Existe
um país onde as pessoas quase não falam. É o país da grande fábrica
de palavras. Nesse estranho país, é preciso comprar as
palavras e engoli-las para poder pronunciá-las. A grande
fábrica funciona dia e noite. As palavras que saem de suas máquinas são tão
variadas quanto à própria linguagem. Existem palavras que custam mais
caro do que as outras.
As pessoas falam muito pouco essas palavras, a menos que elas
sejam muito ricas. No país da grande fábrica, falar custa caro. Quem não
tem dinheiro às vezes cata palavras nas latas de lixo, mas essas palavras são
sem graça: têm muito cocozinho de cabrito e pum de coelho.
Na primavera, podem comprar palavras em promoção e levar
para casa um monte de palavras baratas. Mas quase sempre essas palavras não
servem para muita coisa: o que fazer, por exemplo, com ventríloquo e filodendro?
Às vezes, é possível encontrar
algumas palavras no ar. Quando isso acontece, os meninos correm com suas
redes de pegar borboletas. Eles ficam orgulhosos de poder dizer algumas
palavras a seus pais, à noite, no jantar.
Hoje, Philéas pegou três
palavras em sua rede. Ele não vai usá-la esta noite, porque quer guardá-las
para falar a alguém muito especial. Amanhã, é o aniversário de
Cybelle. Philéas está apaixonado. Ele gostaria muito de dizer
a ela “Eu te amo”, mas ele não tem dinheiro o bastante em seu cofrinho. Então,
ele vai oferecer a ela as palavreas que encontrou: cereja, poeira, cadeira.
Cybelle mora na rua ao lado. Philéas
bate em sua porta. Ele não diz “bom dia, como vai você?”, pois não
tem essas palavras guardadas. Em vez disso, ele sorri.
Cybelle está com um vestido vermelho cor de cereja, Ela também sorri.
Atrás dela, Philéas vê Oscar,
seu maior inimigo. Os pais dele são muito ricos, mas não é por isso que
Philéas o detesta. Oscar não sorri. Ele fala. Para Cybelle. “Eu
te amo com todo o meu coração, minha Cybelle. No futuro, tenho certeza, nós
vamos nos casar.”
“Isso deve ter custado uma
fortuna”, pensa Philéas. Cybelle sorri sempre, mas Philéas não sabe para
quem é seu sorriso. Nos olhos de Oscar há muita segurança. “Minhas
palavras são muito pequenas!”, pensa Philéas. Ele suspira
profundamente e, sobretudo, pensa em todo o amor que tem em seu coração. Em
seguida, fala as palavras que pegou em sua rede. As palavras voam para Cybelle:
elas são como pedras preciosas.
Cereja...
Poeira...
Cadeira...
Cybelle não sorri mais, apenas olha
para Philéas. Ela não tem palavras guardadas. Então chega devagarzinho
perto dele e dá um beijo em seu rosto.
Philéas tem apenas uma palavra a mais
para dizer. Ele a encontrou, há muito
tempo, em uma lata de lixo, entre centenas de cocozinhos de cabrito e puns de
coelho. Ele ama muito essa palavra, por isso, a guardava para um grande
dia. Esse dia chegou! Olhando nos olhos de Cybelle, ele diz:
...Mais!
Agnés de Lestrade
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