tremia e chorava tanto que dava pena. Os pais não sabiam mais o que fazer. Explicaram para ele que aquilo era um fenômeno natural e que não machucava as pessoas desde que elas estivessem protegidas. Mas devido à idade, o menino não entendia.
O mais engraçado aconteceu um dia. Eram mais ou menos três horas da tarde e Fernandinho estava brincando longe da casa grande perto do imenso galinheiro que o administrador, “seu” Gonzaga, fizera para a criação de galinhas caipiras destinadas ao consumo da família. Nesta hora o céu escureceu e Fernandinho continuava brincando com seus carrinhos.
De repente o primeiro raio e em seguida o trovão. O menino tomou o maior susto e seu impulso foi correr para se abrigar. Só que ele não correu em direção à casa, ele abriu a porta do galinheiro e entrou gritando assustando as galinhas que se puseram a cocoricar nervosas. Mais um trovão e outro relâmpago e Fernandinho foi mais para o fundo do galinheiro onde ficavam os ninhos com os ovos que as galinhas botavam durante o dia.
Ele pisoteou tudo tentando ficar bem escondidinho. A mãe, preocupada, mandou os empregados procurarem o menino que foi encontrado, todo sujo de ovo e chorando muito, no fundo galinheiro.
Neste mesmo dia, lá pelas dezoito horas, chegou a vovó Zulmira, mãe do pai de Fernandinho. Quando a vovó chegava era dia de festa. As duas crianças sentavam no seu colo, beijavam-na com carinho, pediam para contar histórias sem esquecer dos docinhos que só ela sabia fazer. Neste dia só Aninha correu para abraçar a vovó. Fernandinho estava deitado recuperando-se do susto que lhe deu a tempestade de verão.
O pai das crianças contou a sua mãe o que sempre acontecia com o menino nos dias de trovoadas.
- Não sei mais o que fazer, mamãe! Ele fica tomado de um pavor tão grande que me assusta... acho que ele precisa de um psicólogo.
- Ora, meu filho! Pode deixar comigo. Eu vou conversar com ele e tudo vai se resolver. – disse dona Zulmira.
No dia seguinte, depois do café da manhã, vovó Zulmira pegou as duas crianças e foi sentar com elas num canto do jardim, onde havia um caramanchão de primaveras que fornecia uma sombra maravilhosa. Estendeu uma toalha no chão e sentou-se do jeito que ela sentava quando ia contar as histórias da carochinha.
- Vovó, você vai contar histórias agora? – perguntou Aninha.
- Sim. A história que eu vou contar aconteceu ontem à tarde aqui nesta fazenda. – disse a vovó.
- Mas vovó, aqui não aconteceu nada. Estava chovendo muito. – disse a Aninha intrigada.
- Claro que aconteceu. É que você tem medo e não viu nada.
- Eu não tenho medo. O Fernandinho é que tem. – disse a menina.
- Eu tenho medo porque aquele barulho sai da boca de um bichão que come gente. – disse o Fernandinho choramingando.
- Quem disse isso pra você, meu filho? – perguntou a vovó.
- Foi Tonico, o filho do “seu” Gonzaga. – respondeu a criança.
- Você acredita na vovó?
- Sim. – respondeu o menino.
- Então eu vou contar o que aconteceu ontem: o céu estava quente e sujo. Tinha poeira por todos os lados. São Pedro olhava para as nuvens e pensava:
- Preciso lavar o céu. Deus não vai gostar de ver tanta poeira, vinda da Terra, sujando a sua casa. Olhem só as nuvens! Antes eram branquinhas, agora estão da cor do chumbo de tanta poluição. Não se pode nem ver mais o azul do céu.
Então ele chamou todos os anjos e deu a ordem:
- Vamos fazer uma faxina no céu. Precisamos arrastar todos os móveis, armários, mesas e cadeiras, guarda-roupas, tudo que puder ser arrastado para ser limpo. Joguem bastante água e varram tudo lá para baixo, para a terra.
- Então é assim que São Pedro faz a chuva? – perguntou o menino.
- Sim, meu amor... - confirmou a vovó.
E começou a limpeza. O primeiro barulho que você ouviu, meu neto, foi a imensa estante da biblioteca do céu sendo arrastada por um grupo de anjos para que o outro grupo limpasse o lugar onde ela estava.
- Então o barulho é porque eles tiram os móveis do lugar? – perguntou Fernandinho.
- Sim, meu querido. Quanto mais pesado é o móvel, mais forte é o barulho. – disse a vovó sorrindo.
- E a luz que aparece e desaparece rapidinho? – perguntou o menino.
- Ah! O raio. É quando quartos e salas ficam limpos, eles apagam as luzes e fecham as portas e passam para um outro quarto que esteja sujo continuando a limpeza. - Respondeu a vovó.
- Puxa! O céu tem muitos quartos... – observou o menino.
Enquanto esta conversa acontecia, o céu principiou a escurecer. O dia estava quente demais e era certo que ia cair mais uma forte chuva com raios e trovões.
A vovó entrou com as duas crianças. Olhou para o horizonte e lá já estava formada a tempestade. Chamou o menino, sentou-o no seu colo dizendo:
- Filhinho, já é hora de faxina no céu, vamos assistir?
Deu o primeiro trovão. Fernandinho agarrou-se a ela tremendo.
- Calma, menino. Esta foi a estante da qual eu falei. Ela é grande e pesada, por isso este estrondo forte. Ouça este: bum! Ouviu? Foi a mesa. Opa, a sala já está limpa, apagaram a luz. Agora estão no quarto dos anjos...
E assim dona Zulmira foi falando, falando, falando até que a tempestade foi se acalmando e Fernandinho disse:
- Acabaram. Será que tudo ficou limpinho?
- Vamos olhar? – e a vovó saiu para o quintal encharcado pela chuva e olhou para o céu que já estava azul e disse:
- Viu! O céu está limpo, limpinho, azul como Deus quer.
Desse dia em diante, Fernandinho perdeu o pavor que sentia por trovões e relâmpagos. Assim que começava uma tempestade ele dizia:
- Começou a faxina no céu... - Hoje Fernandinho é um belo rapaz e toda vez que ouve um trovão sorri lembrando da psicologia aplicada pela sua querida avó.
Maria Hilda de Jesus Alão
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