— Meu Deus, Maria Rosa, onde tens a cabeça? — perguntavam os pais.
O pai, que era controlador de tráfego aéreo, puxava-lhe as orelhas com frequência.
— Já pensaste na quantidade de aviões que se despenharia, se eu estivesse sempre a pensar noutra coisa, como tu? Onde estás com a cabeça, Maria Rosa?
Esperto seria quem soubesse a resposta. Estaria na Lua, em Marte, ou em Júpiter? Às vezes, a menina estava triste, outras vezes aborrecia-se. Mas pensava sempre:
— Um dia, hei-de viajar até outros planetas. Serei astronauta.
— Astronauta? — ria-se o pai. — Pensa mas é em ser professora de Geografia. Já seria muito bom. Para se ser bem-sucedido na vida, minha filha, não se deve sonhar muito.
Maria Rosa tentou esforçar-se para vir a ser professora de Geografia. Na escola, franzia a testa para melhor ouvir o professor. Mas só conseguia estar atenta dois segundos, porque logo o seu espírito voava até uma qualquer nuvem cinzenta. O professor sabia que aqueles olhos sonhadores indicavam que ela não o ouvia, porque as crianças demasiado bem-comportadas tentam ser bem-comportadas, mas não ouvem.
Um dia, o diretor da escola chamou os pais de Maria Rosa.
— O comportamento da vossa filha não é normal. Aborrece toda a gente. É insolente.
E matraqueava as sílabas, de tal forma temia que os pais não o ouvissem. Mas os pais de Maria Rosa estavam direitos como um fuso. Como trabalhavam muito, não tinham tempo para sonhar, nem sequer para imaginar. Talvez fosse por isso que a filha sonhava tanto. Ao sair do gabinete do diretor, o pai disse a Maria Rosa:
— Desiludes-me.
O que significava que ela não era como ele, como ele queria que ela fosse.
Maria Rosa esforçava-se, mas a nuvem cinzenta na sua cabeça levava-a para cada vez mais longe. Era como se, à menor hipótese, o seu espírito descolasse para bem longe dali. Sempre era melhor do que aborrecer-se, não era? E sempre era um mundo melhor do que este mundo aterrador, onde é preciso aprender a contar e a ler, e vigiar o paradeiro dos aviões no céu, como se não pudéssemos deixar os pobres aviões seguirem a sua própria rota.
— Quando for grande, serei astronauta — dizia Maria Rosa.
Quando cresceu, Maria Rosa começou a ler livros, a ouvir música, a tocar violino, e a compor belas melodias. Passou-lhe de vez o desejo de ser astronauta. Num ápice. Isso e as suas distrações. Do dia para a noite, passou a encher a taça de cereais, em vez de mel; a escovar os dentes com dentífrico de morango, e não maionese; nunca mais guardou o pijama no congelador; e punha belos chapéus na cabeça em vez de cuecas a fazerem de gorro.
Algumas crianças têm a cabeça bem na terra, mas outras ─ porque os pais discutem, porque não se sentem bem na escola, porque se aborrecem, ou por razões que não nos dizem respeito ─ estão sempre na Lua, em Júpiter, em Marte, em Urano ou, se calhar, apenas numa grande nuvem cinzenta. Num mundo onde se sentem melhor, mais seguras. Às vezes, tocam piano, leem livros, jogam xadrez. Seja como for, estão onde devem estar e é isso que interessa.
https://historiasparaosmaispequeninos.wordpress.com/2008/01/28/maria-rosa-esta-sempre-na-lua/
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