Estava um pôr de sol muito bonito, com nuvens
cor de ouro e cor de fogo boiando no céu.
Clara Luz e as outras fadinhas brincavam de
modelagem com as nuvens. Faziam elefantes, carneirinhos, camelos, pássaros e,
às vezes, também, barcos e flores. Mas gostavam mais, mesmo, era de fazer
bichos.
Na terra as pessoas olhavam para o céu e
diziam:
- Olha lá aquela nuvem! Parece uma girafa!
- E aquela outra parece um elefante!
Ninguém sabia que eram as fadinhas brincando
lá no céu.
As mães, de vez em quando, vinham até a
janela ver o que as meninas estavam fazendo. Viam que estavam brincando com
modos e iam de novo para dentro.
Uma das fadinhas estava modelando um
cavalinho cor de foro. De repente veio o vento , bateu no cavalinho e ele saiu
galopando pelo céu, com a crina voando.
Todas bateram palmas de alegria:
- Também quero que a minha girafa corra!
- E o meu camelo também!
Começaram todas a chamar o vento. Mas não
adiantou. Ele já tinha ido embora e não ia voltar naquele dia.
- Sei de uma mágica para fazer todos esses
bichos correrem - disse Clara Luz.
- Conte! Conte como é, Clara Luz!
- Vocês vão ter que fazer tudo de novo. Não
vale fazer de qualquer maneira. Tem que ser assim: vocês vão modelando e vão
pensando: "vou fazer a melhor modelagem da minha vida".
- E depois?
- Depois acontece a mágica. É só isso.
- Ah! É fácil.
E as fadinhas correram para fazer aquela mágica.
Foi uma trabalheira. Não era nada fácil como parecia no princípio. Mas de
repente todas as fadinhas começaram a dizer para os seus trabalhos:
- Gosto de você como se fosse meu filho!
O interessante era que elas gostavam deles
assim justamente porque tinham dado tanto trabalho. Parecia até maluquice,
mas não era maluquice, não: era mágica.
De repente os bichos todos saíram galopando
pelo céu.
E o melhor é que estavam com voz: os cavalos
relinchavam, os leões urravam, os pássaros cantavam.
Ouvindo aquela barulheira, as mães vieram
para a janela, ver o que era:
- Que horror! Vizinha! Vizinha! O céu virou
jardim zoológico!
- Não diga! Que perigo, meu Deus! E nossas
filhas que estão lá fora, no meio das feras!
Começaram todas a gritar pelas filhas:
- Venham já para dentro!
As filhas não queriam entrar:
- Mas mamãe, logo agora, que a brincadeira
está ficando boa!
- Que boa o que, menina! Quer ser devorada
por algum leão?
- Mas mamãe, fui eu que fiz esse leão. Ele
não morde.
-
Morde, sim senhora. Entre já, estou dizendo!
As fadinhas foram entrando, emburradas:
- Puxa, não posso fazer nada, que coisa!
- Mas
minha filha, você não tem medo nem de leão?
- Eu não, mamãe, Já disse que fui eu que
fiz!
As mães não queriam acreditar:
- Minha filha disse que fez um leão - contou
uma para a outra, na janela.
- E a minha disse que fez um pássaro, que
canta e tudo.
- Não é possível. Elas ainda nem aprenderam
a fazer tapete mágico direito!
A outra pensou um pouco e depois decidiu:
- Nossas filhas não sabem fazer leão,
pronto. Está acabado.
As fadinhas, dentro de suas casas, estavam
todas na maior choradeira:
- Sei fazer leão, sim. Já disse que sei!
- Não quero aprender a fabricar tapete
mágico! Sei fazer coisa que vive e tem voz!
As
mães tentavam convencer as filhas:
- Mas querida, tapete mágico é muito
útil. Que diferença faz se tem voz ou
não tem voz?
- Faz muita diferença! Faz uma diferença
enorme! - respondiam as fadinhas, soluçando.
A mãe da que fizera uma girafa não sabia mais
o que pensar:
- Que será que essas meninas tem hoje, meu
Deus? - perguntava ela, aflita, para as vizinhas. - Nunca vi ninguém chorar
tanto, por causa de uma simples girafa!
Ouvindo isso, a fadinha chorou mais ainda:
- Minha girafa não é simples! Ninguém nesta
casa entende a minha girafa. Sou muito infeliz!
E foi se trancar no quarto, para chorar
sozinha.
Que luta para fazer as fadinhas se
consolarem! Só depois que anoiteceu, a última filha acabou de chorar.
As mães
se reuniram de novo na janela.
- Eu acho que é tudo verdade mesmo -- disse
uma delas. Nossas filhas sabem muito mais coisas do que nós pensamos.
Todas ficaram caladas, refletindo sobre
aquilo.
- No nosso tempo - disse uma - aprendíamos
a fabricar tapete mágico e ficávamos
muito contentes com isso.
- É mesmo -- concordaram as outras.
Mas uma das mães, que era muito sincera,
interrompeu:
- Eu não ficava nada contente em fabricar
tapete mágico.
Aí todas se lembraram:
- Eu também não ficava nada contente!
- Eu detestava tapete mágico!
- Eu até hoje detesto desencantar princesa!
- Eu, para falar a verdade, detesto todas as
lições do Livro!
Foi uma gritaria, as mães falavam todas ao
mesmo tempo:
- Eu daria tudo para aprender a fazer um
leão, nem que fosse dos pequenos!
- Eu quero fazer um papagaio, mas tem que
falar de verdade, senão não serve!
Com o barulho que as mães fizeram, as filhas,
que já estavam dormindo, acordaram e vieram ver o que era:
- Que foi, mamãe? Por que você está gritando
tanto?
- É que eu quero aprender a fazer um leão!
Estou louca para aprender a fazer um leão!
E quero que seja cor de ouro!
Foi a vez das filhas consolarem as mães:
- Está bem, mamãe. Não precisa se aborrecer.
Amanhã eu ensino você a fazer, ouviu?
- Tem que ser amanhã bem cedinho! -
exigiram as mães, batendo o pé.
- Não sei porque tanta pressa -
espantaram-se as filhas.
- Já perdi muito tempo! Quero que seja assim
que o sol raiar!
As filhas, que estavam com muito sono,
prometeram ensinar assim que o sol aparecesse.
Mas no dia seguinte as mães estavam muito
encabuladas:
- Que mau exemplo nos demos, ontem de noite!
- É mesmo ! Se a Rainha soubesse que até
falamos mal do Livro!
- É melhor fingirmos que esquecemos toda a
história.
E foram cuidar do seu serviço, como se nada
tivesse havido. As filhas compreenderam:
- Coitada da mamãe. Está com vergonha de ter
querido fazer um leão cor de ouro.
E não falaram mais no assunto.
Fernanda Lopes de Almeida
Nenhum comentário:
Postar um comentário